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18 reflexões sobre o Brasil Open de 2019

Alexandre Cossenza

04/03/2019 12h12

O Brasil Open chegou ao fim neste domingo, com o argentino Guido Pella derrotando o chileno Christian Garín e conquistando o primeiro título de ATP de sua carreira. Foi um momento bacana, com destaque especial para o abraço com o técnico José Acasuso após o match point, que concluiu um evento que não teve uma chave das mais fortes, mas que também não foi tão fraco assim, comparando até com o Rio Open, um ATP 500. Encerro minha passagem por São Paulo com 18 observações sobre o que vi por aqui desde quarta-feira.

1. Não é o melhor parâmetro para comparações, mas apenas a título de curiosidade, as quartas de final do ATP 250 de São Paulo tiveram tenistas mais bem colocados na lista da ATP (ranking somado de 616) do que as quartas do ATP 500 do Rio (747). Alguns desses tenistas subiram no ranking justamente por causa de suas campanhas na Cidade Maravilhosa, mas o ponto é que os nomes não foram tão diferentes assim.

2. O fato de o Rio ter perdido seus principais nomes nas primeiras rodadas foi usado pelo diretor do Brasil Open, Roberto Marcher, para justificar a política do torneio de não pagar garantias (appearance fees ou, em bom português, cachê) para atrair tenistas de mais peso. Ele cita – com razão – que o Rio sempre vê grandes nomes caindo e indo embora do torneio cedo.

3. Sempre escrevo, mas não custa lembrar: o Brasil Open tem o que considero a pior data de todo calendário da ATP. É o único evento da série 250 que concorre contra dois ATPs 500 (Acapulco e Dubai) na mesma semana. Considerando ainda que é um evento de saibro realizado às vésperas da sequência Indian Wells-Miami, jogada em quadra dura, fica mesmo difícil atrair nomes de peso.

4. Marcher disse ainda que o torneio nunca correu risco, nem mesmo com a demora na aprovação para o uso de verba captada via Lei de Incentivo. Sem entrar em detalhes, o diretor disse que a organização sempre teve um plano B junto com os patrocinadores.

5. O público, sempre muito bom em São Paulo, deixou a desejar. Foram 32.930 pessoas ao longo da semana, segundo o torneio. Não foi um fiasco total, até porque os ingressos foram vendidos a preços bastante acessíveis, mas a combinação de chave fraca, brasileiros eliminados nas rodadas iniciais de simples e cidade vazia por causa do Carnaval foi cruel com o evento. Ano passado, com uma chave mais forte e Fabio Fognini avançando até a final, houve 42.548 espectadores.

6. Marcher disse ainda não poder garantir que o Brasil Open vai continuar em 2020, mas foi otimista, bem a seu estilo: "Garantido é a morte. Quer uma garantia? Eu te garanto que é a morte. O torneio? As chances são enormes [de continuar]."

7. O Ibirapuera ainda é um belo local para ver jogos de tênis, mesmo com alguns problemas. A organização do Brasil Open ajuda a compensar algumas dessas falhas. Como escrevi ano passado, é ótimo ter a opção dos food trucks do lado de fora do ginásio. Além disso, torcedores podem entrar e sair do Ibirapuera se quiserem comer fora (viu, Rio Open?).

8. Ainda assim, há problemas. Os banheiros já foram melhores. Este ano, foi até curioso notar que a Granado, parceira do evento, estilizou as portas dos banheiros. Nos banheiros que eu entrei, contudo, não vi sabonete algum durante toda a semana. Não me pareceu muito inteligente. Apenas adesivar portas foi pobre e preguiçoso demais. Acabou jogando contra a marca.

9. Foi emocionante a comemoração de Guido Pella, que conquistou seu primeiro título. O longo abraço que deu em seu técnico, José Acasuso, mais ainda. Pena que a ATP não registrou o momento nas redes sociais. Quem tiver assinatura TennisTV pode rever. Foi bonito.

10. Na coletiva, Pella disse que tirou um enorme peso das costas. O tenista de 28 anos não queria de maneira alguma terminar a carreira sem um título de ATP e revelou que esse medo cresceu nas últimas semanas, principalmente após a final do ATP 250 de Córdoba, que ele vencia por um set e uma quebra de vantagem antes de tomar a virada do compatriota Juan Ignacio Londero.

