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Fora da Fed Cup, #2 do Brasil denuncia interferência de dirigente

Alexandre Cossenza

08/02/2018 07h00

Aconteceu em 2015: Laura Pigossi já estava relacionada para defender o Brasil em San Luis Potosí, no México, quando veio a ordem: a tenista deveria ser retirada do time da Fed Cup sem que a capitã do time, Carla Tiene, fosse consultada. Quem deu a ordem? Por quê? A própria Laura, que desde então não foi mais chamada a defender o Brasil nem convidada para eventos da Confederação Brasileira de Tênis (CBT), explica nas próximas linhas.

Hoje com 23 anos e atual número 2 do Brasil (e #398 do mundo), a paulista conta que tudo aconteceu porque sua mãe, em uma conversa informal com uma amiga, fez uma crítica à CBT – elas conversavam sobre irregularidades na entidade que vinham sendo relatadas na imprensa. A amiga, então, foi até Lacerda relatar as críticas, e Laura, que nada tinha dito, recebeu a punição "por tabela".

A história parece estranha demais para ser verdade, mas a lei da mordaça foi confirmada por duas pessoas envolvidas de perto com o caso. Uma delas foi Paulo Moriguti, superintendente da Confederação na época.

"A menina já tinha recebido [a convocação], e eu tive que ligar dizendo que ela não ia mais…" "Eu falei com o Renato Messias [técnico de Laura na época]. O que está acontecendo é o seguinte: vocês estão falando mal do Jorge pelos motivos de vocês, mas o presidente da CBT é ele, e vocês têm um contrato de apoio com os Correios. Não pode ficar falando mal do cara. Se tem alguma coisa de errado, fala para a gente. Chegou no ouvido do cara, o cara ficou puto e cortou a parada de vocês. A verdade é essa", disse Moriguti por telefone. "O Jorge estava muito puto. Aí ligou a mãe da Laura. Eu fiquei uns 45 minutos com ela no telefone, explicando. Ela disse que não falou, que algo tinha sido mal interpretado, mas eu disse 'não sei o que vocês comentaram, eu só recebi ordens de cima para isso.'"

O ex-superintendente ressaltou, inclusive, que a atleta deixou de receber qualquer benefício da entidade após caso. "Nunca mais ela ganhou nada! Nenhum centavo. Nem para participar daqueles eventos de final de ano. Cortaram ela bonito."

A capitã da equipe, Carla Tiene, confirma a versão, mas com um detalhe a mais: "a resposta que o Jorge me deu foi que se [a Laura] estivesse na equipe como jogadora, ele não tiraria. Mas como eu estava levando ela como uma quinta jogadora… Eu não concordava, mas ele me respondeu isso. Se ela estivesse na equipe, ele não mexeria, mas como ela estava indo como jogadora de treinamento, ele se sentiu desrespeitado." Tiene ressaltou que "foi a única vez que ele se intrometeu com uma atleta" durante seu período como capitã do Brasil na Fed Cup.

Depois daquela Fed Cup de 2015, Laura recebeu da CBT um termo de resilição (desfazimento, no caso, unilateral) de seu contrato de patrocínio. Segundo a entidade, a queda da paulista no ranking significava que ela não mais se enquadrava "dentro dos critérios do Plano Nacional de Alto Rendimento" da entidade. Após a temporada 2016, a paulista também não foi mais beneficiada pelo programa Bolsa Atleta, que é determinado pelo Ministério do Esporte com base em uma lista de torneios montada pela CBT.

Laura também lamenta que não recebeu explicações da CBT sobre sua não-convocação para a Fed Cup que está sendo disputada esta semana, em Assunção, no Paraguai. Segundo Laura, seu técnico, Martín Vilar, mandou seguidas mensagens para o presidente da CBT, Rafael Westrupp, e não recebeu resposta. O time brasileiro está escalado com Bia Haddad Maia (#59), Gabriela Cé (#405), Nathaly Kurata (#429) e Luisa Stefani (#570).

O atual capitão, Fernando Roese, falou por telefone sobre a situação de Laura Pigossi. Segue a transcrição da conversa:

Alexandre Cossenza: A Laura me procurou para falar de uma Fed lá atras, em que o Jorge vetou a participação dela. Ela estava convocada, foi desconvocada. E desde então ela não é chamada. E a Laura me procurou desta vez porque ela acha que ela é a #2 de simples e…
Fernando Roese: (interrompendo) O negócio é mais pelo negócio da CBT.

AC: É?
FR: É. Só por isso.

AC: Então posso escrever que você não convoca ela por causa da Confederação?
FR: Não. Não que eu não convoco. Ela teve problemas com a CBT, entendeu? Então, teoricamente, são questões particulares da CBT com ela.

