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A chegada de Khachanov

Alexandre Cossenza

05/11/2018 05h00

Por pouco, não aconteceu antes. Karen Khachanov era uma bomba prestes a explodir. Ele tirou um set de Juan Martín del Potro no Australian Open, levou Alexander Zverev ao limite em Roland Garros e fez um partidaço contra Rafael Nadal no US Open. O russo de 22 anos vinha mostrando suas armas. Faltava fazer tudo funcionar contra a elite, e foi isso que aconteceu na última semana, no Masters 1000 de Paris.

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Foram dias espetaculares para o jovem de 1,98m de altura. Depois de eliminar Filip Krajinovic e Matthew Ebden, Khachanov enfrentou uma sequência de quatro tenistas do top 10. Começou num duelo dramático com John Isner que incluiu três match points perdidos no segundo set e outros dois salvos no terceiro. Em seguida, duas atuações impecáveis: 6/1 e 6/2 sobre Zverev, 6/4 e 6/1 sobre Dominic Thiem. E o que dizer da final contra Novak Djokovic, invicto há 22 jogos, somando 33 vitórias e só uma derrota desde o começo de Wimbledon? Foi a coroação da "chegada" de Khachanov à elite.

Não parecia que aconteceria. Djokovic, o favorito, embalado (e também desgastado) por um triunfo sobre Federer na semifinal, abriu 3/1 e 30/0 sobre o russo. Mas, aos poucos, Khachanov "entrou" naquela final. Devolveu a quebra, igualou o placar em 3/3 e começou a mostrar que o sérvio, número 1 do mundo a partir desta segunda-feira, teria um problemão para resolver em Paris.

Problemão porque Khachanov leva para a quadra uma combinação nada comum. No ataque, um primeiro saque poderoso, uma direita agressiva e cheia de spin – o que lhe permite correr menos riscos com bolas passando com certa folga pela rede – e um jogo de rede competente, com boa mão e ótima envergadura. Na defesa, uma mobilidade rara para um atleta de 1,98m e contra-ataques precisos (entenda no vídeo acima!).

Quando isso tudo funciona, o adversário entra em um sério dilema. Qual a melhor postura para enfrentar Khachanov? Apostar na regularidade permite que o russo tome a iniciativa dos pontos, o que é sempre perigoso contra um forehand pesado e com spin. Por outro lado, atacar primeiro é correr mais riscos e encarar os contra-ataques do garotão. Nadal teve problemas em Nova York. Djokovic levou várias passadas neste domingo.

O resumo da história é que Nole não conseguiu encaixar as peças desse quebra-cabeça. Desde que teve o saque quebrado pela primeira vez na final, o sérvio não conseguiu um break point sequer. Khachanov é que poderia ter fechado a conta mais cedo, mas não foi feliz nos três break points que conquistou no sétimo game do segundo set. Eles não fizeram falta. Nos dois últimos games de saque, o russo cedeu apenas um ponto. Game, set, match: 7/5, 6/4.

Aliás, ressalte-se aí outra qualidade do russo. Não houve tremedeira na hora de fechar. Talvez pela confiança adquirida nos triunfos sobre Isner, Zverev e Thiem, Khachanov não aliviou quando viu o título se aproximando. Não encurtou pontos, não se afobou, não plantou abóboras. Manteve-se firme nas trocas, sem mudar nada do que vinha fazendo. Para mostrar ao mundo inteiro que ele, de fato, chegou.

Coisas que eu acho que acho:

– A campanha em Paris coloca Khachanov na 11ª posição do ranking mundial. É seu melhor posto na carreira e, considerando que não são tantos assim os pontos que precisa defender até Miami/2019, são boas as chances de o russo entrar no top 10 já no primeiro semestre do ano que vem.

– Campeão também do ATP 250 de Moscou, o jovem de 22 anos venceu 11 de seus últimos 12 jogos. A derrota solitária aconteceu nas oitavas de final do ATP 500 de Viena, diante de Kei Nishikori: 6/2 e 6/2.

– Khachanov é daqueles tenistas que não tiveram currículo espetacular como juvenil. Seu melhor ranking na faixa etária foi #13. Nunca passou da estreia no Australian Open, e não passou da segunda rodada no US Open ou em Wimbledon. Jogou Roland Garros duas vezes e não passou das oitavas. Em 2014, inclusive, foi eliminado por Marcelo Zormann por 6/7(3), 6/4 e 9/7. Nos Jogos Olímpicos da Juventude, ficou com a medalha de prata nas duplas. Ele e Andrey Rublev perderam a final para Orlandinho e Zormann.

– Nesta segunda-feira, Novak Djokovic volta a ocupar o posto de número 1 do mundo. Ele tem 8.045 pontos, contra 7.480 de Rafael Nadal. Com 1.500 pontos em jogo no ATP Finals, o espanhol terá a chance de reconquistar a posição na próxima semana, mas, a julgar pelo nível de tênis que Nole vem apresentando e considerando o fato de o espanhol estar voltando de lesão, parece improvável uma nova troca de postos.

– Não acredito que o desgaste das 3h02min da semifinal contra Federer tenha sido determinante no resultado da final. Sim, Djokovic demonstrava cansaço no fim do segundo set contra Khachanov, mas continuava jogando ralis quando necessário. Foi assim no último game. Além disso, o mundo inteiro já viu o quanto Djokovic consegue jogar em alto nível mesmo cansado.

Sobre o autor

Alexandre Cossenza é bacharel em direito e largou os tribunais para abraçar o jornalismo. Passou por redações grandes, cobre tênis profissionalmente há oito anos e também escreve sobre futebol. Já bateu bola com Nadal e Federer e acredita que é possível apreciar ambos em medidas iguais.
Contato: ac@cossenza.org

Sobre o blog

Se é sobre tênis, aparece aqui. Entrevistas, análises, curiosidades, crônicas e críticas. Às vezes fiscal, às vezes corneta, dependendo do dia, do assunto e de quem lê. Sempre crítico e autêntico, doa a quem doer.