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Wild: meditação contra o jeito 'porra louca'

Alexandre Cossenza

25/04/2018 07h00

Em novembro do ano passado, quando conversei pela primeira vez com Thiago Wild, o jovem paranaense vinha de um título de Future e, naquela semana do Challenger do Rio de Janeiro, derrotou o top Nicolas Jarry. Então com 17 anos, ele já dizia que queria ser número 200 do mundo aos 18.

Pois Wild completou 18 anos no dia 10 de março e tem mais ou menos dez meses para tentar cumprir sua meta. Nos últimos meses, estreou em ATPs – jogou o quali no Rio Open e fez uma ótima apresentação na chave principal do Brasil Open, diante do experiente Carlos Berlocq – e jogou outros Futures.

Seu ranking não mudou muito (subiu de 637 para 604), mas nada que preocupe. No papo que batemos nesta terça-feira, depois de sua vitória na primeira rodada do Future de São José do Rio Preto (onde estou a convite do Instituto Sports), Wild não se mostrou preocupado com as campanhas pouco frutíferas dos Futures que jogou na Europa – ganhou um jogo em três torneios. Pelo contrário. Mostrou-se paciente e mais preocupado com seu jeito "porra louca" – expressão usada por ele.

Wild adicionou meditação à rotina e estabeleceu como prioridade manter a concentração durante o maior tempo possível nas partidas. Um elemento que pode facilitar com que todos os outros se encaixem e permitam a subida desejada no ranking. Confiram o papo:

A última vez que a gente conversou foi no Challenger do Rio de Janeiro, em novembro, e você estava em um momento bom. Desde lá, você jogou dois ATPs, alguns Futures… Como você está se sentindo hoje?

Desde lá, minha postura não mudou. Meu método de trabalho não mudou, nada mudou. Os resultados… nada vai interferir no processo. O que importa mesmo é como estou trabalhando, como está minha rotina, como estão meus dias. Os resultados vêm com o passar do tempo, é uma coisa natural, não tem o que falar. Não acho que eu esteja jogando mal, não acho que eu esteja tendo maus resultados. Não ganhei tantos jogos como estava fazendo no ano passado, não tive um começo de ano tão bom, mas ao mesmo tempo eu joguei torneios muito mais fortes. Os Futures estavam muito duros. Os primeiros três cabeças eram top 200, 300. Acho que é uma coisa normal. É um processo pelo qual toda pessoa passa. Ninguém é perfeito. Nem Federer. Ninguém consegue se manter ganhando 50, 60 jogos por ano a vida inteira. Uma hora, vai ter uma queda, mas nada disso interfere no objetivo final.

Você não está preocupado?

Nem um pouco. Nem um pouco.

Esse é o ano que você falou que queria terminar entre os 200.

Sim.

Ainda acha que dá?

O ano acabou de começar, eu joguei três torneios.

Fala um pouquinho das sensações que você teve no Rio Open e no Brasil Open. Agora, com a cabeça mais fria, o que você tirou de estar lá e de jogar? É muito diferente do que você esperava?

Acho que no Rio Open eu não joguei bem. Eu não estava bem, estive doente nos dias anteriores. Não estava me sentindo bem na quadra, não estava me sentindo bem comigo mesmo. É uma coisa que acontece. Ossos do ofício. Não tem desculpa. Mas ao mesmo tempo, na semana seguinte, eu comecei a treinar melhor, a dar mais importância para algumas coisas que não me preocupavam tanto e consegui jogar melhor. Tive problemas físicos. 'Cãibrei' no final do jogo com o Berlocq [o argentino venceu de virada por 3/6, 6/3 e 6/2], mas ao mesmo tempo senti que tive chances de ganhar e de estar competitivo nesse nível. Isso é uma coisa muito importante porque estar competitivo não quer dizer que eu vá ganhar ou perder. Quer dizer que eu vou conseguir conquistar meu espaço. Rápido ou devagar, não importa como. Eu tenho condições de estar lá.

Você disse que começou a dar atenção a algumas coisas que antes não dava. Pode me dar um exemplo?

Comecei a meditar. É uma coisa que ajudou meu mental. Eu era muito estourado, muito porra louca no ano passado…

Não é mais?

Não que eu não seja mais porra louca (risos), mas acho que é uma coisa que estou conseguindo controlar melhor.

De quem partiu a ideia da meditação?

Do João. João Zwetsch.

É mentalização, visualização?

É mais concentração, mais um estado de calma em que eu consiga me focar no objetivo e não ficar disperso, que era um problema que eu tinha. Eu perco a concentração muito rápido. Ao mesmo tempo que quando eu consigo entrar num hiperfoco super rápido, eu consigo sair de uma concentração muito rápido. São dois extremos, e a meditação me ajuda a controlar.

