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15 Anos do Boicote - Nelson Nastás: exílio e uma década para limpar o nome

Alexandre Cossenza

23/04/2019 07h00

Em 2004, Gustavo Kuerten e os melhores tenistas do país executaram um boicote e não disputaram a Copa Davis. Era uma medida contra a gestão de Nelson Nastás, então presidente da Confederação Brasileira de Tênis (CBT). O Brasil acabou rebaixado para a terceira divisão da competição e entrou num turbilhão político que só acabou no ano seguinte, quando o catarinense Jorge Lacerda assumiu a presidência da entidade.

Essa parte da história todo mundo conhece. Mas o que aconteceu com o dirigente que saiu? Nelson Nastás saiu da cena pública e, acusado de irregularidades e desvio de verba da CBT, teve a imagem manchada e passou a evitar os clubes de tênis de São Paulo, onde mora. Enquanto isso, Lacerda mandou e desmandou na entidade (boicotou promotoras baseado em brigas pessoais, ameaçou tenistas e árbitros, negou credenciais e perseguiu jornalistas, além de usar a máquina da CBT para influenciar eleições da antiga federação de tênis do Rio de Janeiro) até que acabou condenado por crime de peculato a quatro anos de prisão.

Nastás viu tudo isso de longe e passou uma década – 12 anos, para ser mais preciso – se defendendo na Justiça até provar sua inocência. Demorou a voltar aos torneios. Hoje, 15 anos depois do boicote que iniciou o processo que terminou com sua saída da CBT, o ex-presidente aceitou falar abertamente sobre o assunto. Em conversa na sala de imprensa do Brasil Open, em fevereiro, admitiu que deixou dívidas na entidade e que errou ao nomear Jaime Oncins como capitão da Copa Davis sem conversar com os jogadores. Afirmou que fez o possível para aproveitar a Era Guga, mas questionou o boicote, classificando o movimento como uma traição ao país, e as acusações contra sua honestidade. Leiam!

O primeiro movimento dos tenistas contra você foi uma reunião no Canadá, em setembro de 2003, logo depois de o Brasil perder aquele playoff. Convocaram uma reunião para fazer cobranças. Aquilo te pegou de surpresa?

Completamente. Eu realmente não esperava. A gente perdeu do Canadá, o Guga perdeu aquele jogo do Daniel Nestor. O Nestor teve duas vitórias de simples no ano, e uma foi contra o Guga (risos). Eu estava no quarto, fui chamado para a reunião. "Achamos que você tem que sair da CBT". Esse foi o tom. "Não está acontecendo nada", não sei o quê. Argumentos nesse sentido. Como eu fui pego de surpresa, eu na hora não debati nada. Falei "vou estudar e vamos ver o que vai acontecer." Sinceramente, não achei que a coisa ia tomar outra dimensão, entendeu? Então voltei de lá, comecei a pensar, e começaram a vir acusações e tudo aquilo que todo mundo sabe [Nastás foi acusado de desvio de verba da CBT]. Comecei a administrar a minha saída. Meu compromisso acabou sendo o seguinte: "Não vou renunciar – porque acho que não deveria – mas não vou me candidatar mais." No fim da gestão, eu saio. Até teve uma conversa com o Jorge [Lacerda], na CBT. Eu falei "Não vou renunciar". A proposta foi a seguinte: "Você sai, e a gente põe uma pedra na sua gestão." Mas eu não tinha problema com a minha gestão, entendeu? Era meio do ano, e a gestão terminava em dezembro. O compromisso que assumi era não continuar. Não queria desagradar a ninguém. Até logo.

Mas não ficou só nisso…

Aí começou uma enxurrada de acusações e isso e aquilo. Eu tratei de me defender e quando chegou dezembro [de 2004], eu não me candidatei. O Jorge ganhou a eleição. O processo, na realidade, foi rápido em função do tempo. Você perde lá no Canadá, chega aqui e começa a ouvir um monte de acusação. Tratei de me defender – aliás, estava me defendendo até pouco tempo porque esses processos…

Foram quantos processos?

