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AO, dia 3: uma zebra caseira, um recorde de aces e uma “girafa” na torcida

Alexandre Cossenza

20/01/2016 10h37

Não foi uma quarta-feira de muitas surpresas no Australian Open, mas teve emoção – e muita – no Melbourne Park. Enquanto Serena, Sharapova, Federer e Djokovic passearam na quadra central do complexo, a australiana nascida em Moscou Daria Gavrilova roubou a cena e derrubou a top 10 tcheca Petra Kvitova – para delírio de uma animada (e em parte alcoolizada) torcida local.

Mais longe dos holofotes, na Quadra 8, Kristyna Pliskova quebrou o recorde de aces do tênis feminino em uma longa e dramática partida contra a porto-riquenha Monica Puig. Este resumaço do terceiro dia de torneio trata dos jogos acima, mas também registra as vitórias brasileira, um lob espetacular de um argentino, uma multa recorde (e, ao mesmo tempo, uma piada enorme) e uma girafa – ou quase isso – na beira da Quadra 5. Role a página e fique por dentro.

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Os favoritos

A rodada começou pontualmente apenas nas arenas cobertas (Rod Laver, Hisense e Margart Court – ou RLA, HA e MCA) por causa da chuva, então ficou mais fácil prestar atenção em Maria Sharapova, que não demorou para despachar a bielorrussa Aliaksandra Sasnovich: 6/2 e 6/1. A diferença de nível entre Sharapova e a #105 do mundo era tanta que ainda é difícil medir o quanto a russa tem de condições reais de brigar pelo título.

A favor da #5 do mundo ficaram as porcentagens de pontos ganhos com a devolução (67%) e de break points convertidos (6/9 para 67%). Por outro lado, Sharapova somou mais erros não forçados (24) do que winners (22) e teve baixo aproveitamento quando precisou do segundo serviço (41%).

São números que preocupam tendo em vista a possibilidade de enfrentar Belinda Bencic nas oitavas e Serena Williams nas quartas. Obviamente, ainda é cedo no torneio, e Sharapova ainda tem alguns dias para calibrar seus golpes. E Bencic, aliás, derrotou Timea Babos por duplo 6/3.

Serena Williams, que entrou em quadra logo em seguida, foi bem convincente no triunfo por 6/1 e 6/2 sobre Su-Wei Hsieh, #90. Foram sete aces, 85% dos pontos vencidos no primeiro serviço (e 52% com o segundo), 26 winners e 16 erros não forçados. O jogo durou uma horinha e, se não foi um teste de verdade para a número 1 do mundo, foi bom para evitar desgaste.

A americana parecia meio sem vontade durante a coletiva desta quarta, mas respondeu numa boa a um par de perguntas sobre Roberta Vinci – sua algoz no US Open do ano passado – feitas por um jornalista italiano. No entanto, quando indagada se tinha visto novamente sua derrota em Nova York, Serena foi irônica e rebateu: "Sim, vejo todos os dias. Todas as noites para me preparar."

Em seguida, Roger Federer fez mais do mesmo, ou seja, venceu com facilidade e esbanjando talento uma partida de primeira semana num Slam. A vítima da vez foi Alexandr Dolgopolov (#35). O ucraniano, aliás, deveria ter percebido logo cedo que o dia seria complicado. No primeiro game, o suíço fez dois aces, mas o segundo acabou invalidado pelo replay. Sem problema. Federer foi lá e fez um ace de segundo saque.

Ao todo, o #3 do mundo disparou 25 saques indefensáveis – o bastante para jogar bem à vontade seus games de serviço e pressionar Dolgopolov. O azarão, que s´ø venceu 16 pontos no saque do oponente, até que fez um segundo set razoável, mas sucumbiu no fim, cedendo uma quebra no 11º game, depois de desperdiçar um game point. Federer deslanchou e não olhou mais para trás.

À noite, no último jogo da RLA, Novak Djokovic passou sem drama pelo wild card francês Quantin Halys: 6/1, 6/2 e 7/6(3). O único momento de algum suspense veo no início do terceiro set, quando Halys quebrou Djokovic e fez 2/0. O número 1 do mundo, contudo, devolveu a quebra no game seguinte e só perdeu mais três pontos no serviço até o fim do jogo.

O canhão / O recorde / O jogo mais legal do dia

Roger Federer disparou 25 aces contra Alexandr Dolgopolov, mas o destaque da rodada fica por conta de Kristyna Pliskova, #114. No dramático duelo contra Monica Puig (#52), a tcheca acumulou 31 aces.

Kristyna, entretanto, não conseguiu tirar o máximo de seu saque quando esteve perto da vitória. A tcheca sacou em 6/3 no tie-break do segundo set e não converteu nenhum dos três match points. Ela ainda teve outros dois match points no terceiro set, mas Puig, que tinha o serviço, se salvou. No fim, a porto-riquenha conseguiu uma quebra no 15º game e fechou a partida em 4/6, 7/6(6) e 9/7, em 2h22min.

