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Saque e Voleio

US Open, dia 14: um espartano Djokovic triunfa contra Federer e o mundo

Alexandre Cossenza

14/09/2015 03h25

Foram 3h20min de drama e tênis de altíssimo nível. De um lado, um Roger Federer rejuvenescido pelo estilo mais agressivo de sua carreira e uma torcida barulhenta e quase hostil contra o adversário do veterano. Do outro, o número 1 do mundo, Novak Djokovic, buscando respostas, golpes e contragolpes para frear o ímpeto de um rival que não vence um Slam há mais de três anos.

O suíço tentou de tudo e parecia o melhor tenista em quadra até a metade do terceiro set. O sérvio, contudo, não perdeu a cabeça nem quando seu tênis não encaixou nem quando a torcida tentou lhe desconcentrar. No fim, ganhou a minoria. E Djokovic, que completou sua melhor temporada em Slams, pode comemorar com sua pequena torcida gritando "This is Sparta." Parece adequado, não?

O jogo

Dois pontos deram o tom do primeiro set. A baixa porcentagem de primeiro saque de Federer, que acabou quebrado duas vezes (e escapou de break points em outros dois games) e a enorme vantagem de Djokovic nas cruzadas de backhand. O primeiro tirou do suíço a condição ofensiva. É duro começar o ponto agredindo com o segundo saque. Contra a devolução do sérvio, então… E o prejuízo na troca de backhands pressionou a direita de Federer, que se viu na necessidade de fazer mais e acabou forçando e errando mais do que o habitual.

Não fosse o tombo do #1 no quarto game, logo depois de quebrar o oponente, possível que Djokovic disparasse no placar logo no começo. De um jeito ou de outro, o sérvio foi bastante superior na parcial. Federer até elevou sua porcentagem de primeiro serviço (terminou em 53%, mas ficou abaixo dos 50% durante boa parte da parcial), mas ainda era um número insuficiente para enfrentar os retornos do número 1.

A segunda parcial começou bem diferente. Djokovic esteve mal no serviço, mas salvou cinco break points em seu primeiro game e resistiu. Enquanto isso, Federer reencontrou seu saque e teve mais tranquilidade para agredir nos games de devolução. O #2 tentou um pouco de tudo. Foi à rede com mais frequência, deu mais curtinhas e tirou da carteira a devolução de bate-pronto. O sérvio foi encontrando respostas para tudo. Inclusive com seguidos lobs.

Djokovic até venceu um suado décimo game, quando precisou defender um voleio com quadra aberta (vide comemoração abaixo) e salvar dois set points. No primeiro, um saque aberto resolveu o problema. No segundo, o suíço colaborou e errou uma direita nada, nada forçada.

Veio, então, o 12º game e, com ele, erros de Djokovic do fundo da quadra. Federer obteve mais dois set points e, no segundo, agrediu e contou com um erro forçado de Djokovic. O Estádio Arthur Ashe, que desde os primeiros pontos já se manifestava muito a favor do suíço, explodiu.

Com 1 set a 1, o jogo continuou tenso. Federer, mais confiante para atacar foi traído por seus próprios erros e deu um game de graça ao #1 no começo da terceira parcial. Djokovic, porém, não teve nem tempo de respirar. Fez o mesmo em seguida e, com um punhado de erros, também perdeu o serviço.

O set seguiu tenso em quase todos os games e foi decidido naquele velho clichê: Djokovic foi melhor nos pontos importantes. O sérvio não só salvou dois break points no nono game, depois de abrir 40/0, como quebrou Federer depois de o suíço sacar em 40/15. Para completar, o #1 ainda escapou de um 15/40 quando sacou para fazer 6/4.

Aqui vale destacar a impressionante atuação da árbitra de cadeira, Eva Asderaki – primeira mulher a trabalhar em uma final masculina no US Open. A grega, a mesma que puniu Serena Williams com um "hindrance" (aquela interferência marcada quando um tenista grita no meio do ponto) na final de 2011, esteve impecável do começo ao fim neste domingo. Não só porque acertou todas vezes que passou por cima das chamadas dos juízes de linha mas porque não deixou de tomar atitude nem nos pontos mais delicados. Um deles foi justamente o 30/40 do décimo game, quando Djokovic sacava para fechar o terceiro set.

O quarto set começou meio que como o primeiro. Federer fez um game inteiro da linha de base e pagou o preço. Perdeu o saque logo no início e deixou Djokovic – agora sim – correr na frente. A essa altura, nada parecia dar certo consistentemente para o #2. Um pouco por falhas de execução, mas muito por méritos do altíssimo nível de tênis do #1. Djokovic era soberano em quadra quando quebrou de novo no sétimo game e abriu 5/2. Mas foi aí que o veterano conseguiu um último suspiro.

Federer quebrou no oitavo game, confirmou no nono e pressionou o sérvio no décimo. Com a torcida toda a seu lado, inclusive comemorando quando Djokovic errava o primeiro serviço, o suíço teve três break points para empatar a parcial. Pois lembram do clichê dos pontos importantes? Pois é. Djokovic foi impecável em todos eles. E, no primeiro match point, decidiu: 6/4, 6/7, 6/4 e 6/4.