Um só, mas um processo criminal que se arrastou. Desde 2003-04, quando começou, até 2016. Foi um bom tempo. Mas, graças a Deus, esse processo já foi suspenso e não fui condenado a nada. Justiça foi feita. Saí completamente ileso. Tem um desgaste moral muito grande. No me foi dada muita oportunidade, na época, de eu falar. Cobrei vários elementos da imprensa, por exemplo. Na hora de me acusarem, era Jornal Nacional, Estado de S. Paulo, tudo isso. E agora, por que ninguém fala o desfecho da coisa? Mas… Foi assim (sorriso).

A questão da nomeação do Jaime Oncins para capitão foi o que consideraram a gota d'água para o boicote. Pelo que contam, você também foi pego de surpresa com a reação dos tenistas…

Exatamente. Veja bem, foi um erro duplo meu. Primeiro, eu achava que o Jaime, por ter acabado de sair do circuito e ser super ligado com os tenistas… E ele estava entusiasmado, queria ser técnico, capitão. Conversei com ele, ele achou ótimo e, no meu conceito, ele ia ser muito bem aceito pelos jogadores, mas eu cometi um erro, talvez, de não conversar com os jogadores. Eu conversei com o Pardal [então capitão], claro, a quem sempre tive muito respeito. Cometi um erro de não ter conversado melhor com ele. Eu estava em véspera de uma assembleia da ITF na Bélgica e precisava decidir aquilo, então foi por telefone que eu conversei com o Pardal. Eu falei "Pardal, estou saindo de viagem e quando eu voltar… Mas eu autorizei o Jaime a ir ao Sauípe [em fevereiro, para o Brasil Open] e conversar com os jogadores, então é um caminho aberto." De repente, eu vi que foi tudo ao contrário do que eu imaginava. Os jogadores não gostaram. Talvez eles queriam que eu sentasse com eles e falasse. Talvez esse foi meu erro. E, como te falei, não tinha absolutamente nada contra o Pardal, como não tenho até hoje. Gosto muito dele. Foram erros, assim, talvez, de conceito e atuação. Eu deveria ter uma pouco mais de cuidado nessa mudança, mas eu me assustei com a reação negativa em cima do nome do Jaime. Achei que seria muito tranquilo.

E não foi isso que aconteceu…

Não vou dizer que me arrependi, mas cometi um erro. Porque veja bem… Eu ouvi dizer "eles boicotaram porque você trocou o técnico sem falar com eles, e eles acham que não vão mais ser ouvidos." Isso aí, Alexandre, o Pardal pode confirmar. Na minha gestão, eu tive dois capitães de Copa Davis antes desse imbróglio. Paulo Cleto e o Pardal. Saía um sorteio da Copa Davis, eu sentava com o Paulo e falava: "O que a equipe quer?" É nível do mar, calor, altitude, quadra coberta? Eles é que me davam o perfil.

Não tinha sede oferecendo dinheiro?

É óbvio que eu ia atrás disso, entendeu? "Nível do mar? Boa. Vamos para o Rio, vamos para Floripa, vamos buscar prefeitura." Eu ia atrás, lógico. Mas não era decidido inverso. Eu não chamava eles e dizia "Vai ser em Campo Grande porque o cara quer me dar dinheiro." Isso nunca aconteceu. O Pardal pode confirmar isso. A equipe da Davis sempre foi ouvida. Era prioridade para mim.

