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Saque e Voleio

Velhas tendências põem Nadal na final

Alexandre Cossenza

24/01/2014 10h13

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O Federer x Nadal XXXIII (um clássico tão clássico que merece ser citado sempre com números romanos, como o Super Bowl) não foi nada atípico. O roteiro que o mundo conhece como aquele filme velho que todos veem quando a TV a cabo reprise foi executado como de costume. Nadal, com uma bandagem menor na mão esquerda e pouco – ou nada – incomodado com a cicatrização de bolha, foi o senhor da partida desde os primeiros games.

Por 3 sets a 0, 7/6(4), 6/3 e 6/3, derrotou Roger Federer mais uma vez e conquistou uma vaga na final do Australian Open para enfrentar Stanislas Wawrinka. Mas deixemos a decisão para depois. O que importa, hoje, é lembrar como número 1 do mundo sobressaiu-se pela 23ª vez contra o grande rival. E foi mais ou menos assim, como descrevo nas próximas linhas, que vi a partida.

O primeiro set apagou rapidinho as dúvidas sobre o serviço de Rafael Nadal. O espanhol foi seguro, sem arriscar demais nem perder muita potência. Com 174 km/h de média no primeiro saque (número até o quarto game), o número 1 esteve pouco atrás do suíço, que alcançou 182 km/h. Com 74% de aproveitamento, Nadal teve a segurança que precisava para fazer seu costumeiro jogo de fundo de quadra.

Logo, logo, as velhas tendências ficaram claras. Federer tentou ser agressivo, mas deu uma freada no sétimo game, quando levou duas passadas e precisou salvar dois break points. O suíço também precisou sacar em 30/40 no nono game e também escapou. Nadal seguia, como sempre, agredindo o backhand e limitando o poder ofensivo do suíço.

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Só o tie-break resolveu, com Nadal jogando um game belíssimo. Federer deu um mini-break ao errar um voleio fácil e, depois perdeu outro ponto de saque e viu Nadal abrir 4/1. Não deu tempo de reagir. O espanhol sacou em 5/4 e não bobeou. Primeira parcial para ele: 7/6(4).

Não eram só as bolas no backhand que incomodavam. Quando variava e atacava o forehand, Nadal fazia o suíço se deslocar e, na maioria desses pontos, Federer acabava ou chegando atrasado ou forçando algo que não devia. O suíço até se sustentou bravamente com o saque, salvando break point atrás de break point. No oitavo, não deu. A quebra veio no sexto game do segundo set, justamente com um forehand agressivo de Nadal, atacando, de dentro para fora, a direita do suíço.

A única chance de Federer na segunda parcial veio no último game, com Nadal sacando em 0/30. O número 1 deu uma resposta rápida, com dois pontos espetaculares seguidos, e fechou logo a porta: 6/3, 2 sets a 0. Parecia improvável uma reação do veterano.

E o terceiro set só não foi mais fácil porque o espanhol jogou um quarto game muito ruim e foi quebrado. Só que Federer já não parecia muito disciplinado taticamente ou disposto a trocar bolas. Eis outra manifestação de uma velha tendência. Quando atrás no placar contra Nadal, o suíço tende a se afobar. Assim, subiu à rede com mais frequência e levou todo tido de passadas. Paralelas de forehand, cruzadas de backhand, winners de devolução, não teve jeito. Em 37 minutos, a terceira parcial estava encerrada. Game, set, match: 7/6(4), 6/3, 6/3.

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Sem ir na toalha (para ler em até 20 segundos):

– Com o resultado desta sexta, Stanislas Wawrinka passará a ser o número 1 da Suíça. Convenhamos, não faz muita diferença, a não ser que Federer decida defender o país na Copa Davis. Se for o caso, o ex-número 1 passará a jogar, se necessário as quintas partida dos confrontos. A grande curiosidade é que Murray e Federer estarão fora do top 4 a partir de segunda-feira e poderão cruzar com Nadal e Djokovic já nas quartas de final dos próximos torneios.

– A distância de Nadal para Djokovic segue aumentando. Ao alcançar a decisão, o espanhol garante, no mínimo, 14.330 pontos, contra 10.440 do sérvio. Ou seja, a vantagem já é de 3.890 pontos. Se conquistar o título, Rafael Nadal aparecerá no próximo ranking com 4.690 de frente. Uma distância assustadora, ainda mais considerando que o vice-líder tem a defender em 2014 os vices em Wimbledon e no US Open, além dos títulos em Dubai, Monte Carlo, Pequim, Xangai, Paris e Londres (ATP Finals). Ah, sim: ainda tem a semi de Roland Garros.

– Os números oficiais indicam que Federer executou o primeiro serviço, em média, a 181 km/h. Nadal, a 175 km/h. No segundo serviço, 152 km/h para o suíço e 143 km/h para o espanhol. A explicação é simples: ambos usaram bastante o saque angulado em vez de pancadas no meio ou no corpo do adversário. Continuando com as estatísticas, o número 1 disparou 28 bolas vencedoras e cometeu 25 erros não forçados, contra 34 e 50(!) do suíço, respectivamente.

– Vale pela curiosidade: os 33 duelos de Nadal e Federer ocupam a sexta posição na lista dos encontros mais repetidos da Era Aberta. O popular "Fedal" fica atrás de Nadal x Djokovic (39 jogos), Lendl x McEnroe (36), Connors x Lendl (35), Connors x McEnroe (34) e Agassi x Sampras (34).

Coisas que eu acho que acho:

– Federer costuma usar muito mais o slice de backhand para devolver o saque de Nadal, o que nunca funcionou tanto. Hoje, não foi o caso. O suíço tentou bloquear mais do que usar slices ou atacar. Não deu certo. Até o início do terceiro set, o espanhol não tinha encarado um break point sequer.

– Impressionante a diferença no jogo de Rafael Nadal com uma bandagem menor na mão. Sacou com mais confiança, foi seguro e agressivo do fundo de quadra, executou passadas improváveis (para nós, mortais, claro) e até fez um inesperado drop shot segurando a raquete com as duas mãos. Do começo ao fim do jogo, com um gamezinho de exceção, foi uma atuação irretocável.

– É mais uma vitória de Rafael Nadal sobre Roger Federer em um Grand Slam disputado em quadras duras. Com a vantagem de 23 triunfos em 33 jogos, acho que os fanáticos já podem deixar de lado a velha teoria do "foram mais partidas no saibro" para justificar a diferença. A vantagem já é tão grande atualmente que não cabe mais forçar a barra e tentar esticar o limite da realidade.

Sobre o autor

Alexandre Cossenza é bacharel em direito e largou os tribunais para abraçar o jornalismo. Passou por redações grandes, cobre tênis profissionalmente há oito anos e também escreve sobre futebol. Já bateu bola com Nadal e Federer e acredita que é possível apreciar ambos em medidas iguais.
Contato: ac@cossenza.org

Sobre o blog

Se é sobre tênis, aparece aqui. Entrevistas, análises, curiosidades, crônicas e críticas. Às vezes fiscal, às vezes corneta, dependendo do dia, do assunto e de quem lê. Sempre crítico e autêntico, doa a quem doer.