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Saque e Voleio

O Australian Open em 32 drop shots

Alexandre Cossenza

27/01/2014 16h10

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Foram 14 dias de histórias fantásticas, jogos muito bons e não tão bons, calor, chuva esperada e inesperada, raios, frases curiosas … A lista é longa. O Australian Open teve muito assunto e nem sempre deu tempo de abordar tudo aqui no blog. Eis, então, que nasce o "32 drop shots", um punhado de reflexões rápidas (tão breves quanto o tempo que Thomaz Bellucci leva para decidir quando dar uma curtinha) sobre os deliciosos 14 dias e noites que vivemos no primeiro Grand Slam do ano.

1. Raro ver um Grand Slam terminar com duas histórias mais legais do que este Australian Open. Uma carismática mulher levantando um troféu depois de dois vices e um homem superando seus traumas e medos no processo para conquistar seu primeiro Major. Sim, o Australian Open fez jus ao apelido de Happy Slam.

2. Foi bacana ver Teliana Pereira disputando um Slam – em simples e duplas – e fazendo uma bela apresentação. Sem falar no bom humor da pernambucana, que soube rir de si mesmo em um momento embaraçoso.

3. Thomaz Bellucci sai com saldo positivo, apesar de mais uma partida com problemas físicos. Venceu jogos no qualifying e voltou a triunfar em uma chave principal depois de dois anos. Que seja um recomeço para o número 1 do Brasil – sim, o paulista voltou a ser o mais bem ranqueado do país.

4. As duplas não tiveram bom resultado. Olhando pelo ranking, fica um gosto de decepção, já que Bruno e Marcelo eram cabeças de chave. Analisando o contexto, não é bem assim. Soares e Peya caíram na terceira rodada, mas diante da fortíssima parceria de Llodra e Mahut. Melo e Dodig, além de perderem para os campeões Kubot e Lindstedt, ainda sofreram com a lesão nas costas do mineiro.

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5. No juvenil, o Brasil pouco fez. Fora Marcelo Zormann, que venceu dois jogos na chave de simples, ninguém venceu um set sequer nem em simples nem em duplas. Rafael Matos, Gabriel Hocevar e Letícia Vidal voltaram para casa zerados. Há quatro anos, o Brasil tinha dois tenistas nas quartas de final de simples. Um deles era Tiago Fernandes, que acabou sagrando-se campeão.

6. O calor foi o assunto dos primeiros dias, especialmente naqueles em que as rodadas não foram interrompidas. A grande falha do torneio, ao que parece, é não deixar 100% claro para os atletas quais são os critérios que causam a paralisação dos jogos. Não parece, contudo, que a organização errou ao dar sequência aos jogos nos primeiros dias. Todos sabem das temperaturas na Austrália, e atletas precisam se preparar para dias quentes. Enquanto a saúde não é colocada em risco, é preciso reclamar menos e jogar mais.

7. O caso de Maria Sharapova é diferente. Em um dia de condições realmente difíceis, enquanto todos jogos já estavam interrompidos, ela e Karin Knapp jogavam um terceiro set longo (sem tie-break) e sob sol. Essa regra, sim, precisa mudar. Que se feche o teto quando o placar chegar a um placar específico (6/6, por exemplo).

8. Estava tão quente que Federer e Robredo reclamaram do calor no … bumbum! Não lembra? Dá uma olhada aqui!

9. Do Genie Army aos barulhentos búlgaros que empurravam Dimitrov, o público continua parte integrante do Australian Open. Algumas partidas pouco emocionantes ganham tons divertidíssimos só por causa da torcida. Quem viu algum jogo do polonês Jerzy Janowicz sabe do que estou falando.

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10. Falando em Genie Army, foi muito bacana ver a jovem canadense chegar à sua primeira semifinal de Grand Slam. Mostrou consistência e não perdeu a cabeça em momentos importantes, o que seria até compreensível para uma menina de 19 anos que gosta de Justin Bieber. Vale ficar de olho para ver como Bouchard lidará com a "fama" e eventuais convites para ensaios fotográficos daqui e dali.

11. Ainda que Serena Williams estivesse lesionada, Ana Ivanovic deixou seus fãs otimistas com a vitória sobre a americana. A sérvia, que foi campeã em Auckland, parece ter desenvolvido suas devoluções de saque e encontrado uma forma de jogo adequada a suas habilidades (e fraquezas). É outro nome a ser observado nos próximos torneios de 2014.

12. Agnieszka Radwanska talvez tenha perdido a melhor chance de conquistar um Slam. Sem Serena, Azarenka e Sharapova na chave, a polonesa era favorita na semifinal contra Cibulkova e decepcionou. Será que terá outra oportunidade assim? Mais: será que Radwanska vai se recuperar logo da derrota em Melbourne?

13. Entre os homens, Dimitrov fez um torneio a ser lembrado. Talvez seja seu primeiro passo rumo à afirmação como top 20 de fato (no ranking, ele já aparece como 19º). E o top 10, pela lista de hoje, nem está tão longe assim.

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14. Fora Nadal e Djokovic, ainda bem distantes do resto, o top 10 está "achatado" . De Wawrinka, número 3, a Federer, oitavo, são apenas 1.355 pontos de diferença. Entre eles estão Del Potro, Ferrer, Murray e Berdych. O sorteio das chaves em Indian Wells, próximo Masters 1.000, promete ser muito interessante.

15. "Wawrinka pode ser número 1 do mundo?", alguém me perguntou no Twitter. Considerando que o suíço está mais de 8 mil pontos atrás de Nadal, não convém entrar nessa discussão por enquanto. O ponto é que ele mostrou tênis para derrotar os melhores. Até o topo do ranking, a discussão agora passa mais pela consistência do que pelo potencial.