Como foi, na sua posição, ver aquilo tudo acontecendo? Os jogadores saindo, o Chapecó assumindo o posto [Carlos Chabalgoity foi o capitão do confronto contra o Paraguai, em abril de 2004], e o time perdendo, ainda mais com aquela cena do Marcos Daniel estirado em quadra, com cãibra no corpo inteiro, sem conseguir levantar…

Foi bastante desagradável. Tudo que eu não queria era rebaixar a equipe. Agora… Eu esperava que a própria equipe reagisse. Eu acho o seguinte: você se negar a defender o país deveria ser a última coisa na vida, entendeu? A chance que você tem de vestir a camisa do Brasil é na Copa Davis! Eles poderiam entrar com uma tarja preta dizendo "Fora Nastás", bandeira, qualquer coisa! Menos se negar a jogar. As coisas não acontecem dessa forma. Não é "Eu sou contra você, então quero que se dane." Não é assim. Espera um pouquinho. Tem uma nação inteira nas costas, e eles jogaram essa nação toda pra cima de mim só. Não assumiram. Foi, realmente, muito desagradável de não conseguir formar a equipe e ver o que aconteceu. Triste eu fiquei, claro. Pelo Brasil, pelo momento do Brasil…

Como foi a conversa com o Chapecó?

Eu chamei ele na CBT… Porque ele sempre se colocou à minha disposição. "Olha, Nelson, quando precisar de alguma coisa…" E ele estava treinando alguns jogadores. Chamei e falei "Estou precisando de uma ajuda, uma força. Se você puder me ajudar…" Ele tentou, conversou com os jogadores e tudo. O Chapecó tinha muito bom relacionamento com todo mundo, mas quando o boicote está formado pelos cabeças, fica difícil romper. Foi por aí, entendeu?

No confronto seguinte, contra a Venezuela, o capitão foi o Ricardo Canto Pereira, e no último, contra o Peru, era o Carlos Alberto Kirmayr…

Eu achava o seguinte: não é justo eu pagar a conta sozinho. É triste ver essa situação? É triste. Mas os jogadores têm que sentir também que eles são responsáveis. Eu achava o seguinte: o Kirmayr tem acesso com todos. "Não é possível que o Kirmayr não convença…" Ainda que não fosse o Guga, mas pelo menos um time médio para jogar, que poderia ganhar. Fui buscando pessoas de bom relacionamento com a equipe e que pudessem ajudar a resolver a situação, mas não deu certo.

A principal reclamação é que não foi aproveitada a Era Guga…

É muito fácil dizer isso. Na época, nós não tínhamos nenhum patrocínio. O que tínhamos era um apoio do SporTV para ter os direitos de transmissão da Copa Davis. Com isso, eles ajudavam a gente e davam transmissões de torneios juvenis. Final, coisas assim. Depois é que veio a Lei Agnelo Piva, do COB, que começou a dar uma verba. A gente tinha isso pra trabalhar. Quando o Guga explodiu, eu procurei. Eu fiz projetos. Procurei empresas. Não sei como está hoje, mas a mentalidade deles sempre foi imediatista. Os resultados tinham que ser imediatos. Eu ouvi de marketing, do próprio Banco do Brasil: "Não, a gente tem o Guga. A gente tem Jornal Nacional, a gente tem capa do Estadão. Qualquer espirro que ele der, a imprensa toda cobre." Eu falei "Mas espera um pouquinho. Ótimo que vocês tenham o Guga, mas vocês podem ser o grande apoio para alavancar novos Gugas." Eu acho que o Guga é um fenômeno, ninguém ia chegar, mas podia projetar, podíamos fazer um centro de treinamento ou alguma coisa assim. Não tive sucesso. Os projetos foram feitos, houve tentativa nesse sentido, tanto é que a gente começou a se preocupar com a base, com a capacitação dos professores. Até hoje existe, mas iniciou com o Kirmayr na nossa gestão. O Tênis Nas Escolas começou com a Patrícia Medrado na nossa gestão. As arbitragens foram se aperfeiçoando. A gente criou situações para oferecer, principalmente para o tenista infantojuvenil, de jogar sempre numa quadra com torneio bem organizado. A gente dava total apoio ao circuito juvenil do Neco [Nelson Aerts, ex-tenista e promotor], a Koch Tavares [promotora do ex-tenista Luis Felipe Tavares] tinha seu circuito juvenil, e nós criamos um circuito juvenil nosso. A CBT fez um também.

Sem centralizar, né?

