O mistério e o que significa a suspensão de Feijão
A notícia surgiu na tarde de sábado, em um documento no site da Unidade de Integridade do Tênis (TIU, na sigla em inglês): João Souza, o Feijão, está suspenso provisoriamente. Atual #12 do mundo no ranking da ITF e #404 na lista da ATP, o paulista de 30 anos é acusado de violar o programa anticorrupção do tênis. Sua punição começou a contar no dia 29 de março e, por enquanto, não há data para ele posso voltar a competir.
A grande questão aqui é saber o que isso significa, já que o comunicado da TIU é muito pouco específico. Feijão não quis falar sobre o assunto, o que também complica, mas de cara é importante fazer a seguinte distinção: não é uma suspensão preventiva, mas uma punição provisória. A TIU não está tentando impedir que algo aconteça. Está, sim, evitando determinar uma sanção definitiva até que os fatos todos estejam investigados e esclarecidos.
O porquê do comunicado pouco específico parece fácil de entender. O cenário mais provável é que a TIU já tenha provas de uma infração cometida por Feijão (imagino que o órgão não seria irresponsável de puni-lo sem ter algo conclusivo, o que deixaria margem para um processo indenizatório potencialmente milionário), mesmo que essa infração tenha sido "apenas" não colaborar com uma investigação – o argentino Federico Coria foi suspenso por oito meses pelo mesmo motivo. Vale lembrar que em 2016, Feijão revelou, sem citar nomes, saber de casos de manipulação de resultados.
"Eu sei de caras que já se venderam, caras que fazem… O circuito é muito pequeno, todo mundo sabe os caras que fazem e não fazem. Então, você acaba entendendo. Todo mundo tem amor ao tênis, mas quer fazer dinheiro com o negócio. É muito mal pago. A gente não vive de top 100. E os outros? É muito bem pago Grand Slam, Masters 1000, torneios 500, 250… mas e o resto? Imagina um espanhol que veio para cá, disputar um Challenger, com treinador, hotel, comida… É muito gasto. Se você não está entre os 100, vai perder dinheiro. O cara te manda e-mail, Facebook, consegue teu whatsapp… Te oferece 15 mil euros. Você vai fazer o que? Um cara que a família não tem condição, sem patrocínio. Eu entendo esse lado", disse ao Globoesporte.com na época.
Além disso, é bem possível que a TIU esteja no meio de uma investigação, ainda sem saber todos os desmembramentos do caso. Em outras palavras, podem estar apurando a participação de outros atletas e até o suposto envolvimento de Feijão – o que justificaria a punição apenas em caráter provisório.
Também faz sentido, portanto, que a TIU não divulgue o torneio, quando a infração foi cometida e em que partida. Com investigações em andamento, não cabe colocar em alerta outras pessoas que estão sendo averiguadas – e que, principalmente, não sabem que estão sob a lupa do órgão.
WO no último torneio
Feijão vinha agindo como se não fizesse ideia de que uma suspensão estava próxima de ser anunciada. Nos últimos dias, o paulista vinha postando seguidos vídeos de seus treinos na Tennis Route, para onde se mudou após o período nos Estados Unidos. Normalmente, em casos assim, tenistas desaparecem das redes sociais e citam alguma lesão misteriosa para justificar sua ausência no circuito.
Estranha, no entanto, que a última partida de Feijão no circuito mundial tenha sido uma derrota por WO na chave de duplas do Challenger de Santiago, no começo de março. Coincidência ou não, o torneio chileno recebeu visita de integrantes da Unidade de Integridade do Tênis.
Coisas que eu acho que acho:
– Ler um comunicado desses é bem triste para mim. Acompanhei a carreira toda de Feijão (nossa primeira entrevista foi 12 anos atrás) e não esperava que algo assim pudesse acontecer. Em muitas entrevistas, sempre me pareceu uma pessoa honesta e sincera. Em outubro, durante o Challenger de Campinas, Feijão falou comigo sobre sua posição política e como seu voto era no candidato que ele achava ser o mais honesto. Naquele momento, integridade parecia ser uma palavra-chave. Fica minha torcida, talvez irracional, para que tudo não passe de um pesadelo.
– Conhecendo Feijão, imagino que se ele não tivesse culpa alguma (mesmo que não tenha manipulado resultados e sua infração tenha sido a de não colaborar com a investigação ou a de não reportar casos de manipulação), estaria enchendo suas redes sociais com posts falando sobre sua inocência. O silêncio não joga exatamente a seu favor. Já há fãs perguntando – sem resposta – o que aconteceu na conta de Instagram do atleta.
– Uma notícia dessas é triste para o tênis brasileiro em muitos níveis. Uma modalidade mal administrada, que teve casos recentes de doping envolvendo nomes importantes como Bellucci e Demoliner (além de Igor Marcondes e outros), agora vê seu segundo atleta em menos de quatro meses suspenso pela Unidade de Integridade do Tênis (Diego Matos está suspenso provisoriamente desde 9 de dezembro de 2018).
– Aproveitando o gancho sobre a administração do tênis brasileiro, lembro que Jorge Lacerda esteve presente na recente cerimônia de abertura do Roland Garros Junior Wild Card Series. A CBT, lembremos, acaba de perder seu patrocínio principal (Correios). Será que algum executivo sério do setor privado, de empresa grande, vai querer patrocinar uma entidade que mantém relações com uma pessoa condenada a quatro anos de cadeia por peculato – e condenada justamente por uma ação à frente dessa mesma entidade?
– Quando falo de empresa grande, do setor privado, falo de um patrocínio verdadeiro, sério, de grande porte. Não é o empresário de pequeno porte que patrocina um evento porque gosta de bater uma bolinha e quer aulas com um ex-tenista. A CBT precisa pensar como a entidade grande que precisa e pode ser. E não vai ser assim enquanto relações pessoais forem prioridade.
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