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Saque e Voleio

Djokovic e o inteligente gerenciamento de riscos

Alexandre Cossenza

30/01/2015 17h15

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Entre os estranhos números da esquisita semifinal entre Novak Djokovic e Stan Wawrinka, dois me chamaram a atenção em especial. Ambos do sérvio. No terceiro set, vencido por 6/4, o número 1 do mundo disparou modestos quatro winners e cometeu dez erros não forçados. Na parcial seguinte, um 6/4 a favor de Wawrinka, Djokovic não fez nenhuma bola vencedora e cometeu 14 falhas.

Antes de ir adiante, é bom deixar claro que não dá para dizer que o sérvio teria vencido o quarto set se tivesse igualado a linha estatística da parcial anterior. Sim, seriam oito pontos de diferença (quatro a mais para um, quatro a menos para outro), mas não é uma ciência exata. O "quando" do número de pontos importa tanto ou mais que o "quantos".

Dito isto, é preciso considerar também que o líder do ranking ganhou menos pontos no ataque do que na defesa nesta sexta-feira. Consequência de um dia ruim? Sim, é inegável que Djokovic esteve bem abaixo de seu nível costumeiro – assim como Wawrinka. Só que também é resultado de um plano de jogo inteligente e calculado, que costuma dar certo contra o suíço (os dois suíços, aliás).

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A estratégia é interessante. É bem sabido Djokovic sabe se defender como poucos e, ao mesmo tempo, sustentar longas trocas com bolas consistentemente fundas. Contra Wawrinka, um tenista agressivo e disposto a correr riscos, Nole aposta que vai triunfar assim: sem dar pontos de graça, desafiando Stan a executar bolas improváveis.  Um bocado delas.

Mas não é só o plano. Não é só devolver bola. É a execução, o "como", que faz a diferença. Contra Wawrinka, Djokovic evita os ângulos (o oposto do que faz com Nadal). O suíço agride com muito mais eficiência dos cantos da quadra. Quando precisa rebater do meio da quadra, Wawrinka se vê diante de duas opções. 1) Arriscar (mais do que o normal) na busca de ângulos para fazer Djokovic correr atrás da bola; ou 2) Seguir trocando bolas no meio, esperando uma bola mais curta para, enfim, atacar com tudo.

As duas opções são ruins para Stan. Na primeira, de dificílima execução, os riscos são altos. Com a velocidade de Nole no fundo de quadra, qualquer ataque precisa ser muito, muito preciso – e com muita potência. No segundo cenário, mais conservador, Wawrinka leva desvantagem no quesito consistência. Uma bola menos agressiva, uma bolinha que seja, e o suíço vai se ver correndo atrás do ponto. E Stan não se defende tão bem quanto o número 1.

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Djokovic, claro, também corre o risco de encontrar Wawrinka num dia inspirado. Só que aconteceu isso em 2013 e, nem assim, o suíço venceu. Mesmo no ano passado, em outra noite brilhante de Stanimal, Nole só perdeu quando cometeu erros bobos no fim do quinto set. Mais do que isso, o histórico dá a resposta: o sérvio venceu 17 de 20 encontros e, mais importante, acumula um placar de 6 a 1 desde (incluindo) aquele jogão de 2013 em Melbourne. Não é difícil entender porque Djokovic insiste nesse tipo de tática.

E tem mais: Djokovic sabe jogar no ataque. Se Wawrinka realmente estiver endiabrado, o sérvio tem jogo para sair lá de trás e agredir mais – o suficiente para, ao menos, forçar o adversário a recuar (ou agredir ainda mais e, consequentemente, correr mais riscos).

Muita gente prefere ver um Nole mais agressivo, distribuindo pancadas e fazendo marionetes dos adversários – como, repito, ele faz com Nadal. Mas cada bolo pede uma receita diferente. Dois jogos em Paris servem como exemplo. Em 2011, na melhor temporada de sua vida, Djokovic resolveu encarar Roger Federer na pancadaria em Roland Garros. Acabou lindamente derrotado. Foi seu primeiro revés em todo ano. Em 2012, suíço e sérvio se encontraram de novo no saibro parisiense, e Nole apostou na cautela. Venceu por três sets a zero.

Tática nenhuma ganha jogo por si só. O que diferencia Djokovic da maioria e lhe mantém na liderança do ranking é a capacidade de executar à perfeição seus planos de jogo. E, obviamente, a quantidade de armas de seu tênis, que permite uma dúzia de planejamentos e replanejamentos antes e durante as partidas. Logo, hoje em dia, faz-se necessária uma combinação improvável de fatores para que Djokovic saia de quadra derrotado.

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Coisas que eu acho que acho:

– Ainda sobre o jogo, vale lembrar outra estatística sobre o número de winners de Djokovic. Ao todo, eles foram 27 em 48 games. Dá um pouco mais de meio winner por game (0,56). Wawrinka, por sua vez, executou 42 bolas vencedoras (0,875 por game). Nem só de winners vive o tênis…

– Baseado só nas semifinais, alguém pode ficar tentado a apontar Andy Murray como favorito. Não vejo assim. O escocês joga seu melhor tênis em muito tempo (desde Wimbledon 2013, talvez?) e Djokovic vem de uma atuação nada inspirada, mas cada dia é um dia. A maneira de Nole atuar contra Môri é bem diferente.

– Sobre a semi entre Murray e Berdych, muitíssimo bem jogada por ambos, destaque para a reação de Murray, que perdeu o set inicial e respondeu com um pneu logo em seguida.

Sobre o autor

Alexandre Cossenza é bacharel em direito e largou os tribunais para abraçar o jornalismo. Passou por redações grandes, cobre tênis profissionalmente há oito anos e também escreve sobre futebol. Já bateu bola com Nadal e Federer e acredita que é possível apreciar ambos em medidas iguais.
Contato: ac@cossenza.org

Sobre o blog

Se é sobre tênis, aparece aqui. Entrevistas, análises, curiosidades, crônicas e críticas. Às vezes fiscal, às vezes corneta, dependendo do dia, do assunto e de quem lê. Sempre crítico e autêntico, doa a quem doer.