Eu achei o seguinte: uma forma de você alavancar o tênis é dar condições boas para os garotos jogarem. E como eu tinha esse apoio do SporTV, eu, por exemplo, dei para o Neco uma transmissão de final do circuito dele. Eu tinha dez transmissões de torneios infantojuvenis por ano. Eu distribuí. Dei para o Neco, a Koch fez acordo… A nossa visão era de dar boas condições para os tenistas crescerem. Então é muito fácil falar que eu não aproveitei. Agora… Centro de treinamento é a coisa mais difícil de ter. Primeiro: o Brasil tem 8,5 milhões de quilômetros quadrados. Pensa como é complicado. É diferente da Espanha, que é um bairro de São Paulo – modo de falar, né? Eu fiz uma proposta para diversos… Kirmayr, pessoal de Belo Horizonte… Falei "Já existem as academias, vamos transformar em centros de treinamento." Mas foi tudo interrompido. Começou a andar, mas foi cortado.

Você se sentiu traído pelos jogadores?

Eu, não. O Brasil, sim. Desculpa ser repetitivo, mas eles representam o Brasil. Eu não fiz nada contra eles, que prejudicasse eles, diretamente, para uma atitude dessas. Eles fizerem boicote contra o país. Eu lembro que o Oscar Schmidt (do basquete) fez uma declaração dizendo que não defender o país era o fim da picada. Então acho que quem foi traído foi o Brasil, não eu.

Houve o boicote porque os tenistas eram contra sua gestão. O Jorge, que entrou, ficou 12 anos e foi condenado a quatro anos de prisão em regime aberto. Do mesmo jeito que você não aproveitou a Era Guga, ele não aproveitou a injeção de dinheiro do pré-Rio 2016. Como é ver isso e saber que os tenistas não cobraram o Jorge da mesma maneira?

A minha indignação é essa. Os tenistas que foram contra mim deviam se manifestar! Eu acho que sim! Qual o problema? Por que agora não cobram também? Essa pergunta tem que ser feita a eles. "Por que vocês não se manifestam?" Eu não sei . Não tenho a menor ideia. Não sei se parte do dinheiro dos Correios ia para os jogadores…

Não dá dó ver um circuito juvenil hoje com tão poucos torneios?

Claro que dá. Os circuitos todos acabaram. Os sêniores, com quem a gente sempre teve o maior carinho, foram desprezados totalmente. Os sêniores são pessoas que se dedicaram a vida inteira ao tênis, que tiveram títulos ou não, mas participam, vão a Sul-Americanos, se cotizam, vão a Mundial defender o Brasil. Tinha que ter uma atenção também a eles. Mas, focando nos juvenis, tinha vários circuitos pelo Brasil. Participação intensa em Cosats, ITFs… Isso tudo morreu. É triste! Eu sou apaixonado por tênis. Eu saí da CBT 15 anos atrás, mas continuo lendo, acompanhando, estou aqui neste torneio…

Na sua época, as coisas eram totalmente diferentes. Presidentes de federações e confederações não eram remunerados. De onde vinha a sua renda?

A lei não permitia que dirigente fosse remunerado. Eu fazia alguns trabalhos paralelos que me davam algum sustento. Eu tinha assessorias que eu dava. Esses torneios que eu faço, eles existem há muito tempo. Só que agora eu faço de forma mais aberta. Eu fazendo, entendeu? Antes, não. Eu dava assessoria, tinha participação… Eu não queria misturar as coisas.

Você organiza torneios ainda?