AC: Se você quisesse convocar, o Westrupp vetaria?
FR: Pra te falar a verdade, são questões de CBT, por isso eu não sei. Não posso te responder isso.

AC: Mas então, por ter esse problema, você já nem considera a hipótese de levar a Laura para uma Fed?
FR: É, foi um problema que ela teve diretamente com a CBT. Tá? Só isso.

AC: Ela chegou a te procurar para perguntar alguma coisa?
FR: Não, nada.

AC: Porque ela disse que procurou a CBT e não teve resposta, posição, enfim…
FR: Comigo não conversou, não. Tanto é que liguei para todas, conversei com todas as meninas e, sempre transparente como eu sempre fui, e sabendo só desse problema dela com a CBT, eu nunca cheguei a conversar com ela, na realidade. Tanto é que ela sabia disso, eu acho. Ela tinha esse problema aí.

AC: Uma das coisas que ela queria saber é isso. Se ainda é por causa desse problema.
FR: Da minha parte, é isso aí.

Após conversar com Laura Pigossi, Paulo Moriguti, Carla Tiene e Fernando Roese, tentei, mas não consegui fazer contato com Jorge Lacerda (se este post chegar até ele, ficarei feliz em incluir sua versão). Também enviei à CBT as seguintes perguntas:

– Que jogadoras profissionais que recebem auxílio financeiro da CBT ou dos Correios atualmente?
– Que critérios foram adotados para que a atleta Laura Pigossi não esteja incluída nessa lista?
– Por que a atleta Laura Pigossi não foi mais convidada para eventos da CBT, inclusive o grande encontro nacional realizado no fim de 2017?
– Por que a atleta Laura Pigossi não foi indicada pela CBT para recebimento de Bolsa Atleta?
– A atleta diz que seu técnico enviou seguidas mensagens de texto e áudio para o presidente da CBT, Rafael Westrupp, pedindo explicações sobre sua ausência em equipes da Fed Cup, e que jamais recebeu uma resposta. Por que nem o presidente Westrupp nem outra pessoa da entidade entrou em contato com a atleta para dar uma resposta?

A CBT não informou Que jogadoras profissionais que recebem auxílio financeiro da entidade ou dos Correios atualmente, enviando apenas uma resposta de Westrupp via assessoria de imprensa:

"A CBT esclarece que a convocação das atletas para a participação na Fed Cup é feita pelo capitão Fernando Roese, sendo que o mesmo possui autonomia para tal. Em relação ao Bolsa Atleta, a CBT apenas indica a relação de torneios que servirão de balizamento para o programa. A elegibilidade dos atletas é definida pelo Ministério do Esporte, sem qualquer interferência da Confederação Brasileira de Tênis. Após o Ministério do Esporte enviar a lista dos nomes dos tenistas elegíveis para a participação, a CBT dá início ao processo burocrático interno, para conferência dos documentos que são exigidos pelo próprio ME. A CBT afirma que o presidente Rafael Westrupp nunca recebeu qualquer contato por parte do técnico da tenista em questão. E por fim, a Confederação Brasileira de Tênis ratifica que por parte da entidade não há qualquer tipo de problema com esta, e nem com os demais tenistas."

Laura Pigossi hoje treina na Espanha, mas mantém a esperança de voltar a defender o país. "Eu amo meu país, eu amo jogar pelo meu país! E sempre foi assim! Mesmo com tudo isso, mesmo morando na Espanha, sabe?! Eu sou brasileira, sempre fui! O que eu quero é poder ter a chance de representar ele se eu vejo que em algum momento eu posso fazer a diferença em algum aspecto!"

Ela segue aguardando uma explicação de alguém da entidade. "Que pelo menos eu tenha a possibilidade de mudar o que a eles, provavelmente, não agrada. Eu não sei o que eu fiz. Sempre fui muito trabalhadora, muito na minha, com muita garra. Amo o que eu faço e não acho justo. Acho que se você cai no ranking, eles não têm obrigação de te chamar. Podem escolher outras. Mas se você está #1 de duplas, acabando de fazer a semifinal de um WTA [em 2016, Pigossi fez semifinal no WTA de Rabat], e #2 de simples, acho que no mínimo você deve receber uma explicação, sabe?"

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Sobre o autor

Alexandre Cossenza é bacharel em direito e largou os tribunais para abraçar o jornalismo. Passou por redações grandes, cobre tênis profissionalmente há oito anos e também escreve sobre futebol. Já bateu bola com Nadal e Federer e acredita que é possível apreciar ambos em medidas iguais.
Contato: ac@cossenza.org

Sobre o blog

Se é sobre tênis, aparece aqui. Entrevistas, análises, curiosidades, crônicas e críticas. Às vezes fiscal, às vezes corneta, dependendo do dia, do assunto e de quem lê. Sempre crítico e autêntico, doa a quem doer.


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