O jogo mais esperado

Desde que saiu a chave, os olhos de todos já estavam nessa partida. A ex-top 5 Eugenie Bouchard (#37), tentando voltar ao ranking que seu tênis parece merecer, poderia encarar logo na segunda rodada Agnieszka Radwanska, atual #4 e vindo de título no WTA de Shenzhen. Pois aconteceu na noite desta quarta.

Só que a expectativa de todos – minha inclusive – talvez tenha sido baseada na Bouchard top-5, não na Bouchard pós-2015-trágico-em-busca-de-recuperação. Embora jogando melhor do que no ano passado, a canadense não mostrou a consistência necessária para superar a Radwanska de hoje, que vem de títulos no WTA Finals e em Shenzhen. A polonesa, assim, conquistou sua nona vitória seguida ao fazer 6/4 e 6/2 em 1h25min de partida.

A maior consequência do resultado é a saída de Bouchard do top 50. A canadense, que defendia quartas de final, perderá a maioria dos 360 pontos somados em 2015. Uma queda que se refletirá inclusive na chave do Rio Open, daqui a cerca de um mês. Agora, é bem provável que Teliana Pereira seja a primeira cabeça de chave – e o Brasil não tem um simplista como cabeça 1 de um torneio há mais de 10 anos.

Cabeças que rolaram

Se não houve muita emoção na RLA, o público australiano teve muito para festejar na sessão noturna da MCA. Com uma barulhenta torcida empurrando, Daria Gavrilova, 21 anos e #39, australiana nascida em Moscou, derrubou Petra Kvitova, #7 do mundo por 6/4 e 6/4.

A tenista da casa ainda bobeou quando sacou em 5/3 e desperdiçou um match point antes de ceder a quebra ao cometer seguidos erros, mas aproveitou a chance quando Kvitova voltou a falhar na sequência. A tcheca, que não disputou torneios preparatórios para o Australian Open por causa de problemas de saúde, acumulou 35 erros não forçados e não conseguiu sair do buraco.

Sem Kvitova, o quadrante de Agnieszka Radwanska fica ainda mais favorável para a polonesa. As principais cabeças nessa parte da chave são Suárez Navarro, Vici (que pode enfrentar Aga nas oitavas) e Mladenovic. Radwanska é, mais do que nunca, favorita para alcançar pelo menos as semifinais.

Se uma tenista nascida na Rússia surpreendeu, outra deu adeus. Svetlana Kuznetsova, #20 e campeã do WTA de Sydney no último fim de semana, caiu diante de Kateryna Bondarenko, 92ª na lista da WTA: 6/1 e 7/5 A ucraniana de 29 anos, que se afastou do tênis de agosto de 2012 a abril de 2014 (teve um filho no período), vem subindo aos poucos no ranking e já estará entre as 80 melhores com o triunfo por 6/1 e 7/5 desta quarta-feira.

Bondarenko, vale lembrar, foi número 29 do mundo em 2009, ano em que conseguiu seu melhor resultado em um Slam: quartas de final no US Open. Com a vaga na terceira rodada em Melbourne, a ucraniana já faz sua melhor campanha em Slams desde 2011. Aliás, desde 2009, Kateryna só alcançou a terceira fase de um torneio deste porte uma vez (Wimbledon/2011).

A quarta-feira, no entanto, foi um dia de poucas surpresas. Todas outras cabeças de chave triunfaram: Serena, Bencic, Sharapova, Radwanska, Vinci, Suárez Navarro e Mladenovic. A chave masculina não foi muito diferente. Todos os seeds avançaram: Djokovic, Simon, Tsonga, García-López, Nishikori, Federer, DImitrov, Thiem, Goffin, Cilic, Bautista Agut, Kyrgios e Berdych. Nenhuma zebrinha.

Grandes jogos confirmados

Com os resultados desta quarta-feira, já há muitas partidas interessantes "confirmadas" para a terceira rodada do Australian Open. Não que Goffin x Thiem seja um encontro a ignorar, mas dois duelos chamam atenção em especial. Um deles é entre Federer e Grigor Dimitrov, que perdeu um set para o argentino Marco Trungelliti, mas avançou por 6/3, 4/6, 6/2 e 7/5.

Federer e "baby Federer" já se enfrentaram quatro vezes, e o suíço venceu confortavelmente as três primeiras. Na última, em Brisbane, Dimitrov até deu trabalho: 6/4, 6/7(4) e 6/4. Resta saber se o búlgaro só deu trabalho porque Federer vinha se recuperando de uma gripe ou se encontrou de verdade uma maneira de incomodar o favorito. Tendo a acreditar na primeira hipótese, mas teremos uma resposta daqui a dois dias.