Eu organizo torneios amadores. Meus torneios são de jornalistas, médicos, dentistas… É segmentado. Eu faço em fins de semana. Eu faço a Copa Luiz Noriega. Ele era muito amigo, a gente ia um na casa do outro tomar uns porres. Eu vi o Maurício crescer. Quando ele faleceu, conversei com o Maurício e disse "Quero fazer uma homenagem para ele", só para jornalistas ligados ao esporte. Estamos no sexto ano já. O pessoal adora! Então eu fiquei no meio do tênis. Alexandre, veja bem: durante 30 anos, eu fiquei entre Federação, Confederação, Cosat e ITF. Então, sabe… É a minha vida. Pergunta "O que você sabe fazer?" "Sei mexer com tênis, falar de tênis." Acompanho na televisão, adoro estar nos torneios, conversar com as pessoas… Esse tipo de relacionamento, sua presença nos torneios, é importante. Agora eu sou um mero espectador, mas na minha época eu fazia questão de ir em todos. Abertura aqui, encerramento lá, premiação aqui, hasteamento de bandeira em outro lugar… Não importava o tipo de torneio. Banana Bowl a gente fazia com uma paixão tremenda. Quando eu entrei na Federação [Paulista], em 1975, foi o Milton Motta, pai do Cássio, que me levou. Dois anos depois, ele me pede para buscar um tal de Ivan Lendl no aeroporto. Ele ia jogar o Banana Bowl em Santos. "Vamos lá." Aí desce um garotinho magrinho, emburrado, com o avô junto. Sentaram no carro e não abriram a boca daqui até Santos (risos). Mas era o modo de a gente agir. Não tinha grandes verbas. Era tudo feito na vontade, no idealismo. Eu cresci com isso na cabeça.

Como foram os primeiros seis meses – um ano – depois da sua saída?

Logo depois que aconteceu tudo isso, eu fiquei um pouco afastado. Falei "Não vou meter a cara" porque não me foi dada a oportunidade de esclarecer tudo publicamente. Foi só de acompanhar pela imprensa. Claro, eu estava com um processo em andamento, né? Então era oficial de Justiça que chegava, então eu corria no advogado, via a documentação que precisava, testemunha… Foi bastante complicado o início. Depois chegou um ponto, antes mesmo de acabar o processo, que eu comecei a frequentar os clubes. Tinha torneio aqui, tinha torneio lá… Fui recebido de uma forma muito legal pelos jogadores, técnicos… Agora mesmo acabei de encontrar o Meca (Júlio Góes). Então graças a Deus formei um ótimo relacionamento com todos. E a maioria me respeita até hoje. Não houve divulgação de "o processo do Nelson já foi arquivado." Não houve. Mas, na base da confiança e do tempo que eu conheço eles, todos me tratam com muito respeito. Foi muito bom voltar a frequentar os clubes. Isso é gostoso demais. Eu ouvia muito pais, mães, treinadores… Por mais absurda que fosse a reclamação, você tinha que ouvir. A função era essa.

Presidente de federação e Confederação vai sempre ouvir…

Lógico. E eu nunca me omiti. Eu ia nos torneios! Eu ia porque eu gostava desse feedback de todos também. "Está errado aqui? Vamos pensar lá!". Era uma forma de atuação muito legal.

O tênis brasileiro andou para a frente em que áreas nesses 15 anos?

É difícil analisar assim, se andou, porque foi uma gestão… A gestão do Jorge foi bem diferente da minha. Primeiro que eu não tinha dinheiro nenhum. Ele tinha um caminhão de dinheiro. Mas, assim, não tem mais torneio… Em termos de apoio a tenistas, tirando Correios para os profissionais do alto rendimento, não tinha como antes alguém fazer com tenista infantojuvenil. Então é difícil falar, né, quando você não está dentro.

As pessoas reclamavam das contas, que a sua CBT tinha muita dívida.

Dívida tinha! Isso aí eu nunca neguei, entendeu? A gente fechava no vermelho. Mas por quê? Porque a gente procurava fazer alguma coisa. Esses circuitos todos tinham despesa. A ajuda que a gente dava aos juvenis para jogar um torneio por equipe, por exemplo, era tudo pago por nós. Cosat, Mundial… A gente dava esse tipo de apoio. Eu nunca neguei que a CBT tinha dívidas. O que eu nego é que essa dívida era a meu favor. Isso de jeito algum! Já provei. E mais! Sempre ouvi falar em reclamação sobre prestação de contas. Todas as prestações de contas feitas, aprovadas em assembleia e registradas em cartório no Rio de Janeiro, onde é ou era a sede oficial. Eu prestava conta com as federações, que é para quem eu preciso prestar contas. Naquela época não havia obrigação de colocar no site.

