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Saque e Voleio

Competição, lazer e Caribe: como Aruba virou destino de tantos brasileiros que jogam beach tennis

Alexandre Cossenza

10/12/2019 04h00

É noite de sexta-feira em novembro no Caribe, e seria um fim de dia normal a não ser por um evento: o Aruba Beach Tennis Open Championships. O Amstel Bright Stadium, com capacidade para cerca de duas mil pessoas, transborda de gente. O DJ mantém o volume lá em cima, o jogo de luzes faz o seu, e a torcida canta e pula entre os pontos. Aruba ferve com o beach tennis.

Dois telões mostram a partida, replays, placar e adjetivos como epic e dushi ohm ("ótimo" em papiamento, idioma local). Um narrador descreve os lances e comenta a partida ao vivo. Dentro de quadra, duplas batalham por um pedaço do prêmio em dinheiro, que chega a US$ 50 mil. O DJ não alivia. Em um intervalo, Black Eyed Peas. No próximo, Gusttavo Lima. Mais tarde, uma versão de Baby Shark termina com dezenas espectadores espontaneamente fazendo a coreografia que viralizou na internet. O beach tennis segue noite adentro, e Aruba ainda borbulha.

A partida termina e, sem grande demora, o narrador convida quatro pessoas da arquibancada a descerem para a arena. Antes do último jogo da noite, o entretenimento é ver qual dos amadores consegue devolver um saque de um profissional. O quarteto inclui uma brasileira, o que leva o locutor a perguntar pela torcida verde-e-amarela no público. E é aí que o óbvio fica nítido até para quem está vendo beach tennis em Aruba pela primeira vez: durante o torneio, a quantidade de brasileiros na ilha é obscena.

Em 2018, dos cerca de 1.100 atletas profissionais e amadores inscritos no evento, 401 eram brasileiros – sem contar amigos e familiares que aproveitam a ocasião para conhecer uma ilha do Caribe. É fácil entender a relação do país com a modalidade, que não para de crescer. Trata-se de um esporte barato, acessível, simples de praticar e com torneios que, em sua maioria, são jogados apenas no fim de semana – ou seja, ninguém precisa perder um dia de trabalho para manter ativa a carreira amadora.

Além disso, o Brasil sempre teve sucesso com seus profissionais. A ex-tenista Joana Cortez foi uma das pioneiras na areia. Vini Font foi número 1 do mundo, desbancando italianos, os inventores e senhores do beach tennis. Rafaella Miller, outra ex-tenista, também já liderou o ranking e hoje é a número 3 do planeta, e André Baran, que chegou até a jogar duplas na quadra com Gustavo Kuerten, é o sexto homem mais bem ranqueado do planeta.

Por que Aruba?

Mas como Aruba tornou-se esse destino tão comum para os atletas brasileiros do beach tennis? O evento é um motivo por si só. Trata-se, afinal, de um dos maiores torneios do calendário do beach tennis. Um atrativo extra é a chance de competir no mesmo local que profissionais. O Aruba Open tem chaves para adultos de todos níveis e idades, do infantojuvenil ao sênior. Para os profissionais, é uma data obrigatória. Além disso, Aruba é um dos melhores – se não o melhor – destinos caribenhos para brasileiros. A começar pela proximidade geográfica, já que fica a cerca de 25km da costa venezuelana e há várias opções de voo (a mais rápida é via Bogotá, na Colômbia). Além disso, a ilha tem clima seco, sem temporadas chuvosas, e fica fora da rota dos furacões. Por isso, é possível programar uma viagem em qualquer época do ano sem se preocupar demais com o clima.

"Para a gente, é mais perto, mais barato (do que ir para a Europa). Em termos de atletas de vários países e premiação, acho que é [o melhor evento do mundo]. Aqui você tem o apoio do governo, é um evento de turismo também. Não é só um evento de beach tennis. Na Cervia (Itália), onde era o Mundial, tinha 3-4-5 mil pessoas numa arena, mais do que isso aqui. Impressionante. No Brasil, o torneio do Rio teve bastante público. Mas como este aqui, não tem. O Aruba Open é realmente diferenciado", explicou Joana Cortez, em uma descontraída entrevista ao lado do bar da quadra central, com o torneio rolando e a caixas de som explodindo.

