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Saque e Voleio

Brasileiros em contexto

Alexandre Cossenza

31/05/2014 06h00

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Primeira semana de Grand Slam tem dessas coisas engraçadas. E a culpa, de certa forma, é da imprensa. Sim, somos nós, jornalistas, que achamos divertido escrever "Brasil segue invicto em Wimbledon" ou "continuamos 100% na Austrália", com direito até ao uso da primeira pessoa do plural, aquela manobra barata para fazer com que o leitor se sinta mais parte das vitórias de seus compatriotas. Durante esses primeiros dias, criamos uma ilusão coletiva de que está tudo ótimo, de que nosso esporte (porque não acontece só no tênis) anda muito bem.

Só que essa ilusão dura pouco. E normalmente acaba com derrotas que vêm uma colada na outra. Foi assim com Teliana Pereira e Thomaz Bellucci em Roland Garros (e Bruno Soares também já deu adeus). Dois atletas que venceram sem jogar bem na primeira rodada e que ofereceram pouca resistência na fase seguinte, quando enfrentaram cabeças de chave. Não que haja tanto em comum entre os melhores simplistas brasileiros, mas foi assim que aconteceu.

A passagem de Teliana por Paris começou com vitória sobre a tailandesa Luksika Kumkhum, que tem sérios problemas de mobilidade. A jovem de 20 anos sabe bem disso, por isso joga atacando como se precisasse fugir de um precipício e trocar cinco bolas significariam a morte fulminante após 200 metros de queda livre. Enquanto acertou seus golpes, Kumkhum abriu 5/0. Depois, sem uma corda de Bungy para trazê-la de volta, venceu só três games.

Teliana_RG_2r_efe2_blog

Não foi exatamente uma bela atuação de Teliana. Nem houve nem um grande ajuste tático da brasileira. A adversária nem permitiu isso. Paciência. A vitória da pernambucana por 4/6, 6/1 e 6/1 foi a primeira de uma brasileira em Paris desde 1989. Por isso, foi muito comemorada. E deveria mesmo ser festejada por Teliana. Por todos obstáculos que ficaram para trás. Pelo esforço que a menina fez para chegar a Paris e se dar a chance de vencer, mesmo sem brilhar. Não significa uma evolução do tênis brasileiro como trabalho de uma confederação, mas coloca em evidência, mais uma vez, que trabalho é recompensado, de uma forma ou de outra. Desta vez, na forma também de € 42 mil, maior prêmio na carreira de Teliana.

Veio, então, um confronto contra a romena Sorana Cirstea, 26ª do mundo. Uma tenista que, se não tem muita variação, conta com um saque respeitável e golpes sólidos do fundo de quadra. Em um dia ruim, foi derrotada pela própria Teliana em Charleston, em março. Era, entretanto, seu primeiro evento no saibro este ano. Mesmo sem sucesso no piso, a jovem teve tempo de se adaptar. O confronto em Roland Garros foi bem diferente. Cirstea impôs sua potência e foi melhor do começo ao fim do jogo. Venceu por 6/2 e 7/5.

O jogo deixou claras as limitações da brasileira, que chegou ao top 100 com esforço e somando pontos principalmente em torneios pequenos. Para dar um passo mais largo, agora, precisa seguir evoluindo. É preciso encontrar alguns quilômetros por hora a mais em seu saque e seu forehand. Talvez seja difícil chegar ao top 50 contando "apenas" com sua regularidade e dias ruins de adversárias. Com apenas mais duas semanas de WTAs no saibro, o calendário de Teliana mostrará suas intenções. Ela continuará nos torneios de US$ 25 mil na terra batida ou ousará eventos maiores, ainda que no piso sintético?

