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Um escândalo de plágios em Wimbledon

Alexandre Cossenza

24/07/2014 11h17

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O maior assunto da semana no tênis não foi (por enquanto) um jogão em Atlanta, Umag ou Gstaad, mas um escândalo fora das quadras. O tradicionalíssimo All England Cub, sede to Torneio de Wimbledon, descobriu que os livros anuais dos torneios (conhecidos como Official Wimbledon Annual) estavam repletos de trechos copiados integralmente de reportagens, colunas, blogs e sabe-se lá mais o quê. Sim, o grande resumo anual de Wimbledon vinha, há alguns anos, roubando material de jornalistas e blogueiros profissionais.

O autor dessa patifaria é o (até então) respeitado inglês Neil Harman, jornalista do Times, ex-presidente da International Tennis Writers Association e co-autor de um livro publicado com Andy Murray. A história de plágio foi relatada extensamente pelo jornalista Ben Rothenberg no Slate (leia tudo aqui).

Em três publicações analisadas por Rothenberg, que revisitou os livros oficiais de Wimbledon para as edições 2011, 2012 e 2013, o jornalista americano encontrou 52 trechos plagiados. Cinquenta e dois! E Harman era responsável pelo livro do Grand Slam britânico desde 2004. Imaginem só…

As desculpas de Harman beiram um livro de ficção – ou um depoimento de político em CPI, como queiram. "Pensei ter tentado, em cada vez que usei o trabalho de outra pessoa, dar o crédito que o trabalho merece", "claramente houve momentos em que, na pressa, não sendo cuidadoso o suficiente, eu borrei as linhas entre o que é certo e errado" e "lapsos chocantes" foram algumas das palavras do jornalista inglês de 57 anos sobre o que aconteceu.

Difícil imaginar 52 trechos (alguns com três parágrafos inteiros) copiados como resultado de "lapsos", assim como é difícil aceitar que Wimbledon, mesmo depois de saber do caso de plágio, manteve à venda o livro oficial sobre o torneio de 2013 e nada fez para retirar a credencial de Harman no torneio deste ano. Mais: o jornalista ainda foi convidado para o jantar dos campeões de Wimbledon (e tudo isso está relatado no link que já compartilhei no alto deste post).

Coisas que eu acho que acho:

– Há quem diga que a internet fez muito mal à essência e, principalmente, às finanças do jornalismo como profissão. É bem verdade que muitos veículos impressos vêm fechando as portas e que outros encontram problemas para monetizarem suas operações online, mas a essência do que é jornalismo está mais viva do que nunca. Com tanta informação disponível na internet, não dá para um jornalista aumentar e inventar notícias impunemente.

– Sempre há, por toda parte, um fã, um tuíte ou uma foto para derrubar o jornalista que tenta criar um factóide. Hoje em dia, nenhum profissional está sozinho cobrindo um evento do outro lado do mundo. Não dá mais para, sem provas, inventar que o técnico X está com os dias contados ou que o atleta Y está se tratando com a máquina Z. Logo, logo, acontece algo ou aparece alguém para mostrar o que realmente está acontecendo. O jornalismo de hoje precisa ser mais jornalismo do que nunca. E quem não se enquadra corre o risco de passar por um cenário semelhante ao que estamos vendo em Wimbledon.

Sobre o autor

Alexandre Cossenza é bacharel em direito e largou os tribunais para abraçar o jornalismo. Passou por redações grandes, cobre tênis profissionalmente há oito anos e também escreve sobre futebol. Já bateu bola com Nadal e Federer e acredita que é possível apreciar ambos em medidas iguais.
Contato: ac@cossenza.org

Sobre o blog

Se é sobre tênis, aparece aqui. Entrevistas, análises, curiosidades, crônicas e críticas. Às vezes fiscal, às vezes corneta, dependendo do dia, do assunto e de quem lê. Sempre crítico e autêntico, doa a quem doer.