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Cossenza Responde: perguntas e respostas natalinas

Alexandre Cossenza

24/12/2018 05h00

Natal no blog é época de resgatar o Cossenza Responde, aquela tradicional seção de perguntas e respostas (o antigo P&R). Leitores enviaram suas perguntas via Twitter, e as respostas estão aqui. Os assuntos são muitos e incluem Thiago Wild, Brasil Open, Rio Open, tie-break nos slams, Serena, Sharapova, Azarenka, Copa Davis, Challengers, tênis na TV e até a suposta inveja de Djokovic em relação a Federer e Nadal.

Não importa se você está curtindo o dia 24 em casa ou viajando, esperando pela ceia ou até mesmo mais tarde, testando um smartphone novo que ganhou de presente. Dá para aproveitar o tempo, rolar a página e ficar por dentro disso tudo. Seja bem-vindo.

Thiago, você não foi o único a mencionar essa declaração do Orlandinho, que chamou o tênis de Thiago Wild de diferente e "mais moderno". Eu não sei exatamente o que o Orlandinho quis dizer com isso. Não significa ser agressivo porque o próprio gaúcho e Marcelo Zormann são tenistas que jogam agredindo, mais dentro da quadra. Zormann, aliás, é um tenista que consegue agredir bastante com a devolução de backhand. Talvez o Orlandinho quis dizer que o Wild joga mais dentro da quadra por mais tempo. Ou, talvez, a gente possa colocar essa frase na lista de declarações desastradas que o Orlandinho deu recentemente. Além do que citei em um post recente, é o mesmo tenista, lembremos, que deu uma entrevista em outubro de 2017, dizendo estar abaixo do peso, e que, segundo Leo Azevedo, chegou muito mal fisicamente – "com muitos quilos acima" – para treinar em Barcelona, alguns meses depois (difícil acreditar que ele engordou tanto em dois meses).

Especificamente sobre o Wild, o que vejo nele são golpes limpos, bem formados, sem um ponto fraco óbvio. É claro que há coisas a trabalhar e evoluir, mas seu tênis parece bastante organizado. Sempre digo (desde o fim do ano passado) que não ficava tão impressionado – e otimista – com um brasileiro desde que vi Bellucci pela primeira vez. Para mim, porém, seu maior diferencial em relação às últimas promessas brasileiras está no aspecto mental. Wild não é adepto do coitadismo, do "não falem de mim porque não quero pressão", do "não quero criar expectativa" – e olha que a pressão foi muito pequena para todas promessas recentes. Ele tem uma autoconfiança elogiável, acredita que pode ir muito longe e não tem medo de falar isso. Se um dia pecar por excesso de confiança ou arrogância, paciência. Vai poder aprender e melhorar. Difícil mesmo é consertar a cabeça de atleta que já cresce ouvindo de técnico que não deve criar expectativa. Quem pensa pequeno sempre alcança menos do que poderia.

Olha, Leonardo, se Thiago Monteiro começou 2016 como #463 do mundo e terminou como 82º do ranking, não é nada impossível que Wild salte do atual 532º lugar para o top 100, ainda mais porque ele vai ter a chance de jogar um ATP 500 e um ATP 250 no início do ano, o mesmo que Monteiro fez três anos atrás. Vale lembrar que o cearense teve uma dose de sorte (não é todo mundo que pega Tsonga num dia como aquele) e aproveitou. Quem sabe Wild não tem uma oportunidade parecida? De todo modo, longe de ser o fim do mundo se Wild não se aproximar tanto do top 100.

No ano que voltou da gravidez, Serena fez duas finais de slam e terminou em 16º lugar, jogando apenas sete torneios. Isso diz bastante sobre o potencial da americana. Ser #1, porém, exige um aproveitamento maior ou um calendário mais extenso. Hoje, Halep soma 6.921 pontos. Para chegar a um número parecido, Serena precisaria ganhar dois slams e alguns Premiers. Fazer isso aos 37 não é tão simples assim. Se optar por jogar mais torneios, o risco de lesão aumenta. Se jogar pouco, perde ritmo de competição. É um equilíbrio difícil de conseguir.

São dois casos bem diferentes, Levir. Azarenka teve um filho, demorou a voltar ao circuito e, quando parecia que as coisas andariam, a bielorrussa se viu numa batalha pela guarda do filho, sem poder viajar pelo circuito. Só conseguiu fazer uma sequência de torneios a partir de maio deste ano e, sem ser cabeça de chave, enfrentou cedo muita gente que vinha em bom ritmo. Sua lista de derrotas inclui nomes como Osaka, Safarova, Pliskova, Konta, Garcia, Stephens e Giorgi – uma série muito dura para quem voltou ao circuito sem ritmo e fisicamente longe de quando estava no auge. É preciso paciência.