16. Roger Federer fez um belo torneio, mas acabou eliminado em uma quadra dura, com piso mais rápido do que o habitual, por um Nadal com bolha na mão – e em sets diretos. Hoje em dia, é difícil imaginar, a não ser em Wimbledon, outro jogo de cinco sets entre os dois.

17. Entre os que vi, o pior jogo do torneio veio logo no primeiro dia. Kerber x Gajdosova, na Rod Laver Arena. Duríssimo de ver.

18. Veio cedo também o melhor golpe do Australian Open. Foi de Denis Istomin, em cima de Novak Djokovic. É no segundo ponto do vídeo abaixo.

19. O melhor jogo? Em nível técnico, do começo ao fim, fico com Wawrinka x Djokovic. Não que o sérvio tenha feito uma partida espetacular, mas o homem certamente exigiu algo fantástico do suíço. E o fim de jogo, com os inacreditáveis erros seguidos do número 2 do mundo, com certeza deram uma pitada maior de drama à história daquela noite.

20. A surpresa (além do título de Wawrinka!) do torneio? Que tal Eric Butorac e Raven Klaasen na final de duplas? E os dois chegaram lá pelo caminho mais difícil. Derrotaram os irmãos Bryan em sets diretos, ainda nas oitavas de final, e bateram Nestor e Zimonjic, também por 2 a 0, nas semis. Duro de imaginar.

21. Eu não compraria, mas admito que curti a ousadia da H&M ao vestir Tomas Berdych com um uniforme quase futebolístico. Não dá para dizer que não deu resultado. Na semifinal, todos no box do tcheco estavam iguaizinhos, uniformizados. Só faltava um técnico de paletó e gravata indicando que alguém ali entraria na quadra para substituir o tenista.

22. É preciso ter uma mente muito traumatizada ou perturbada para acreditar que uma pessoa – qualquer pessoa – vai simular uma lesão depois de perder um set só em uma final de Grand Slam (melhor de cinco!). E se você acha que Nadal, invicto diante de Wawrinka até então, desistiria de um jogo depois de um setzinho, procure o psiquiatra mais próximo porque o caso é grave.

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23. Pouca gente notou ou comentou, mas Roger Federer, que manifestou sua torcida por Wawrinka nas quartas, não tuitou na final. Nem quando Nadal parecia estar bem fisicamente. Fez muito bem, acredito aqui. Escrever sobre Wawrinka poderia soar (mesmo que não fosse a intenção) como torcida contra Nadal, seu rival e algoz. Só alimentaria os fanáticos. Resumindo: Federer disparou um winner sem mover um músculo.

24. A ESPN fez um ótimo trabalho na transmissão do Australian Open. O "pacote" incluiu transmissão de partidas clássicas, "mesa redonda" pré-jogo e dois canais transmitindo simultaneamente – além do Watch, que dá aos assinantes de algumas operadoras a opção de escolher a quadra e acompanhar as partidas online. O canal acerta aqui e erra ali, tem comentaristas e narradores bons e não tão bons, mas mostra intenção de melhorar, o que já é mais do que vemos, por exemplo, na engessada transmissão de Wimbledon, feita pelo SporTV.

25. Dito isto, é preciso que os canais (todos!) parem com essa bobagem de que estão divulgando e fazendo um favor ao esporte. Não estamos falando de Futures ou torneios juvenis. Quem compra os direitos de transmissão de um evento (de qualquer esporte), o faz porque vai ter retorno. E nós, espectadores, somos lembrados disso a cada vez que alguém reinventa um brigadeiro ou que um comediante diz, em inglês macarrônico, "aime tênsi". Quando um canal acha que não vale a pena exibir, outro canal vai lá e compra os direitos. O Band Sports, que "roubou" Roland Garros da ESPN, é a melhor prova. E o Fox Sports, com dois canais e audiência maior que a da ESPN, está aí, só esperando uma chance.

26. O site do Australian Open continua disponibilizando transmissão ao vivo do torneio. O streaming já foi mais confiável, mas segue como ótima opção para quem prefere jogos de pouco apelo para a TV. Os comentários também são ótimos.

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27. Tente ver este vídeo e não ficar com a música tatuada na mente.

28. Nem uma multinha nem nada para David Ferrer? O empurrão que ele deu no juiz de linha foi o gesto mais deselegante do torneio, com folgas.

29. Se você não viu antes, teve tenista vestindo cueca com os dizeres "eu amo cerveja". Olha só!

30. Quem quiser ver algum assunto deste post comentado em mais de um curto parágrafo, basta me mandar um e-mail. Ainda estou devendo o primeiro P&R ("Perguntas e Respostas") aqui no UOL. Espero conseguir publicá-lo em breve.

31. Por que 32 drop shots em vez de um número redondo, como 10, 20 ou 50? Para que o leitor não se sinta enganado como na maioria dessas listas. Afinal, quem está lendo um top 20 sempre percebe que, por exemplo, os três últimos itens foram desmembrados só para atingir a cota.

32. Porque este post não poderia terminar sem um dos melhores momentos do Australian Open: Patrick Rafter!!!

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Sobre o autor

Alexandre Cossenza é bacharel em direito e largou os tribunais para abraçar o jornalismo. Passou por redações grandes, cobre tênis profissionalmente há oito anos e também escreve sobre futebol. Já bateu bola com Nadal e Federer e acredita que é possível apreciar ambos em medidas iguais.
Contato: ac@cossenza.org

Sobre o blog

Se é sobre tênis, aparece aqui. Entrevistas, análises, curiosidades, crônicas e críticas. Às vezes fiscal, às vezes corneta, dependendo do dia, do assunto e de quem lê. Sempre crítico e autêntico, doa a quem doer.