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15 Anos do Boicote: passado, presente e questões do tênis brasileiro

Alexandre Cossenza

14/04/2019 11h14

No dia 9 de março de 2004, Gustavo Kuerten anunciou que não iria participar do próximo confronto do Brasil na Copa Davis. Não era um aviso relacionado à sua lesão no quadril, que até então só havia sido operado uma vez. Longe disso. Tratava-se de uma medida política. A abstenção de Guga era um boicote contra o então presidente da Confederação Brasileira de Tênis (CBT), Nelson Nastás, que vinha sendo acusado não contribuir devidamente para o desenvolvimento do tênis no país.

"A administração atual pouco fez para desenvolver o tênis e ajudar os tenistas. Já se passaram mais de sete anos que ganhei Roland Garros, mas a confederação não aproveitou para fazer um bom trabalho de base", disse o catarinense, na época, segundo a Folha de S. Paulo.

A decisão de Guga teve a companhia dos tenistas de mais expressão na época. Flávio Saretta, Ricardo Mello, André Sá, Daniel Melo e Franco Ferreiro, entre outros, se juntaram ao boicote. Fernando Meligeni, que deixou o circuito no ano anterior, também apoiou o movimento. Na época, os jogadores também reclamaram de não terem sido consultados sobre o nome de Jaime Oncins, que foi colocado pela CBT como capitão no lugar de Ricardo Acioly.

Oncins acabou não ficando no cargo, e Carlos Chabalgoity foi chamado para conduzir o time brasileiro contra o Paraguai, em abril daquele ano, em duelo válido pelo Zonal das Américas. O time que entrou em quadra tinha Marcos Daniel, Josh Goffi, Alexandre Simoni e Júlio Silva. O Paraguai, liderado por Ramon Delgado, venceu por 3 a 2, fechando a série no quarto jogo.

O boicote foi apenas o começo de um turbilhão no cenário político do tênis brasileiro. Um movimento nascido em Santa Catarina apontava irregularidades na gestão de Nastás e, ao mesmo tempo, lançava o nome de Jorge Lacerda como candidato à presidência da entidade. A batalha entrou no campo jurídico. Lacerda foi eleito presidente em dezembro de 2004, mas uma liminar anulou o resultado da votação.

No período, a CBT chegou a ter dois interventores: um para a eleição (Sérgio Oprea, atual presidente da Federação Brasiliense e empresário de Marcelo Melo) e outro para a administração (Eduardo Nakamiti). Enquanto a disputa no âmbito político não se resolveu, o boicote dos tenistas continuou. Ainda em 2004, o Brasil precisou encarar a Venezuela com um time jovem e inexperiente (Raony Carvalho, Bruno Rosa, Diego Cubas e Caio Zampieri) e foi derrotado por 3 a 2, com o confronto decidido no terceiro ponto.

Em setembro de 2004, contra o Peru, o time tinha Ronaldo Carvalho, Alessandro Camarço, Leonardo Kirche e Gabriel Pitta (vide foto no alto do post). Luís Horna e Ivan Miranda venceram fácil por 4 a 1, selando a vitória no sábado. O resultado decretou o rebaixamento do Brasil para o Zonal II, uma espécie de terceira divisão da Copa Davis.

A situação se resolveu no primeiro semestre de 2005, com Jorge Lacerda assumindo definitivamente a presidência da CBT, e os tenistas voltando a jogar a Copa Davis. Lacerda governou absoluto até o fim de 2016, quando conseguiu nos bastidores a eleição do amigo e apadrinhado Rafael Westrupp, que fez parte da administração da entidade nos últimos anos da gestão do conterrâneo.

Em janeiro de 2019, quase 15 anos depois, Jorge Lacerda foi condenado pela Justiça Federal por crime de peculato junto ao ex-comentarista do SporTV Dacio Campos e ao empresário Ricardo Marzola. Lacerda pegou quatro anos de prisão em regime aberto e precisará pagar mais de R$ 120 mil em multas. Além disso, por causa da conduta de Lacerda, a CBT foi obrigada a devolver mais de meio milhão de reais em 2013.

A ideia aqui não é questionar o boicote, mas lembrar o que houve durante e depois. O que aconteceu nestes 15 anos com o tênis brasileiro? Em que áreas houve avanços? Houve retrocesso? Em que áreas? O que dizem pessoas envolvidas no boicote de 15 anos atrás? A gestão Lacerda cumpriu o que prometeu? E os tenistas de hoje? São tão atuantes quanto foram Guga e cia. em sua época? E quais os motivos para isso?

A partir desta segunda-feira, 15 de abril, o blog publicará uma série de entrevistas lembrando daquele episódio e do que rumo que o tênis brasileiro tomou desde então. Acompanhem!

Sobre o autor

Alexandre Cossenza é bacharel em direito e largou os tribunais para abraçar o jornalismo. Passou por redações grandes, cobre tênis profissionalmente há oito anos e também escreve sobre futebol. Já bateu bola com Nadal e Federer e acredita que é possível apreciar ambos em medidas iguais.
Contato: ac@cossenza.org

Sobre o blog

Se é sobre tênis, aparece aqui. Entrevistas, análises, curiosidades, crônicas e críticas. Às vezes fiscal, às vezes corneta, dependendo do dia, do assunto e de quem lê. Sempre crítico e autêntico, doa a quem doer.