Ainda sobre Rio e São Paulo, uma coisa que eu achei legal de você ter falado foi aquela frase sobre "acho que tenho mais jogo que uns aqui"…

Isso aí eu não falei, não.

Isso estava no release do torneio.

Colocaram, mas eu não falei.

Eu li isso.

Eu li também, mas não falei. Eu falei isso no vestiário. Alguém passou e colocou que eu falei. Em entrevistas, eu não falei. Eu realmente falei essas palavras, mas falei com a minha equipe.

Mas você acredita nisso?

Eu acho que sim. Como eu falei antes, estou competitivo nesse nível. Lógico que eu tenho muito a melhorar, principalmente a parte física e a parte mental, né? Mas acho que tenho condições de competir bem nesse nível.

Alguém achou ruim você ter dito essa frase?

Não. Lógico, sempre tem uns caras no Instagram, mas normal.

Aliás, você ganhou um destaque maior no tênis brasileiro nesse período. Aumentou muito seu número de seguidores?

(risos) Olha, não sei. Aumentou, sei lá, eu tenho uns 5 ou 6 mil seguidores. Não tenho muitos, não. Eu criei a conta no Instagram dois ou três anos atrás. Mas depende muito do torneio que eu estou jogando.

Mas você lê os comentários? Gosta?

As pessoas que eu conheço, eu vejo e respondo de vez em quando. Eu não leio muito.

Agora fala um pouco sobre seu trabalho na Tennis Route hoje em dia. Você treina com o Arthur [Rabelo], certo?

Com o Arthur e o João [Zwetsch]. Sempre os dois na quadra.

Qual é o foco atual?

Consolidação do mental, principalmente. Mental e físico.

Aliás, você teve cãibras também no Challenger, embora tenham sido duas partidas no mesmo dia, né?

No Challenger, eu tinha jogado já cinco horas de tênis, não tem muito o que falar.

E teve a cãibra do jogo do Berlocq, que também era uma situação nova para você…

A cãibra do jogo do Berlocq… Era um jogo novo. Não era tanto a parte física, era mais a intensidade mental. Lógico, tem jogo e tudo, é um nível de tênis que eu não estou acostumado a jogar. Foi o primeiro ATP que eu joguei. Não tem o que falar. Eu não estava acostumado. Só isso.

Não é uma preocupação que vocês têm de preparo…

Lógico, eu sempre me preocupo com meu físico, mas não é uma coisa que eu entro em desespero, "estou muito mal de físico e preciso treinar". Mas é uma coisa que eu cuido bastante, sim.

O Brasil vive meio que uma entressafra de tenistas. O Thomaz [Bellucci] tem 30, o Rogerinho tem 34, e o Thiago Monteiro é único mais jovem que está aí num nível mais alto. Como você vê isso? De repente, é uma chance de você ter destaque mais cedo?

Porque eu sou o mais novo (sorriso). O Thiago tem 23, eu acabei de fazer 18. São quase seis anos a menos. O Karue [Sell, #417 do mundo aos 24 anos] está jogando bem. Nunca vi ele jogando, não conheço ele, mas teve bons resultados. Com certeza, não sou o único e tem bastante gente para jogar bem.

Mas você vê isso como uma brecha para você, de repente, jogar uma Copa Davis mais novo do que você imaginava, talvez, dois anos atrás?

Acho que sim. É uma coisa que seria legal. É uma coisa que… Eu pretendo, né? Buscar um espaço na Copa Davis cedo, até porque eu gosto do torneio, gosto de competição por equipe, acho legal. Sempre gostei de jogar assim.

Para terminar: ano que vem, a ITF vai implantar um circuito de transição, que vai transformar os Futures de US$ 15 mil em torneios de transição, que vão dar prêmio em dinheiro, mas não vai ter ponto no ranking mundial. Vocês pensam nisso, têm um planejamento diferente por causa disso?

Eu pretendo ficar fora desse ranking, né? (risos) Eu pretendo ficar fora desse ranking!

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Sobre o autor

Alexandre Cossenza é bacharel em direito e largou os tribunais para abraçar o jornalismo. Passou por redações grandes, cobre tênis profissionalmente há oito anos e também escreve sobre futebol. Já bateu bola com Nadal e Federer e acredita que é possível apreciar ambos em medidas iguais.
Contato: ac@cossenza.org

Sobre o blog

Se é sobre tênis, aparece aqui. Entrevistas, análises, curiosidades, crônicas e críticas. Às vezes fiscal, às vezes corneta, dependendo do dia, do assunto e de quem lê. Sempre crítico e autêntico, doa a quem doer.


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