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ITF radicaliza para tentar tornar circuito profissional sustentável

Alexandre Cossenza

30/03/2017 12h56

A Federação Internacional de Tênis (ITF) anunciou, nesta quinta-feira, uma série de grandes mudanças no circuito profissional e no sistema de transição pós-juvenil. A intenção da entidade é reduzir o número de tenistas profissionais a um "grupo verdadeiramente profissional" de cerca de 750 homens e 750 mulheres. Hoje, segundo estimativas da ITF, há por volta de 14 mil tenistas competindo em torneios profissionais, e quase metade desse número é composta por gente que não recebe prêmio em dinheiro.

Como isso vai funcionar? Segundo o comunicado da ITF, os atuais torneios de US$ 15 mil serão reposicionados e deixarão de fazer parte do circuito profissional. Eles passarão a integrar uma "Transition Tour" – turnê/tour de transição — e não distribuirão dinheiro, mas darão pontos de entrada na ITF. Só quem tiver esses pontos de entrada vai poder jogar o circuito profissional. A ITF ainda enfatiza que esses torneio de transição serão realizados em espécies de pequenos circuitos regionais, o que vai diminuir custos para tenistas e organizadores.

Segundo a entidade, essa nova estrutura vai "introduzir um caminho profissional mais claro e eficiente e garantir que o prêmio em dinheiro no circuito profissional da ITF [o atual nível Future da ATP] seja mais bem direcionado para garantir que mais jogadores possam viver do esporte profissional."

Na prática, a ITF está criando um funil para reduzir também o número de eventos profissionais (leia-se "que distribuem dinheiro"). A consequência mais desejada do processo é fazer com que o prêmio em dinheiro que existe atualmente no circuito seja suficiente para manter esse "grupo verdadeiramente profissional" de jogadores em atividade – mesmo que exista outro efeito cruel, que é tornar o tênis competitivo um esporte de acesso ainda mais complicado.

A ITF diz ter chegado a essas conclusões após um longo processo de análise do tênis que incluiu dados de 2001 a 2013 e entrevistas com mais de 60 mil pessoas no meio do tênis (jogadores, federações, técnicos e promotores). O novo presidente da entidade, David Haggerty, diz que "foi o maior estudo do tênis profissional já feito e que ressaltou os 'desafios' (em corporativês, desafio é sinônimo de problemas e defeitos) consideráveis na base de nosso esporte. Mais de 14 mil tenistas competiram no nível profissional no ano passado, e isso é simplesmente demais. Mudanças radicais são necessárias para tratar das questões de transição entre o tênis juvenil e o profissional, viabilidade financeira e custos de torneios."

Números de 2013 a considerar:

– Segundo o estudo, um tenista homem gastava, em média, US$ 38 mil por ano, enquanto uma mulher precisava gastar US$ 40.180. Esse número inclui voos, hospedagem, comida, encordoamento, lavanderia, roupas, equipamento e transporte, mas não leva em conta gastos com treinadores.

– O chamado "break even point" (quando o tenista pelo menos não perde dinheiro para se manter jogando) era o 336º posto no ranking da ATP. Na WTA, o mesmo era o 253º lugar.

– Um total de 3.896 tenistas homens disputaram torneios profissionais e não receberam prêmio em dinheiro nenhum; no circuito feminino, 2.212 atletas jogaram e não ganharam nada.

– Apenas 1% dos tenistas homens abocanhou 60% (US$ 97.448.106) do total do prêmio em dinheiro (cerca de US$ 162 milhões). Entre as mulheres, o mesmo 1% da elite levou 51% da premiação total (cerca de US$ 120 milhões).

Coisas que eu acho que acho:

– Talvez mais importante do que a ITF tomar medidas para mudar o tênis tenha sido a postura de abrir o jogo, citando números e sem esconder o tamanho da desigualdade no esporte e o quão difícil é sobreviver jogando em torneios pequenos. Os relatórios citam várias estatísticas, ilustradas com gráficos e planilhas de todo tipo. Quem quiser se aprofundar pode ler sobre o circuito profissional aqui e sobre o circuito juvenil aqui. O relatório com as entrevistas dos jogadores está neste link, e as entrevistas com não-tenistas estão aqui.

– Uma dos pontos que achei interessante nas pesquisas de opinião é que 70% dos não-tenistas concordaram que havia uma necessidade de mudar a distribuição do prize money. Entre essas mesmas pessoas, a maioria era favorável a aumentar o dinheiro nas primeira rodadas e reduzir nas fases finais. E a opção menos popular foi eliminar as chaves de duplas.

Sobre o autor

Alexandre Cossenza é bacharel em direito e largou os tribunais para abraçar o jornalismo. Passou por redações grandes, cobre tênis profissionalmente há oito anos e também escreve sobre futebol. Já bateu bola com Nadal e Federer e acredita que é possível apreciar ambos em medidas iguais.
Contato: ac@cossenza.org

Sobre o blog

Se é sobre tênis, aparece aqui. Entrevistas, análises, curiosidades, crônicas e críticas. Às vezes fiscal, às vezes corneta, dependendo do dia, do assunto e de quem lê. Sempre crítico e autêntico, doa a quem doer.