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Brasil convocado para a Davis: Thiago Wild é o futuro

Alexandre Cossenza

15/12/2018 05h00

A Confederação Brasileira de Tênis (CBT) anunciou o time que vai disputar a fase classificatória da Copa Davis em 2019. O Brasil vai encarar a Bélgica nos dias 1 e 2 de fevereiro, no saibro coberto, em Uberlândia, e quem vencer vai disputar a fase final Davis, em Madri, no mês de novembro. A equipe selecionada pelo capitão João Zwetsch terá Thiago Monteiro, Rogério Dutra Silva, Thiago Wild, Bruno Soares e Marcelo Melo.

Classificado como "força máxima" no texto enviado à imprensa pela CBT, o time tem os simplistas números 1 (Monteiro), 2 (Rogerinho) e 13 (Wild) do país. Com um regulamento em que todos os cinco tenistas podem jogar (antes, o quinto tenista ajudava nos treinos, mas não podia disputar o confronto), diz bastante a convocação de Wild. Fica claro que João Zwetsch, também treinador pessoal do paranaense de 18 anos, aposta todas suas fichas no futuro do atual #530 do mundo.

No papel, há dez tenistas na frente de Wild no ranking – inclusive Bellucci, que apesar da péssima fase ainda é o número 3 do Brasil; Clezar, que tem experiência em Davis; e Feijão, que venceu os últimos três torneios que disputou (Futures no Brasil) e vem treinando em Miami com gente do calibre de Andy Murray e Fernando Verdasco. Se Thiago Wild foi o convocado com a chance de ser escalado é porque Zwetsch está olhando para o futuro e considerando que o paranaense será "o" cara que vai liderar o time em determinado momento. Mostra também que o capitão não leva tanta fé – pelo menos no momento – na geração de Orlandinho, que vive a melhor fase da carreira em termos de ranking (21 anos, #371 do mundo).

Esse papel de quinto tenista coloca certa pressão sobre Wild? Hum… Até coloca, mas não parece ser o tipo de coisa que vá incomodar o paranaense. É, aliás, uma característica que gosto muito em Wild. Ele não se assusta com expectativa, não vai perder jogos por medo de não corresponder. Pelo contrário. Pode até pecar por querer muito, se afobar ou exigir muito de si mesmo, mas nunca se deixa leva pelo que os outros querem ou esperam dele.

E David Goffin?

É difícil fazer qualquer tipo de prognóstico até que se confirme a presença de David Goffin como número 1 do time belga. Sem ele, o Brasil seria favoritíssimo. Mas também seria estranho se Goffin, presença constante na Davis, não vestisse as cores dos Diabos Vermelhos desta vez. Ainda mais com o confronto jogado em dois dias, com duas partidas em melhor-de-três. E, com o atual #22 do mundo em quadra, deve haver equilíbrio.

Goffin já está confirmado no ATP 500 de Roterdã, que começa dia 11 de fevereiro e é jogado em quadras duras. Com a Davis nesse novo – e mais curto – formato, haveria tempo de sobre para o belga sair de Uberlândia, voltar à Europa e se preparar para um ATP 500 em quadra dura. Goffin seria favorito tanto contra Rogerinho quanto contra Monteiro, mas o Brasil precisaria "apenas" vencer o número 2 belga e ganhar nas duplas.

Está longe de ser o pior dos cenários possíveis, mas para isso acontecer Thiago Monteiro precisa elevar seu nível de jogo na Davis (ele mesmo admite que ainda deve grandes atuações defendendo o país). Será seu primeiro confronto em casa, com torcida a favor. Pode ser justamente o que ele precisa. E o Brasil também.

Coisas que eu acho que acho:

– Preocupa o momento de Orlandinho. Não tanto por seus resultados em quadra, já que o gaúcho mostrou evolução desde que se mudou para Barcelona – com ajuda da CBT – para treinar com Leo Azevedo. Suas declarações, contudo, vêm mostrando uma certa desconexão com o que acontece à sua volta. Primeiro, na bela reportagem do "trio Break Point" sobre o cenário do tênis brasileiro, Orlandinho (que tem ajuda financeira da CBT e um patrocínio de R$ 249 mil do Banrisul via Lei de Incentivo) disse que é preciso um Centro de Treinamento no país.