O espartano

Na comemoração junto com seu time, Djokovic virou-se para o ator Gerard Butler, o Rei Leonidas do filme 300, e gritou a famosa frase "This is Sparta!"

E ainda rolou essa cena já nos bastidores do Estádio Arthur Ashe:

O significado

Nem toda final de Grand Slam significa absolutamente alguma coisa. Aliás, quase nenhuma delas proporciona verdades definitivas. Mas se Federer afirma ser hoje um tenista melhor do que em 2005, também vai ficando cada vez mais nítido que Djokovic é, no pacote completo, um tenista superior, como ficou claro neste domingo, quando o sérvio precisou encontrar respostas para uma série de desafios lançados pelo ex-líder do ranking. Em Nova York, assim como fez em Wimbledon e vem fazendo nas mais importantes ocasiões, Djokovic mostrou-se superior.

E não foi só isso: com o título, Djokovic encerra a temporada de Slams com três troféus (Australian Open, Wimbledon e US Open) e 27 vitórias de 28 possíveis – perdeu apenas a final de Roland Garros para Stan Wawrinka. Pode não ser a comparação mais justa porque Serena Williams esteve a duas vitórias de fechar o Grand Slam e ganhar os quatro Majors no mesmo ano, mas o fato é que o sérvio venceu um jogo a mais que a americana nos Slams: 27 a 26.

Para Federer, 34 anos e vice-campeão em Wimbledon e Nova York, parece que está na hora de o povo aposentar a velha frase do "essa foi a última grande chance de ganhar um Slam." Com um saque que talvez seja o melhor de sua carreira e um jogo ao mesmo tempo agressivo (taticamente) e suave (ao corpo), não há por que acreditar que faltarão oportunidades. Neste domingo mesmo, elas estiveram por toda parte, em muitos momentos. É questão de aproveitá-las. 

O discurso politicamente correto

A cerimônia de premiação não foi das mais emocionantes. Federer parecia bastante abatido, enquanto o campeão não se mostrava à vontade como de forma habitual. Foram discursos quase "protocolares", com a exceção de que Djokovic não agradeceu o apoio do público. Parece justo depois de tanto tempo com uma torcida amplamente contra e que por vezes ultrapassou o limite, comemorando erros de primeiro serviço do número 1 do mundo (até Federer admitiu na coletiva que não foi um apoio "normal").

Na entrevista coletiva, Djokovic adorou o discurso politicamente correto, dizendo aceitar o fato de que todos podem escolher torcer por um tenista e que Federer merece todo apoio que tem depois de tantos anos de sucesso e pela postura que adota dentro e fora de quadra. O sérvio diz ainda que espera no futuro estar na mesma posição. E assunto encerrado (pelo menos por enquanto).

A explicação

Na entrevista coletiva, Federer lamentou as muitas chances perdidas (em toda a partida, o suíço aproveitou apenas quatro de 23 chances de quebra) e afirmou que não jogava tão agressivamente há muito tempo. Para ele, talvez esse tenha sido o motivo de tantas falhas nos momentos importantes. Leia a coletiva completa.

O ranking

Com o título em Nova York, Djokovic agora tem mais de seis mil pontos (três títulos de Grand Slam) de vantagem sobre Federer. O #1 tem 16.145 pontos, contra 9.545 do suíço. O top 5 ainda tem Andy Murray (8.660), Stan Wawrinka (6.070) e Tomas Berdych (5.050). Rafael Nadal é o sétimo, com 3.770.

A imagem da manhã

Antes de as finais começarem no Ashe, Flavia Pennetta foi ao Top of the Rock (no Rockefeller Center, a cerca de 260m de altura) fazer as tradicionais fotos da campeã com o troféu em um local pitoresco da cidade. A italiana pediu até que conseguiu que o namorado, Fabio Fognini, participasse de um dos cliques.

As campeãs

Antes da final de simples, Martina Hingis e Sania Mirza conquistaram o título de duplas com uma vitória quase rotineira por 6/3 e 6/3 sobre Casey Delacqua e Yaroslava Shvedova. Suíça e indiana agora têm cinco títulos de duplas desde Indian Wells, quando começaram a parceria. Elas também foram campeãs de Wimbledon. Hingis já tem no currículo 20 Slams – cinco em simples, 11 em duplas e quatro em duplas mistas (e um desses em duplas mistas foi neste US Open, ao lado do também indiano Leander Paes.

Sobre o autor

Alexandre Cossenza é bacharel em direito e largou os tribunais para abraçar o jornalismo. Passou por redações grandes, cobre tênis profissionalmente há oito anos e também escreve sobre futebol. Já bateu bola com Nadal e Federer e acredita que é possível apreciar ambos em medidas iguais.
Contato: ac@cossenza.org

Sobre o blog

Se é sobre tênis, aparece aqui. Entrevistas, análises, curiosidades, crônicas e críticas. Às vezes fiscal, às vezes corneta, dependendo do dia, do assunto e de quem lê. Sempre crítico e autêntico, doa a quem doer.