As histórias são muitas. Há quem faça a viagem até Aruba apenas pela competição. Há quem vá até a ilha para jogar, mas também para curtir o Caribe e as muitas atrações da ilha – praias paradisíacas, opções de mergulho, kitesurfe e windsurf e uma região desértica, ideal para quem curte passeios de 4×4 e visitar sites históricos. Os restaurantes são muitos e muito bons, e a estrutura de lazer é excelente em toda a ilha. E mais: não falar inglês não é impedimento para curtir a viagem. Todos por lá falam espanhol, um dos quatro idiomas ensinados nas escolas – junto com holandês, inglês e papiamento.

Em alguns casos, porém, os interesses se misturam. É o que acontece com a fotógrafa Ana Lidia Borba, que treina forte há cerca de um ano. Moradora de Florianópolis e namorada da atleta profissional Nathalia Costa, atual #51 do mundo, Ana Lidia compete na chave amadora, acompanha as partidas de Nathalia e trabalha quando possível.

"Por enquanto, o beach tennis ainda é mais diversão do que trabalho para mim. Tem alguns eventos em que eu trabalho. Estou desenvolvendo um trabalho que espero que dê frutos com a Confederação, mas por enquanto faço coisas muito pontuais, como produção de conteúdo para alguns atletas profissionais do Brasil. Eu jogo o meu e cubro o pro. Gosto muito de ser um esporte muito democrático, sabe? A gente vai para a praia, às vezes eu jogo dupla com uma pessoa de mais de 60 anos ou com menos de 12 que joga muito mais do que eu. Todo mundo joga! Coloquei meu pai e minha mãe para jogar, eles que nunca fizeram esporte nenhum. Eu não consigo ficar parada, então para curtir Floripa, para mim é uma das melhores formas. Vou, jogo um pouco, bato um papo, dou um mergulho e jogo mais. Isso é bem legal."

Pista de dança após a final

Domingo, 20h, a final masculina se aproxima. A arena em Bushiri Beach (uma praia revitalizada pelas autoridades locais especialmente para receber o torneio) volta a ferver. Antes da decisão entre os profissionais, uma surpresa: a final amadora do nível avançado é transferida para o Amstel Bright Stadium. Proporcionalmente falando, é como se quatro amadores fossem chamados de última hora para jogar na Quadra Central de Wimbledon. É mais um atrativo do Aruba Open.

Pouco depois, finalmente chega a hora da decisão. É o último jogo da semana, o fim do evento. A entrada dos atletas acontece ao som de Sirius, da banda Alan Parsons Project. É a mesma música que embalava a apresentação do Chicago Bulls de Michael Jordan. Em Aruba, o astro era Alessandro Calbucci, italiano radicado no Brasil, considerado o Roger Federer do beach tennis. O veterano não decepciona. Ao lado do parceiro e compatriota Michele Cappelletti, Calbucci conquista o troféu. É venerado pelo locutor e pelo público, e só deixa a quadra após receber o cheque de US$ 10 mil da dupla campeã.

Fim de evento? Nada disso. O bar, pertinho da quadra central, segue lotado. O restaurante, montado na areia e com mesas estrategicamente instaladas sob uma lona, continua servindo seu extenso cardápio, que oferece desde pipoca e cachorro quente até bowls de massa à carbonara e matriciana, arroz frito com frango, paella e bolo de Nutella. Perto das 22h, a noite ainda seria longa. O DJ convidado assumiu o controle, e a quadra virou pista de dança para o público. Aruba ainda tinha o que oferecer.

Sobre o autor

Alexandre Cossenza é bacharel em direito e largou os tribunais para abraçar o jornalismo. Passou por redações grandes, cobre tênis profissionalmente há oito anos e também escreve sobre futebol. Já bateu bola com Nadal e Federer e acredita que é possível apreciar ambos em medidas iguais.
Contato: ac@cossenza.org

Sobre o blog

Se é sobre tênis, aparece aqui. Entrevistas, análises, curiosidades, crônicas e críticas. Às vezes fiscal, às vezes corneta, dependendo do dia, do assunto e de quem lê. Sempre crítico e autêntico, doa a quem doer.