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Marcio Torres: médico, técnico e, agora, empresário de Bob e Mike Bryan

Alexandre Cossenza

10/03/2015 13h36

Ele é mineiro, 34 anos, tem bom papo e circula fácil pelos bastidores dos maiores torneios. Formou-se em medicina esportiva, disputou torneios com sucesso moderado (foi número 132 do mundo em duplas) e foi técnico de Bruno Soares até que, meio por acaso, descobriu seu verdadeiro chamado no tênis. Marcio Torres passou de coach a empresário do amigo mineiro. A parceria deu tão certo que o manager passou, pouco depois, a administrar a carreira de Teliana Pereira, número 1 do Brasil. O sucesso chamou atenção internacional, e Torres agora também é quem dá as cartas nos novos contratos dos irmãos Bob e Mike Bryan, a dupla mais vencedora da história do tênis.

Quando sentamos para bater um papo durante o Rio Open, algumas semanas atrás, a ideia era falar sobre o sucesso comercial de Bruno Soares, mas uma coisa levou à outra (o homem é mesmo bom de papo) e a conversa só terminou dois dias depois, na beira da Quadra 1, vendo a partida de Feijão e André Sá contra Pablo Andújar e Oliver Marach. A maior parte da conversa rendeu essa reportagem para a Máquina do Esporte. Aqui no Saque e Voleio, publico a parte em que Torres conta sua transição das quadras para o empresariado e como, enfim, passou a manager da dupla mais importante do mundo.

Quando a gente se conheceu, você era técnico do Bruno e sócio da (fabricante de material esportivo) Solfire. Quando foi o salto definitivo para se tornar empresário?
Você quer ouvir a história toda?

Claro!
Eu conto uma versão resumida. Eu descobri que tenho uma perna maior do que a outra, estava tendo uma dor na bacia muito forte e fiquei um ano e meio parado. Foi quando fiz o MBA e voltei a jogar. Voltei com o ranking protegido, foi uma época que eu joguei com o Thiago Alves. A gente jogou Roland Garros e tal… Aí, depois de seis meses, comecei a sentir dor de novo. Eu parei, meu ranking caiu, teria que fazer fisioterapia e foi na época que o Bruno (Soares) saiu da equipe Centauro (fim de 2011). Eu morava nos Estados Unidos e vinha todos os anos fazer a pré-temporada com o Bruno e o Marcelo (Melo). E o Bruno falou "cara, seu ranking tá caindo, viaja comigo". Foi uma ideia maluca dele, eu nunca tinha pensado. Eu joguei mais dois Challengers e comecei a viajar como técnico do Bruno no Brasil Open. E ele ganhou com o (Eric) Butorac! Falei "esse negócio é legal. Primeiro torneio oficial, já saí com o título." Aí comecei a viajar com o Bruno e o Butorac e também com o Jamie Murray. Viajei com ele quase um ano como treinador. Ele jogava duplas com o Andy na época. A gente fez um embolado, eles dividiam as despesas e, para mim, era ótimo. Eu tinha três jogadores de ponta, um salário fixo, porcentagem dos três, então unia o útil ao agradável.

Por que largou, então?
Minha irmã e o marido dela são advogados nos Estados Unidos e eles ajudam os jogadores a fazer imposto de renda lá. A gente fazia isso há cinco anos. Eu estava mais ou menos no business. Chegou uma época que eu tinha mais ou menos 70 clientes jogadores. Muita gente, do mundo inteiro. Nesse ano, que eu estava com o Bruno de coach, foi o ano que ele começou a deslanchar mesmo. Começaram a surgir os patrocínios, e o Bruno falou "cara, me ajuda" e tal. E foi assim, natural. Todo mundo sempre falou que eu tinha jeito para isso. Eu jogava interclubes na Europa muitos anos e todos times eu enchia de amigo meu. O Marcelo jogou na Itália comigo, o Diogo Cruz também…O Grilli foi… Mas eram amigos. Eu ajudava, conseguia contratos para eles e não pedia nada em troca porque eu queria companhia.