– O mesmo Orlandinho que afirmou ser vantajoso treinar na Espanha porque "deve ter de 10 a 15 jogadores top 100 morando em Barcelona hoje, e para treinar fica muito mais fácil, para ter essa convivência com eles." O gaúcho também disse que "no Brasil a gente não tem, não tem os jogadores, é tudo muito longe. Eu desde que cheguei [na Espanha] treinei com vários jogadores top 100. Treinei com Carballes Baena, treinei com Granollers, com Adrián Menéndez, João Sousa e inúmeros. Tenho certeza que isso faz parte do meu crescimento."

– Se para Orlandinho não há jogadores no Brasil, de que adianta um centro de treinamento? Será que o gaúcho já conversou sobre isso com a CBT, que lhe ajuda financeiramente e foi quem assegurou a parceria com a academia BTT e o técnico Leo Azevedo?

– Mais recentemente, Orlandinho se revelou confuso com os novos rankings do tênis. Disse que não sabe como vai se inscrever nem como fazer seu calendário. "Seu eu não tivesse feito oitavas de final de Challenger na Argentina, ia acabar o ano 380 e começar 600", disse o gaúcho.

– Aqui a crítica vale não só para Orlandinho, mas para a maioria dos brasileiros (estive em cinco Futures e vi que quase ninguém sabe como vai funcionar o circuito de transição da ITF). A ITF anunciou as mudanças em fevereiro. Ao longo do ano, divulgou vídeos explicando as mudanças. Os atletas tiveram acesso a um "shadow ranking" e puderam acompanhar ao longo do ano qual seria seu ranking sob o novo regulamento, que começa em 2019. Se, em dezembro, Orlandinho ainda não sabe o que fazer, não dá mais para culpar a ITF por falta de comunicação. Faltou correr atrás. Todos tiveram dez meses para isso. Passou o tempo em que não fazer o dever de casa significava pouco. Hoje, é a carreira, a profissão da pessoa que está em jogo. E quem não é bom profissional, seja dentro ou fora da quadra, eventualmente fica para trás.

Mais coisas que eu acho que acho:

– Um centro de treinamento era o sonho de Jorge Lacerda, que prometeu e não cumpriu. O Projeto Olímpico foi um fracasso retumbante. O assunto CT perdeu força na gestão Westrupp, mesmo com o Centro Olímpico inutilizado (haverá um evento de showbol em breve!). Hoje, os melhores brasileiros treinam fora do país. Bellucci e Feijão estão nos EUA. Rogerinho e Monteiro treinam com argentinos. Talvez uma coisa (a falta de um CT) tenha levado à outra (brasileiros treinando fora). Talvez não. Mas talvez um CT, no cenário atual, não faça mais o sentido que já fez. Se existisse, seria um projeto para dar resultado a longo prazo – décadas – e não teria o efeito sugerido por Orlandinho.

– O buraco em que o tênis brasileiro de alto rendimento (nas simples) se enfiou não apareceu do nada. Foi cavado durante anos, com a gestão Lacerda fazendo um enorme mal ao esporte por conta de brigas pessoais. Lacerda destruiu circuitos juvenis, ameaçou tenistas e árbitros que participassem de eventos de uma promotora, negou credenciais e abusou de influência contra quem não gostava. Fez tudo isso tudo ao longo de 12 anos, justamente quando houve a maior entrada de dinheiro no tênis (o período pré-olímpico).

– A ressaltar: a maioria dos tenistas de alto rendimento jamais se manifestou contra Lacerda, mesmo sabendo de todas manobras de bastidores do ex-presidente. Não há inocentes nessa história, infelizmente.

Sobre o autor

Alexandre Cossenza é bacharel em direito e largou os tribunais para abraçar o jornalismo. Passou por redações grandes, cobre tênis profissionalmente há oito anos e também escreve sobre futebol. Já bateu bola com Nadal e Federer e acredita que é possível apreciar ambos em medidas iguais.
Contato: ac@cossenza.org

Sobre o blog

Se é sobre tênis, aparece aqui. Entrevistas, análises, curiosidades, crônicas e críticas. Às vezes fiscal, às vezes corneta, dependendo do dia, do assunto e de quem lê. Sempre crítico e autêntico, doa a quem doer.