Como uma falha de comunicação deixou o Brasil sem seu #1 na Copa Davis
Alexandre Cossenza
02/09/2017 02h05
No dia 28 de agosto, o capitão brasileiro na Copa Davis, João Zwetsch, anunciou o time que vai – ou melhor, ia – enfrentar o Japão na repescagem do Grupo Mundial: Thomaz Bellucci, Thiago Monteiro, Bruno Soares e Marcelo Melo. O comunicado enviado pela CBT já vinha com a justificativa para a ausência de Rogerinho, atual número 1 do país.
"…esse tipo de piso, uma quadra dura rápida, não é o mais adequado para ele. É muito importante para o Monteiro acumular essas experiências, para cada vez mais se firmar dentro da equipe. Ele é o mais jovem dos jogadores que temos e é o que mais vai seguir na Copa Davis nos próximos anos."
Apenas por esses pequenos pedaços de informação, já dava para saber que Rogerinho não ficaria nada feliz. Primeiro, obviamente, por não ser convocado. Depois, pela justificativa da quadra dura. O paulista já enfatizou em várias entrevistas que também sabe jogar no piso sintético. Ele, aliás, foi o único brasileiro a vencer um jogo de slam em quadras duras nesta temporada.
O que não se sabia até então é que Rogerinho também havia ficado especialmente magoado por não ter sido avisado pessoalmente por Zwetsch. O tenista só soube que não enfrentaria o Japão quando, já montando seu calendário para o pós-US Open, entrou em contato com o capitão para saber dos planos. E a bomba estourou nesta sexta-feira, quando Fernando Nardini deu a notícia no Twitter.
Só depois disso é que vieram os textos oficiais. Primeiro, o de Rogerinho, dizendo, entre outras coisas, que "tive que ir atrás do capitão para saber" e que "infelizmente não poderei ser o reserva desta vez, mas vou torcer pelos meninos para buscar essa vaga." O texto inteiro está no tweet abaixo:
Mais tarde, chegou a confirmação da CBT sobre Bellucci. Segundo o texto, o canhoto de Tietê sofreu uma ruptura parcial no tendão de aquiles e ficará fora do circuito por pelo menos três semanas. O email também confirmava a convocação de Guilherme Clezar, atual número 224 do mundo e que nos últimos 12 meses só disputou uma partida em torneio de nível ATP: a derrota por 6/2 e 6/3 para Guido Pella no Brasil Open, em São Paulo.
Resumindo: Rogerinho ficou magoado por não ter sido comunicado na primeira convocação e, mais tarde, optou por priorizar seu calendário. A falta de comunicação e de entendimento tirou da Davis o número 1 do Brasil logo em um confronto contra um Japão que não terá seus dois principais tenistas: Kei Nishikori e Yoshihito Nishioka, ambos lesionados. Uma chance rara para voltar à primeira divisão do tênis mundial.
Conversei com Zwetsch por telefone no fim da tarde de sexta-feira, e o capitão deu algumas informações importantes. Primeiro, confirmou que não foi a infecção urinária que tirou Bellucci do confronto. O paulista vinha sendo acompanhado por um médico e estaria recuperado disso. Depois, Zwetsch disse que entendeu a decisão de Rogerinho, mas enfatizou que entraria em contato com o atleta. "O que aconteceu foi que ele me ligou alguns dias antes de eu ligar para ele."
O gaúcho também ressaltou que sempre entra em contato com todos os convocáveis – escalados ou não – antes dos confrontos da Davis. Esse declaração, no entanto, vai de encontro ao caso de 2014, quando Feijão vinha em boa fase e só descobriu que não seria chamado para enfrentar a Espanha quando seu técnico, Ricardo Acioly, procurou Zwetsch para perguntar e fazer o planejamento de calendário.
Na conversa, Zwetsch, que já foi técnico pessoal de Guilherme Clezar, elogiou o tênis do conterrâneo e afirmou que o jovem de 24 anos "tem o mesmo potencial na quadra dura que o Rogério e o Thiago." E se você está imaginando, sim, Zwetsch viu a atuação de Taro Daniel contra Nadal no US Open. Ele até riu quando toquei no assunto de forma provocadora (mas descontraída).
Coisas que eu acho que acho:
– A dúvida de Zwetsch para a primeira convocação ficou entre Monteiro e Rogerinho. Minha opinião? Eu não levaria Bellucci, que vive péssima fase e não vem nem mostrando ânimo para ganhar no circuito. As 11 derrotas nos últimos 14 jogos são prova de que o momento é um dos piores de sua carreira. Não levá-lo seria até uma forma de preservá-lo. Vale lembrar que Bellucci foi em má fase à Argentina, perdeu dois jogos ganháveis, e o Brasil sucumbiu apesar do bravo fim de semana de Feijão.
– Dito isso, é compreensível a opção do capitão. Bellucci é o mais experiente do time e, como Zwetsch enfatizou em nossa conversa, "eu sei que o Thomaz tem seus altos e baixos, mas nos momentos bons ele é capaz de mostrar um nível altíssimo de tênis", o que é uma grande verdade. Assim, o gaúcho fez uma escalação esperançosa.
– É perfeitamente justificável a mágoa de Rogerinho com a situação. Primeiro porque acho que ele não é inferior a Monteiro (nem ao Bellucci de hoje) em quadras duras – e Rogerinho deve concordar comigo. Segundo porque um contato do capitão com o número 1 deveria, sim, ser esperado. Que Zwetsch tivesse lhe procurado antes. Agora o estrago está feito e, no fim das contas, trata-se de uma falha imperdoável de comunicação que pode fazer o Brasil perder uma enorme chance no Japão.
– Não tem grande relevância, mas vale mencionar pelo simbolismo da coisa. No primeiro email, a CBT dizia que a equipe no Japão contaria com "o reserva Marcelo Zormann". Ora, se nunca havia a intenção de colocá-lo para jogar (o que é certíssimo), por que chamar de reserva? Seria mais simples e mais honesto com todos dizer que Zormann vai ao Japão para ajudar nos treinos.
– Uma pequena nota sobre US Open, até porque envolve um atleta da Davis: Marcelo Melo e seu parceiro, Lukasz Kubot, encerraram sua participação nesta sexta, eliminados na segunda rodada pelos franceses Julien Benneteau e Edouard Roger-Vasselin: 6/3 e 7/6(2). Após a fantástica campanha na grama, Melo e Kubot terminaram o verão americano sem títulos. Foram vices em Washington, caíram na estreia em Montreal e perderam na semi em Cincinnati.
Sobre o autor
Alexandre Cossenza é bacharel em direito e largou os tribunais para abraçar o jornalismo. Passou por redações grandes, cobre tênis profissionalmente há oito anos e também escreve sobre futebol. Já bateu bola com Nadal e Federer e acredita que é possível apreciar ambos em medidas iguais.
Contato: ac@cossenza.org
Sobre o blog
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