Qual foi o primeiro contrato?
O primeiro contrato foi a Solfire, na verdade. Eu era sócio da empresa. Ela era minha no Brasil e falei com o Bruno "vamos jogar de Solfire e você vira meu sócio no Brasil." Eu já fazia o imposto de renda dele há muito tempo. Depois, vieram o BMG e a Asics. O primeiro contrato que fiz sozinho foi a Asics, que não é nada mau. Uma marca desse porte acreditou no Bruno desde cedo… Começamos bem. Eu estava como coach, fazendo os dois. No ano seguinte (2013), foi o boom dele. Eu adorava ser coach, ainda adoro e, quando precisar dar uns gritos, eu grito com ele (risos). E aí foi. Depois veio a Teliana e foram surgindo vários contratos. Foi uma transição natural e foi legal.

O Bruno, hoje, tem oito contratos de patrocínio. Mas de um cara que é famoso no país até a dupla mais famosa do mundo é um grande salto. Como foi?
Os Bryans são muito amigos do Bruno, treinam juntos direto. Esporadicamente, a gente vai jantar e tal… Bob mora em Miami há três anos. Como eu moro lá há 15 anos, sempre que ele está lá eu treino com ele. Aí, um dia, acho que o ego dele estava meio machucado, porque o Bruno estava cheio de propaganda na camisa, e ele disse "acho que você devia estar ajudando a gente". Achei que ele estava de brincadeira. Eles estavam com a empresa deles (Lagardère) há muito tempo. Falei "vocês estão falando sério? É comigo?" Ele disse que sim, então começamos a namorar. Obviamente, não foi um processo não simples porque estavam com várias coisas em andamento. Perguntaram como eu trabalhava, o que eu poderia ver, e a gente começou a fazer algumas coisas. Aí eles decidiram sair da empresa. A Lagardère vai cuidar desses contratos em andamento e, a partir de agora, todos novos negócios são comigo.

E já deu para fechar algum contrato para eles?
Nesse meio tempo, a gente ficou mais próximo, e agora praticamente treino com o Bob sempre que ele está em Miami… A gente janta junto, ele vai lá em casa… Enfim, já estamos íntimos, já fechamos dois contratos, então o negócio está de vento em popa. Um é a Barracuda, que é a maior empresa do mundo de firewall. Eles estão entrando forte no tênis, vão patrocinar Indian Wells. E eu também fiz o contrato do livro que eles estão escrevendo. É bem recente, mas começamos com o pé direito.

E foi uma negociação difícil com a Barracuda?
Estávamos negociando, mas perdi contato com o cara deles. Meu pai estava me levando para o aeroporto, e o cara me liga. Eu falei "estou indo para Londres agora. O contrato é para começar dia 1º de janeiro, mas se você me der um email por escrito que a gente vai fechar, não precisa assinar contrato nem nada, estou confiando em você e te dou a manga (da camisa dos Bryans) do Masters de presente". No dia seguinte, eu tinha que chegar e mandar fazer as camisas para eles jogarem naquela mesma noite. Cheguei em Londres, já estava confirmado. Peguei as camisas dos Bryans, mandei fazer e eles perderam o primeiro jogo. Trocaram de camisa porque acharam que estava dando azar, aí mandei fazer a preta, que era a camisa de treino, e eles ganharam a porcaria do torneio. Depois, mandamos a camisa assinada e a credencial para os caras (da Barracuda). E, no site da ATP, apareceu a manga. Enfim, não estava no contrato e demos um ATP Finals para os caras de graça (risos). Tinha uma manga vazia, não ia fechar nada de última hora, eu falei com os Bryans, e eles confiaram na minha palavra. Assinamos um contrato de um ano e agora, em fevereiro, eles já querem renovar.

Como é o seu processo de procurar empresas?
Geralmente, nas horas vagas, que são poucas, eu tento mapear as empresas multinacionais que já apoiam os torneios no mundo afora. Tento entrar em contato no Brasil, nos EUA e descobrir os presidentes, vice-presidentes e pessoas de cargo alto que têm a decisão, que gostam de tênis e que vão aos torneios. E são muitos porque tênis é um esporte de uma classe social legal. Tento unir o útil ao agradável. O cara que gosta de tênis, se ele tem a caneta e está assinando, ele tem a tendência de apoiar.