Outra partida a esperar é entre Tomas Berdych, que bateu Mirza Basic em três sets, e Nick Kyrgios, que eliminou Pablo Cuevas por 6/4, 7/5 e 7/6(2). "Eterno" top 10 e dono de um jogo com potencial enorme, o tcheco jogará com torcida contra, além de precisar lidar com um adversário motivado, em ascensão e dono de um jogo cheio de recursos. É uma partida perigosa para o atual #6 do mundo e semifinalista do Australian Open (o lance de Kyrgios abaixo é de sua partida de estreia no torneio, contra Pablo Carreño Busta).

Os brasileiros

Thomaz Bellucci e Marcelo Demoliner salvaram um match point no décimo game do terceiro set, no saque do paulista, e estrearam com uma bela vitória sobre os duplistas de ofício Santiago González e Julian Knowle: 4/6, 6/3 e 7/5.

Enquanto paulista e gaúcho disputavam o terceiro set, Marcelo Melo e Ivan Dodig controlavam o jogo contra Dustin Brown e Aljaz Bedene. O número 1 do mundo e seu parceiro croata, semifinalistas em Melbourne no ano passado, triunfaram por 6/3 e 6/4. Com direito a uma "girafa" na beira da quadra.

A "ótima geração russa"

Com três dias de torneio, um dos assuntos é a quantidade de jovens tenistas russas obtendo resultados relevantes. Kulichkova (19 anos, #109) derrubou Andrea Petkovic na primeira rodada em Melbourne; Kasatkina (18 anos, #69) eliminou Venus Williams em Auckland e estreou no Australian Open eliminando a cabeça de chave Anna Karolina Schmiedlova; Gasparyan (21 anos, #58), tirou Sara Errani do torneio; Putintseva (21, #76) , que passou a defender o Cazaquistão em 2012, mandou Caroline Wozniacki de volta para a Dinamarca; e Gavrilova (21 anos, #39), bem, foi a zebra desta quarta, mas você já leu sobre isso.

Os melhores lances

O lance de hoje é um lob espetacular do argentino Marco Trungelliti (#210) na derrota diante de Grigor Dimitrov.

A multa "recorde"

Depois de ser eliminada na estreia, Venus Williams não compareceu à entrevista coletiva obrigatória em Melbourne Park. A americana, então, foi multada em US$ 5 mil. É o maior valor que uma tenista já recebeu de multa por faltar a uma coletiva.

Apenas para comparação, apenas por entrar em quadra na primeira rodada, Venus embolsou 34.500 dólares australianos, algo por volta de US$ 24 mil. Na carreira, já são US$ 32,6 milhões acumulados.

Para ler e pensar

Texto do americano Steven Tignor, analisando o momento de Rafael Nadal e seu "novo" modo de encarar o circuito. Entre outras coisas, Tignor, que é jornalista e, ainda assim, um dos melhores analistas e observadores do esporte, fala sobre como é o saque – e não o forehand – que vem deixando Nadal na mão. Em inglês.

O bom samaritano

O gesto mais bacana do dia é cortesia de Jo-Wilfried Tsonga, que escoltou uma boleira que não passava bem. O francês derrotou Omar Jasika por 3 sets a 0: 7/5, 6/1 e 6/4.

O melhor do dia 4

Na programação de quinta-feira, em Melbourne, Andy Murray e Sam Groth prometem fazer a partida mais interessante da sessão diurna na RLA. À noite, todas atenções estarão voltadas Lleyton Hewitt x David Ferrer, jogo que abre a sessão e que, ao que tudo indica, será o último (de simples) na carreira de Hewitt. Aguardemos momentos emocionantes.

A lista de brasileiros em ação nesta quinta é grande. A começar por Thomaz Bellucci, que estará na Quadra 13 enfrentando o americano Steve Johnson em busca de sua melhor campanha no Australian Open. Se vencer, o #1 do Brasil alcançará a terceira rodada pela primeira vez na vida.

Na chave de duplas, Bruno Soares e André Sá finalmente estrearão. Soares e seu novo parceiro, Jamie Murray, atuarão na Quadra 15 contra Jonathan Marray e Aisam-Ul-Haq Qureshi. Sá, que joga ao lado do australiano Chris Guccione, tem tarefa muito mais difícil e enfrenta os irmãos Bob e Mike Bryan.

Mais difícil ainda é a missão de Teliana Pereira, que jogará ao lado de Mariana Duque-Mariño e enfrentará Martina Hingis e Sania Mirza, invictas há 479 jogos, aparentemente (eu posso ter exagerado de leve no número – na verdade, são "só" 30 jogos de invencibilidade para indiana e suíça). Veja a programação completa.

Sobre o autor

Alexandre Cossenza é bacharel em direito e largou os tribunais para abraçar o jornalismo. Passou por redações grandes, cobre tênis profissionalmente há oito anos e também escreve sobre futebol. Já bateu bola com Nadal e Federer e acredita que é possível apreciar ambos em medidas iguais.
Contato: ac@cossenza.org

Sobre o blog

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