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Challengers serão maiores e mais caros em 2019, mas com pouco retorno para os tenistas

Alexandre Cossenza

26/07/2018 07h00

A ATP anunciou, nesta semana, uma série de mudanças para a temporada 2019 no Circuito Challenger. São alterações consideráveis, que incluem prêmio em dinheiro, calendário e organização. Os torneios ficarão maiores, com prêmios (levemente) mais gordos e que exigirão mais dos promotores. Troquei mensagens com Guilherme Clezar e Fernando Romboli, tenistas que vêm jogando o circuito Challenger com frequência, e conversei com Danilo Marcelino, diretor do CH de Campinas, para entender as possíveis consequências do novo regulamento. Trago aqui o que apurei e como cada mudança pode afetar atletas e promotores.

Tamanho das chaves

Em vez de 32 jogadores, como atualmente, os Challengers terão, no mínimo, 48 tenistas a partir de 2019. Há também a possibilidade de eventos com chave de 56 atletas. O qualifying terá apenas quatro tenistas. Em duplas, os eventos continuam com 16 times.

Visão da ATP: provoca um aumento de 2.400 oportunidades de emprego ao longo de uma temporada. Todos serão pagos e terão direito a hospedagem.

Tenistas: Clezar disse que, teoricamente, vai ficar mais fácil entrar nos torneios, o que faz sentido. Numa semana normal, com cinco Challengers, existirão 80 vagas a mais. É um aumento de 50%. Vai ser essencial a partir de 2020, quando os Futures não darão mais pontos no ranking da ATP. O gaúcho lembrou, contudo, que ganhar um Challenger vai exigir mais. Quem não sair adiantado na chave precisará de seis vitórias para ser campeão.

Romboli, atual #129 do mundo em duplas, ressaltou que a diferença de pontuação entre os Challengers e os ATP ainda é muito grande para os duplistas (e não parece que vai mudar muito no novo formato). "Para você subir do nível Challenger para o ATP, você tem que ganhar uns oito, nove Challengers."

Calendário

Todos torneios terão duração de sete dias, começando na segunda-feira e terminando no domingo. São dois dias a menos de jogos, já que atualmente o qualifying começa no sábado. A partir do ano que vem, o quali será disputado na segunda-feira. Serão, afinal, só dois jogos.

No modelo proposto pela ATP, um calendário de torneio seria realizado assim: quali e 12 jogos de primeira rodada na segunda-feira; 4 jogos de primeira rodada e 8 partidas da segunda fase na terça; 8 jogos de segunda rodada na quarta; oitavas de final completas na quinta, quartas de final na sexta; semifinais no sábado; e final no domingo. A ATP recomenda usar três quadras de segunda a quinta, duas quadras na sexta e uma no resto.

Organização: Marcelino ressaltou que com os jogos a mais, a margem para dias chuvosos diminui consideravelmente. Um dia inteiro de mau tempo fará enorme estrago na programação. Dá para imaginar um aumento no número de tenistas fazendo dois jogos o mesmo dia. O diretor disse ainda que não há grande economia com os dois dias a menos de evento.

ATP: não haverá mais conflito para tenistas que vão longe num torneio e precisariam disputar o qualifying na semana seguinte. Como os quais começarão sempre às segundas, todos tenistas podem jogar até a final, no domingo, e chegarão a tempo de disputar o evento seguinte.

Hospitalidade

Todos torneios da série Challenger serão obrigados a fornecer hospedagem para todos jogadores das chaves principais (simples e duplas). Atualmente, hospedagem é opcional.

Organização: aqui a mudança pesa no bolso dos promotores que faziam torneios sem dar hospedagem. Segundo Marcelino, os custos com hotel devem ficar na casa dos R$ 70-100 mil (considerando apenas jogadores, que é onde a regra muda). Esse custo varia, claro, de acordo com a cidade, a localização do clube e a época do ano. Além disso, dá mais trabalho administrar as reservas de 56 jogadores. Para os torneios que já dão hospedagem, a alteração não é tão significativa assim porque a regra nova também prevê uma redução no número de diárias mínimas. Antes, um simplista tinha direito a pelo menos cinco noites de hospedagem. Agora serão apenas três (começando no sábado até a noite da eliminação na chave). Maaaas se chover, a conta aumenta consideravelmente.

Tenistas: Romboli, atual #126 do mundo nas duplas, lembrou que a regra de diárias mínimas não mudou para os duplistas. De modo geral, no entanto, é bom saber que ninguém mais precisará pagar hospedagem enquanto estiver vivo no torneio – qualquer torneio, onde quer que seja no mundo.