Mas não muda muito também. O que se coloca lá não diz quase nada. Se você pegar um balanço qualquer da CBT, você vai ler "Despesas gerais e administrativas". O que é isso? Quanto é pra comunicação? Quanto vai para advogados, por exemplo?

Não está discriminado… Mas antigamente não existia essa obrigação. O que tinha, estatutoriamente, era obrigação de prestar contas para as federações, as afiliadas. Então se você ouve "ele não prestava contas", isso é mentira. Mentira total! Desafio qualquer um. Pena que eu não tenho mais os documentos para sair mostrando. Da forma que eu tive de sair de lá [CBT]… Para você ter uma ideia, minhas coisas pessoais, eu vim receber numa caixa depois de alguns meses. Eu não tive tempo, não tive chance de limpar minhas gavetas. E não precisava nada disso.

Isso porque a Polícia Federal entrou, né?

Foi tudo. As acusações, polícia, oficial de justiça… O que eu acho é o seguinte. Não precisava me destruir para ganhar a eleição. Faz um projeto e vai vender para as federações. E ele tinha apoio! O Neco estava com ele. Tinha gente graúda atrás disso que podia dar apoio e deu apoio para ele viajar pelo Brasil [Gustavo Kuerten foi o maior apoiador da candidatura de Jorge Lacerda]. Quando assumi a CBT, na primeira vez, não sei se você lembra disso, era o Walmor Elias o presidente. Era dívida com jogadores da Davis, com tudo. A equipe da Davis, que era Jaime Oncins, Fernando Roese, Luiz Mattar e Cássio Motta, há meses que não recebia. Eu fiz uma campanha, ganhei a eleição, assumi e acabou. Não fui destruir o senhor Walmor Elias. Eu acho que deveria ser assim. Limpei as contas com os jogadores. Desse dívida que eu deixei na CBT, não devia um tostão a jogador de Copa Davis nenhum. Ficou tudo pago rigorosamente em dia. Em cada confronto, dez dias depois a ITF mandava o prêmio. No 11º dia, eu distribuía. O compromisso que eu tinha com eles era pegar o prêmio da ITF e repassar integral para eles. Ponto. Não ficava nada para a CBT [dias depois da entrevista, em conversa por telefone, Nastás disse ter conversado com Paulo Cleto e admitiu que houve atrasos em algumas poucas ocasiões]. Quando era fora do Brasil, eu ficava com 20% para pagar passagens e essas coisas. Os 80% eram deles. Esse era o acordo e não fiquei devendo um centavo. Então eu acho o seguinte: o Jorge queria ser presidente? Tinha direito. Vai fazer campanha! Não precisava me destruir para pegar o meu cargo.

* Após ler a entrevista de Fernando Meligeni, Nastás me procurou para comentar a frase de Fininho, que recomendou a procura de um psiquiatra a dirigentes que querem continuar no cargo sem salário. O ex-presidente disse: "Eu venho de uma geração de presidentes idealistas, amadores. Fazíamos por amor ao esporte, por idealismo. Eu não preciso de psiquiatra nenhum. Quem pensa só em dinheiro é que precisa."

Sobre o autor

Alexandre Cossenza é bacharel em direito e largou os tribunais para abraçar o jornalismo. Passou por redações grandes, cobre tênis profissionalmente há oito anos e também escreve sobre futebol. Já bateu bola com Nadal e Federer e acredita que é possível apreciar ambos em medidas iguais.
Contato: ac@cossenza.org

Sobre o blog

Se é sobre tênis, aparece aqui. Entrevistas, análises, curiosidades, crônicas e críticas. Às vezes fiscal, às vezes corneta, dependendo do dia, do assunto e de quem lê. Sempre crítico e autêntico, doa a quem doer.