11. Pella também fez uma bela defesa do companheiro Marco Trungelliti, que denunciou à Unidade de Integridade do Tênis pessoas interessadas em manipular resultados no circuito mundial. Sua denúncia levou às punições dos compatriotas Nicolás Kicker e Federico Coria e, por isso, muitos trataram Trungelliti como dedo duro na Argentina. O tenista se mudou para Andorra e relatou ter vivido momentos ruins e recebido olhares estranhos nos ATPs de Córdoba e Buenos Aires. Pella tomou o lado de Marco e disse que o colega apenas cumpriu sua obrigação ao fazer a denúncia, contribuindo para um esporte o mais limpo possível.

12. Não valeu tantos pontos assim (20 no ranking da ATP), mas Thiago Wild venceu seu primeiro jogo em um torneio ATP ao bater o sueco Elias Ymer. Não deixa de ser um bom sinal, depois de o paranaense perder partidas ganháveis em Córdoba (Alessandro Gianessi) e no Rio (Taro Daniel). Nas oitavas, Wild perdeu para Trungelliti em dois sets. Como já escrevi alguns dias atrás, foram duas partidas em que o jovem brasileiro mostrou seu melhor e seu pior.

13. O outro brasileiro na chave principal era Thiago Monteiro, que foi eliminado na estreia por Casper Ruud. O cearense agora tem um histórico de uma vitória e cinco derrotas jogando o Brasil Open no Ibirapuera, em uma quadra de saibro indoor e na altitude. Nem preciso lembrar (de novo) de Uberlândia…

14. Thomaz Bellucci e Rogerinho fizeram mais uma boa campanha na chave de duplas. Depois do vice no Rio Open, onde embolsaram US$ 28 mil cada, os dois pararam nas semifinais em São Paulo. A campanha incluiu uma passagem pela tumultuada Quadra 1, onde muita gente ficou do lado de fora enquanto ainda havia lugares na pequena arquibancada (vejam vídeo abaixo).

15. A sequência de jogos prejudicou Félix Auger-Aliassime e Laslo Djere. Os finalistas do Rio Open se encontraram nas quartas em São Paulo, quando nenhum dos dois estava em sua melhor forma. Djere venceu de novo, mas caiu diante de Pella na fase seguinte. Félix mostrou mais de seu potencial e conquistou a torcida paulistana. Tivesse ido mais longe, teria atraído mais público ao Ibirapuera no fim de semana.

16. O melhor momento da minha semana foi a entrevista com Nelson Nastás, ex-presidente da CBT. Ele era o dirigente quando Gustavo Kuerten liderou o boicote à Copa Davis em 2004, 15 anos atrás. Conversamos por um bom tempo na sala de imprensa do Ibirapuera. Falamos sobre o tênis nacional durante sua gestão e o quanto ele mudou nos últimos 15 anos. Ouvi histórias interessantes, que serão publicadas em breve no blog.

17. Não estou ganhando um centavo para escrever isto, mas recomendo fortemente uma visita à Taverna Medieval (vide última foto do post abaixo) aos que visitarem São Paulo durante o torneio. Dos atendentes chamando os clientes por milord e milady até o banheiro, cuja porta "secreta" se abre com o movimento de uma tocha na parede, o lugar é um paraíso nerd/instagrammer. A decoração temática é pensada nos mínimos detalhes, o cardápio é incrível, a comida é ótima, e dá para jogar RPG, praticar tiro com arco e tirar fotos no trono vestido de rei e rainha. A fila pode ser longa, mas vale a pena. E qualquer dia, quem sabe, talvez eu publique aqui o conto sobre uma Cidadela do Oeste que foi mencionado no jantar pós-torneio.

18. Da última vez que fiz um texto assim, terminei no 17º parágrafo, e houve gente (tem teoria conspiratória pra tudo) achando que era uma indireta política. Não era. Para que não acontecesse de novo, enfiei essas três linhas aqui.

Sobre o autor

Alexandre Cossenza é bacharel em direito e largou os tribunais para abraçar o jornalismo. Passou por redações grandes, cobre tênis profissionalmente há oito anos e também escreve sobre futebol. Já bateu bola com Nadal e Federer e acredita que é possível apreciar ambos em medidas iguais.
Contato: ac@cossenza.org

Sobre o blog

Se é sobre tênis, aparece aqui. Entrevistas, análises, curiosidades, crônicas e críticas. Às vezes fiscal, às vezes corneta, dependendo do dia, do assunto e de quem lê. Sempre crítico e autêntico, doa a quem doer.