A situação de Sharapova, que voltou ao circuito em maio de 2017, após suspensão por doping, é outra. A russa fez uma temporada completa e foi até uma boa temporada. Ela termina o ano como #29 do mundo. A russa esteve em forma e bem treinada a maior parte do tempo. A impressão que tenho é que o tempo passou e Sharapova agregou muito pouco a seu tênis, que é basicamente o mesmo de sete anos atrás. Hoje, porém, há muito mais atletas capazes de lidar com a potência gerada pela russa e muito mais atletas velozes. Maria vem perdendo, aos poucos, sua margem para dias ruins. Óbvio que numa semana inspirada ela pode jogar de igual para igual com qualquer adversária, mas a tendência é que ela tenha cada vez mais dificuldade nas rodadas iniciais dos torneios. Aliás, a própria Sharapova disse que hoje em dia as primeiras rodadas estão muito mais difíceis do que há algum tempo. A questão-dilema-de-Tostines é: "Sharapova vem ganhando menos porque o circuito está mais forte ou o circuito parece mais forte porque Sharapova evoluiu pouco durante esse tempo?" Minha resposta para isso seria "ambos".

Isso não parece tão provável hoje em dia (o projeto de Lei de Incentivo já foi aprovado, o que permite à promotora captar e fechar contratos de patrocínio), mas se acontecer o Brasil perderá um evento com uma história muito bonita e um torneio muito legal de ver. O Brasil Open não tem a pompa do Rio Open nem uma data boa (é o único ATP 250 que compete com dois ATPs 500 na mesma semana), mas o público de São Paulo sempre comparece e cria um ambiente legal para o torneio. Por mais que o Ibirapuera não dê uma "cara de clube" para a competição, a estrutura é boa (não é ótima). Em 2018, com muitos estandes e food trucks na área ao redor do ginásio, melhorou bastante.

Difícil falar sobre o futuro do Rio Open sem saber o que será do calendário da ATP. Enquanto não houver mudanças, não vejo o torneio carioca dando um passo à frente. A organização vem encontrando dificuldades para trazer nomes novos e atraentes. Também preocupa o fato de que o Rio Open teve gente como Nadal, Tsonga, Isner, Sock, Cilic, Nishikori e outros que decidiram não voltar. Se há gente que vem e não volta, é porque há um empecilho grande. O diretor do torneio, Lui Carvalho, costuma culpar o saibro. Ele acredita que na quadra dura o torneio teria mais estrelas.

Pode dar. Já escrevi isso algumas vezes. No fim das contas, a fase final pode ser algo divertido de ver. Mas não será "aquela" Copa Davis. Será um evento novo, sem muitos dos elementos estratégicos que faziam a Davis tão interessante. É como jantar na Fogo de Chão num sábado e, no domingo, almoçar espetinho na porta do estádio. O churrasquinho de rua pode ser bom – e, dependendo da companhia, um programa mais divertido – mas sem a complexidade e a sofisticação do sabor da comida servida num rodízio de R$ 150.

Não entendi exatamente o que você quis dizer, Renan. Se você imagina Challengers e ATPs nas mesmas semanas, aí eu acho ruim e acredito que os tenistas pensariam parecido. Alguns atletas que poderiam entrar nos qualis dos ATPs teriam que correr o risco e não jogar os Challengers. Não é o ideal. Sobre ter mais Challengers no Brasil, aí a coisa passa também pela economia local. É difícil fazer um torneio quando os custos chegam na casa de um milhão de reais e não se arrecada com bilheteria. Hoje em dia, só com patrocínio via Lei de Incentivo, que não é um processo tão simples assim e limita a quantidade de gente que pode fazer torneio.

Se não fosse lucrativo, não teríamos tanto tênis na TV (acredite: o Brasil está entre os países com mais torneios mostrados na TV fechada). Só que tem muita coisa que entra nessa equação, Rodrigo. Exigências contratuais, problemas de grade, dificuldades financeiras, audiência, prioridades do canal, etc. Difícil explicar tudo sem fazer um post gigante, mas te dou alguns exemplos práticos: 1) Sei de um canal que deixou de mostrar torneios porque não podia pagar a equipe técnica para fazer a transmissão; 2) Se o contrato com ATP/WTA/ITF não exige multa em caso de não-exibição de um certo jogo, um canal pode preferir mostrar futebol internacional ou estadual porque lhe dá mais audiência. 3) Como a NFL é prioridade absoluta na ESPN, é compreensível que o canal corte o tênis quando houver um conflito de horário entre as duas modalidades; e 4) Tem também canal que compra direitos de transmissão sem conhecer tênis e sem uma assessoria de imprensa que entenda do assunto. Aí fica difícil criar uma audiência e, quando não há público, o canal desiste do esporte. Se você não sabe de que canal estou falando, aguarde alguns dias.