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Sobre Bellucci, há pouco a acrescentar ao que escrevi após sua vitória na estreia. Desde o início da carreira, o paulista não consegue imprimir regularidade em seu tênis – até as melhores de suas temporadas foram recheada de derrotas decepcionantes. Não que a inconstância tenha sido fator decisivo na derrota diante de Fabio Fognini, na segunda rodada (63, 6/4 e 7/6). O italiano foi bastante superior em boa parte do encontro. Ainda assim, Bellucci teve uma chance aqui e outra ali. Uma delas poderia ter dado novo rumo ao jogo. Mais uma vez, porém, sua inconstância pesou. Às vezes com um erro de devolução de segundo saque, às vezes com um golpe afobado. A escolha ruim de jogadas em momentos importantes anda se faz presente.

Sua escolha de calendário segue ousada. Tentará o quali de Wimbledon e, depois, os qualis de Stuttgart e Hamburgo. Gstaad e Kitzbuhel também estão nos planos – embora seja difícil imaginar Bellucci disputando os quatro torneios de terra batida. E vale lembrar: também (não só por isso!) pelas incertezas trazidas por seu ranking, o número 1 do Brasil vem mudando planos constantemente. A última alteração resultou em um período de preparação em Madri, onde as condições de jogo não são nada parecidas com as de Roland Garros. Alguns anos atrás, nem faz tanto tempo assim, os jogadores até pediram que o Masters 1.000 espanhol tivesse sua data invertida com a do Masters de Roma. Assim, estariam mais bem adaptados para o Slam do saibro. Não por acaso, a solicitação foi atendida pela ATP.

Sem ir na toalha (para ler em até 20 segundos):

– Bruno Soares e Alexander Peya foram eliminados por Andre Begemann e Robin Haase: 5/7, 6/4 e 6/4. O resultado põe em risco o ranking de brasileiro e austríaco. Com mais uma vitória, Marcelo Melo, que joga ao lado de Jonathan Erlich, passará a ser o duplista número 1 do Brasil. Lukasz Kubot e Robert Lindstedt serão os próximos adversários da dupla.

– Depois de vencer a estreia nas duplas mistas, Bruno Soares, em entrevista ao Bandsports (sempre em cima do lance!), mostrou-se bastante chateado com a eliminação nas duplas. Ainda assim, triunfou ao lado de Yaroslava Shvedova sobre Casey Dallacqua e Jamie Murray: 6/3, 5/7 e 10/6. Em busca de um lugar nas quartas, brasileiro e cazaque enfrentarão a dupla francesa composta pelo casal Alizé Lim e Jeremy Chardy.

Coisas que eu acho que acho:

– É legal ver Marcelo Melo vencendo ao lado de um tenista que não seja Ivan Dodig, seu parceiro habitual. Já passou da hora de Melo, que já cansou de mostrar que pode vencer com vários parceiros, ser mais valorizado.

– É igualmente bacana ver André Sá de novo nas oitavas de final de um Grand Slam. É apenas a terceira vez desde 2009 (quando ainda atuava ao lado de Marcelo Melo) que o veterano alcança a terceira rodada. Desta vez ao lado do jovem Mate Pavic, de 20 anos, a disputa por uma vaga nas quartas será contra os espanhóis Marc López e Marcel Granollers.

– Este é meu último fim de semana de folga até o dia 14 de julho (sim, julho, vocês leram direito) e pretendo passá-lo com a família. Não sei o quanto conseguirei ver de Roland Garros até segunda-feira. Prometo voltar a escrever assim que puder.

Sobre o autor

Alexandre Cossenza é bacharel em direito e largou os tribunais para abraçar o jornalismo. Passou por redações grandes, cobre tênis profissionalmente há oito anos e também escreve sobre futebol. Já bateu bola com Nadal e Federer e acredita que é possível apreciar ambos em medidas iguais.
Contato: ac@cossenza.org

Sobre o blog

Se é sobre tênis, aparece aqui. Entrevistas, análises, curiosidades, crônicas e críticas. Às vezes fiscal, às vezes corneta, dependendo do dia, do assunto e de quem lê. Sempre crítico e autêntico, doa a quem doer.