ATP: a entidade enfatiza que, ao logo do ano, tenistas terão direito a cerca de 20 mil diárias adicionais de hotel.

Prêmio em dinheiro

Há um aumento no prêmio em dinheiro. Torneios de US$ 50 mil, por exemplo, passarão a pagar US$ 54.160 e se chamarão ATP Challenger 70. Haverá cinco níveis de eventos. Além dos Challengers 70, haverá torneios de nível 80 (US$ 81.240 de premiação), 95 (US$ 108.320), 110 (US$ 135.400) e 125 (US$ 162.480). A ATP, no entanto, vai financiar uma parte dessa premiação. O valor pago pela própria entidade varia entre US$ 6.160 (Challenger 70) e US$ 14.480 (Challenger 125).

ATP: a estimativa da entidade é de um aumento de cerca de US$ 1 milhão na valor a ser distribuído ao longo da temporada. Além disso, 16 jogadores a mais receberão prêmios em cada torneio.

Jogadores: ninguém apontou uma diferença significativa aqui. Para efeito de comparação, hoje um Challenger de US$ 50 mil paga US$ 520 para quem perde na primeira rodada e US$ 7.200 para o campeão. No formato que valerá a partir de 2019, o equivalente Challenger 70 (com US$ 54 mil de premiação) vai pagar US$ 260 aos perdedores de primeira rodada e os mesmos US$ 7.200 ao campeão.

Como Marcelino ressaltou, "estão dando dinheiro para mais gente, mas a mesma quantidade de dinheiro." No fundo, muda pouco.

VAMOSSSS, Gastão (@gastaoelias)! Ponto do título no #CampinasATPChallenger 🇵🇹🏆

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Coisas que eu acho que acho

– A vida do promotor de torneio fica mais complicada. Além da exigência da hospedagem, o regulamento da ATP requer mais na parte médica (Challengers 70 e 80, por exemplo, serão obrigados a contar com dois fisioterapeutas aprovados pela ATP e um massagista), além de um seguro no valor de pelo menos US$ 500 mil. As massagens, aliás, devem ser pagas pelos próprios tenistas.

– Não sei se isso já foi amplamente divulgado (se foi, eu deixei passar), mas vale o registro: Challengers e ATPs não podem mais ter patrocínios/parcerias com sites de apostas. Os torneios que atualmente possuem contratos com empresas do tipo não poderão renová-los.

– A ITF publicou recentemente mais um vídeo explicando o Tour de Transição que entrará em vigor em 2019. Nele, fica claro que no ano que vem só contarão para o ranking da ATP os pontos conquistados nos ATPs, Challengers e a partir das semifinais dos Futures de US$ 25 mil+H. Os pontos conquistados nos torneios de US$ 15 mil e até as semifinais dos eventos de US$ 25 mil serão contarão apenas para o ranking da ITF. Este ranking da ITF vai servir para determinar a entrada de tenistas nos torneios de nível mais baixo. O video explica melhor e mostra, inclusive, como será feita a distribuição de pontos. Assista abaixo e entenda.

– Muitas consequências só ficarão claras na prática. Do "quem ganha jogo se mete onde quer que seja" que ouvi de Clezar, incluindo "tem que continuar jogando e ver durante o ano" de Romboli, até o "vamos ter que pagar pra ver" de Marcelino, só a prática vai mostrar onde a ATP acertou ou errou.

– Claro, mas claro mesmo, é que com o dólar forte fica difícil fazer torneio em qualquer país onde a moeda local não vale tanto. Não por acaso, o Brasil teve apenas dois Challengers em 2017 e só tem um evento do tipo (Campinas novamente) no calendário de 2018 até agora. E, como bem lembrou Marcelino, a Colômbia, que tinha mais de meia dúzia de Challengers (Bogotá, Medellín, Pereira, Bucaramanga, Cáli…) por ano, não terá nenhum em 2018.

– Minha impressão até agora, sem ver o resultado na prática? Os Challengers ficarão maiores e mais caros para os promotores e sem tanto aumento assim no retorno financeiro para os tenistas. Aguardemos para ver.

Sobre o autor

Alexandre Cossenza é bacharel em direito e largou os tribunais para abraçar o jornalismo. Passou por redações grandes, cobre tênis profissionalmente há oito anos e também escreve sobre futebol. Já bateu bola com Nadal e Federer e acredita que é possível apreciar ambos em medidas iguais.
Contato: ac@cossenza.org

Sobre o blog

Se é sobre tênis, aparece aqui. Entrevistas, análises, curiosidades, crônicas e críticas. Às vezes fiscal, às vezes corneta, dependendo do dia, do assunto e de quem lê. Sempre crítico e autêntico, doa a quem doer.