Felipe, eu acho que as mudanças são mais uma prova de que os jogadores têm um poder muito maior do que os torneios atualmente. Por tudo que se falou, foram eles o fator que mais pesou para que o Australian Open e Wimbledon optassem pela introdução, respectivamente, do match tie-break no 6/6 do set decisivo e do tie-break no 12/12 do set decisivo. É claro que também há o interesse das TVs e o argumento de que o público hoje não quer eventos tão longos, mas promover mudanças baseado apenas nisso seria se apoiar em exceções. Este ano, Wimbledon teve apenas uma partida com mais de 24 games no quinto set. Ano passado, idem (e foi Nadal x Muller, um dos melhores jogos do ano). Estamos falando de duas partidas em um total de 256. É muito pouco. No fundo, o que parece ter pesado foi a opinião dos jogadores, que não querem o desgaste acumulado de um encontro muito longo afetando sua próxima rodada no torneio. Maaaaas se o tie-break garante uma rodada seguinte competitiva, ele também traz uma consequência nada elogiável: anula a vantagem do tenista que, por mérito próprio, conseguiu vencer em pouco tempo. Isso, em slams, com melhor-de-cinco sets, sempre fez diferença.

Sobre a questão do Diego, eu acho que os tie-breaks em sets decisivos mudam um elemento essencial (falecido há tempos no US Open): passa a ser possível vencer um jogo sem quebrar o saque do adversário. Isso sempre foi uma das características básicas do tênis – por isso, não havia tie-break em set nenhum antigamente.

Se falamos de potencial, a resposta tem que ser Zverev. É quem tem o melhor pacote. Falta ir melhor nos slams.

Acredito, mas não vejo tanta relevância nisso. Primeiro porque o #1 do Brasil, hoje, é apenas o #123 do mundo (Thiago Monteiro). Depois porque o Thomaz já fez tanto na carreira e já jogou tantos torneios grandes… Ser número 1 do país, para ele, deve estar no finzinho da lista de prioridades. Se estiver.

Eu até faria, mas tem tanta gente sem senso de humor e semeando ódio navegando por aí que eu perdi a paciência e disposição para esse tipo de post. Se fizer, publicarei apenas para apoiadores do blog (como você é apoiador, Pedro Paulo, vai receber um aviso por email se eu publicar algo do tipo).

Não sei se inveja é a palavra, mas eu vejo um sentimento assim muito mais dos fãs do sérvio do que do próprio Djokovic. É compreensível porque, no fim das contas, independentemente do número de slams conquistados (essa conta é afetada por algumas variáveis – nunca é 100% justo comparar só pelo número absoluto de troféus), dá para argumentar que Nole é um tenista mais completo do que os outros dois – somando técnico, tático, físico e mental. A questão que você levanta, para mim, é muito mais de timing do que de carisma ou nível de tênis. Quando Djokovic se colocou como postulante a um título de slam (sua primeira final foi no US Open de 2007), Nadal e Federer já viviam uma rivalidade forte. E aí não é só uma questão de quantas vezes eles jogaram ou do número de finais de slam que fizeram. Espanhol e suíço, com seus contrastes de estilos de jogo e comportamento, polarizaram os fãs. Virou Fla-Flu. Nessa analogia (longe da ideal, admito), Djokovic seria uma espécie de Vasco. Tão grande quanto os outros dois e mais vitorioso em alguns momentos. Mas nem Flamengo x Vasco nem Vasco x Fluminense tem a polarização de um Fla-Flu. E é por isso, no fim das contas, que usamos rubro-negros e tricolores em metáforas como "Fla-Flu político".

E com essa resposta, com potencial para desagradar a gregos, troianos, nadaletes, federetes, noletes, rubro-negros, tricolores e vascaínos, este Cossenza Responde fica por aqui. Deixo aqui um muito obrigado a todos que enviaram perguntas no Twitter – não deu para responder tudo – e um enorme desejo de que estes dias 24 e 25 sejam cheios de amor, paz e alegria ao pessoal que passou aqui para ler.

Sobre o autor

Alexandre Cossenza é bacharel em direito e largou os tribunais para abraçar o jornalismo. Passou por redações grandes, cobre tênis profissionalmente há oito anos e também escreve sobre futebol. Já bateu bola com Nadal e Federer e acredita que é possível apreciar ambos em medidas iguais.
Contato: ac@cossenza.org

Sobre o blog

Se é sobre tênis, aparece aqui. Entrevistas, análises, curiosidades, crônicas e críticas. Às vezes fiscal, às vezes corneta, dependendo do dia, do assunto e de quem lê. Sempre crítico e autêntico, doa a quem doer.