Tênis tem essa vantagem…
O tênis, eu acho, é o melhor esporte do mundo para relacionamento. A área VIP aqui (no Rio Open) é de alto nível. Você vai no futebol, no vôlei… Não tem essa qualidade. Quando as empresas entram no tênis, é único. E se eles querem se associar com pessoas de alto nível, é uma plataforma perfeita. E uma coisa que a gente faz com os Bryans, o Bruno e a Teliana é… nos levamos o presidente da Asics em Londres (no ATP Finals), o presidente da Optimum Nutrition também foi… O (Nasser) Mohamad, que é um amigo nosso da Bayard, também foi.

Mas vocês têm alguma parceria com a Bayard?
Não, é um amigo. Se um dia não fechar nada, eu tenho um amigo que gosta de tênis. E todos foram para Londres com credencial. Levamos eles ao vestiário. Para eles e outras pessoas, é uma experiência única. O cara gosta de tênis, senta com a gente no box, toma café da manhã do lado do Nadal e do Federer e almoça do lado de todo mundo. Ainda mais no Masters de Londres, que todo jogo é uma final de Grand Slam. O (Rogério) Melzi, presidente da Estácio, também foi a Londres.

Você está falando de marketing de relacionamento, mas em um âmbito diferente. Não é uma empresa, mas um jogador fazendo isso…
Eu e Bruno tentamos fazer algumas coisas diferentes e entregar a mais. Obviamente, a equipe do Bruno tem preparador físico, fisioterapeuta, a família, mas a gente sempre tem uma credencial extra e tenta coordenar. Por exemplo, o Melzi tinha uma reunião em Londres. Ele foi dois dias antes e curtiu o torneio. Para um fã de tênis, sentar na primeira fila e ver Federer e Wawrinka, um jogo que terminou 7/5 na negra, e depois comer com os caras… Não tem dinheiro que pague. É uma coisa que não se pode comprar. O cara mais rico do mundo, se ele não tiver acesso aos jogadores, não pode ter isso. Ele vai sentar na primeira fila, com ingresso comprado, e vai ficar no sol.

E dá para fazer isso com os Bryans também?
Dá. Tanto que, por exemplo, no caso da Barracuda, eles têm escritório em 36 países. Em alguns países-chave eles gostariam de convidar os clientes. A gente avisa. No US Open, para os Bryans, é um torneio difícil. Tem família, enfim. Mas no Masters de Xangai, onde a Barracuda tem um escritório gigante, dependendo da semana, a gente planeja antecipado e tenta fazer. Nos torneios dos EUA, eles são deuses, podem sempre pedir uma forcinha a mais, igual à gente aqui no Brasil. E assim vai. Tentamos. Poucas pessoas fazem isso. A gente não coloca isso no contrato porque eu não posso garantir, mas sempre damos um jeitinho.

E, talvez, por não estar no contrato, você cativa ainda mais o patrocinador…
E tem uns jogadores que, por exemplo, o Jamie Murray e o Andy Murray são amigos nossos. Em Wimbledon, eles precisam de muitas credenciais. Se a gente tem alguma sobrando, o Bruno dá. Aí em Roland Garros, o Bruno vai ter mais gente eles dão uma. Tem muita troca. E vai assim. Aqui, o Peya deu todas as credenciais dele. O (Philipp) Oswald, o (Oliver) Marach, o Julian Knowle… A gente tem um ciclo de amizades muito grande e vai ajudando um ao outro. É legal.

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Sobre o autor

Alexandre Cossenza é bacharel em direito e largou os tribunais para abraçar o jornalismo. Passou por redações grandes, cobre tênis profissionalmente há oito anos e também escreve sobre futebol. Já bateu bola com Nadal e Federer e acredita que é possível apreciar ambos em medidas iguais.
Contato: ac@cossenza.org

Sobre o blog

Se é sobre tênis, aparece aqui. Entrevistas, análises, curiosidades, crônicas e críticas. Às vezes fiscal, às vezes corneta, dependendo do dia, do assunto e de quem lê. Sempre crítico e autêntico, doa a quem doer.


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