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Lições sobre a final que escapou

Alexandre Cossenza

02/03/2014 06h00

Durante um set e meio, Federico Delbonis foi melhor em quadra. Sacou bem, foi mais sólido do fundo de quadra e quebrou o saque de Thomaz Bellucci duas vezes. O brasileiro perdeu a primeira parcial por 6/4 e perdia por a segunda por 4/2. Sacou em 15/40 e, tivesse perdido um dos dois pontos seguintes, veria o argentino sacar em 5/2, com o jogo praticamente ganho. Todos sairiam do Ibirapuera convencidos por um resultado justo, fruto de uma atuação bastante superior de Delbonis.

Só que não foi isso que aconteceu. Bellucci salvou os dois break points, viu o oponente jogar um game ruim, devolveu a quebra e, pouco depois, venceu o tie-break, forçando o terceiro set. Delbonis começou mal, ficou atrás no placar, e o brasileiro abriu 4/3 e saque, com 30/15 no placar. Foi aí que a coisa começou a desandar para o tenista da casa e um barulhento ginásio. Após um erro, Bellucci cedeu break point e cometeu uma dupla falta: 4/4.

Irritado, o paulista ainda voltou a falhar no game seguinte, jogando para fora uma devolução de segundo saque com 40/30 no placar – depois de duas curtas erradas em sequência do oponente. Depois, Bellucci perdeu o saque. Game, set, match, Delbonis: 6/4, 6/7(5), 6/4. O argentino está na final do Brasil Open, e o público do Ibirapuera sai decepcionado com a enorme chance desperdiçada.

É compreensível o sentimento de decepção, ainda mais depois de ver o tenista da casa sair de um buraco, inverter o panorama e estar a seis pontos (!) da final do torneio. É preciso lembrar, contudo, que Delbonis foi o melhor tenista em quadra durante a maior parte do dia. O argentino sacou bem, agrediu com mais eficiência e, não fosse a pressão exercida pelo público no fim do segundo set, provavelmente teria fechado o jogo rapidinho, sem drama. E foi bacana notar que Bellucci analisou o jogo exatamente como deveria: dando méritos ao rival e admitindo suas falhas.

"Em certos momentos, consegui ser superior, mas na maioria do jogo eu estive atrás. Acho que ele foi superior. Até eu conseguir a quebra no segundo set, ele não me deu chance nenhuma, acho que eu não tive nenhum break point. Eu consegui reverter uma situação difícil, mas na hora de matar o jogo não tive competência de liquidar. Fiz o mais difícil, que era reverter a situação, e na hora que estava em cima, jogando melhor, deixei escapar algumas chances. Foi crucial. Neste nível, não dá para você jogar tão mal quanto eu joguei do 4/2 em diante."

Fazendo um balanço das últimas duas semanas, vale notar que Bellucci deu menos pontos de graça a seus adversários. Viveu bons e maus momentos, sim, mas foi muito mais sólido do que vinha sendo. Tudo é consequência do que vem sendo pedido por Francisco "Pato" Clavet, seu técnico. A ideia é cometer menos erros e também esperar por falhas dos oponentes. A tática, em tese, cria um conflito com o tênis instintivo de Bellucci, que sempre quer atacar primeiro, mas até agora o brasileiro vem mostrando rara paciência nas trocas de bola.

"Uma coisa que ele (Clavet) vem falando desde o ano passado é que eu tinha, mesmo com vantagem no placar, jogar mais sólido, cometer menos erros. Sem perder a minha personalidade, minha postura dentro de quadra, que é jogar agressivo e buscar os winners. Isso é uma coisa que ele tem tentado trabalhar bastante. Estou mais consistente e agora ele bate mais na tecla ainda de que eu tenho que mudar a maneira de enxergar o jogo e de tentar diminuir um pouco a velocidade, jogar um pouco no erro do adversário, trabalhar mais os pontos."

Sem ir na toalha (para ler em até 25 segundos):

– No ranking da próxima semana, Bellucci aparecerá entre os 90 melhores tenistas do mundo. Será uma ascensão de mais de 20 posições, suficiente para colocá-lo diretamente nas chaves dos ATPs menores e dos Grand Slams. Por enquanto, vagas em ATPs 500 (em sua maioria) e Masters 1.000 ainda precisarão ser conquistadas via qualifying.

– Pela primeira vez desde 2007, o Brasil Open não terá um espanhol como campeão. Desde que o argentino Guillermo Cañas levantou o troféu, o torneio brasileiro viu os títulos ficaram com Nicolás Almagro (2008, '11 e '12), Tommy Robredo (2009), Juan Carlos Ferrero (2010) e Rafael Nadal (2013). E também será a primeira final sem um espanhol desde, vejam só, 2004!

– É a primeira vez que Delbonis disputa a chave principal do Brasil Open. Nas quatro edições anteriores do torneio, o argentino parou no qualifying.

Coisas que eu acho que acho:

– Sim, o público saiu decepcionado, mas é bom lembrar que ninguém vaiou ou reclamou a ponto de deixar Bellucci mais nervoso ainda. Pela primeira desde 2010, o número 1 do país não é vaiado no Brasil Open. Já é um começo.

– Há muito a comemorar se você é fã de Bellucci. Nas últimas duas semanas, o número 1 do Brasil venceu jogando bem, mas também venceu jogando mal. Fez ajustes táticos que fizeram falta em boa parte de sua carreira e, hoje, parece disposto a seguir corrigindo falhas em seu tênis. Não se pode pedir muito mais do que isto de um atleta profissional.

– Federico Delbonis x Paolo Lorenzi é a final do torneio paulista. O argentino é o número 61 do mundo, enquanto o italiano é o 114º e disputava Challengers na América do Sul no fim do ano passado. Não é exatamente a final dos sonhos da Koch Tavares, organizadora do torneio. Deve ser, por outro lado, uma final sonhada pelos dois tenistas. Quem vencer levantará um troféu de ATP pela primeira vez.

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Sobre o autor

Alexandre Cossenza é bacharel em direito e largou os tribunais para abraçar o jornalismo. Passou por redações grandes, cobre tênis profissionalmente há oito anos e também escreve sobre futebol. Já bateu bola com Nadal e Federer e acredita que é possível apreciar ambos em medidas iguais.
Contato: ac@cossenza.org

Sobre o blog

Se é sobre tênis, aparece aqui. Entrevistas, análises, curiosidades, crônicas e críticas. Às vezes fiscal, às vezes corneta, dependendo do dia, do assunto e de quem lê. Sempre crítico e autêntico, doa a quem doer.


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