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Saque e Voleio

O nó tático de Nadal

Alexandre Cossenza

09/09/2017 02h16

O primeiro set da semifinal do US Open entre Rafael Nadal e Juan Martín del Potro foi tudo que todo mundo esperava. O espanhol insistindo em procurar o backhand do argentino, que sacava melhor e comandava os pontos quando conseguia usar a direita. E não só isso: assim como na partida anterior, contra Roger Federer, a esquerda de Del Potro esteve impecável e deu poucas chances ao adversário. Não por acaso, o atual número 28 do mundo fez 6/4, conquistando uma quebra solitária graças (não apenas) a uma bola que tocou na fita e deixou Nadal vendido.

Tudo mudou dois minutos depois, quando os tenistas voltaram do intervalo. O número 1 do mundo percebeu seu dilema. Enquanto ele buscava sempre o backhand do rival, Del Potro plantava de um lado da quadra, sempre bem posicionado e bastante à vontade para continuar a colocar a bola em jogo. Foi por isso que já no primeiro game da segunda parcial Nadal mudou. Começou a arriscar paralelas com seu forehand. A partir dali, Delpo precisou bater a direita na corrida. E não só isso: o argentino tinha de fazer algo de especial com seu melhor golpe. Caso contrário, Nadal voltava o rali para o outro lado da quadra, desgastando o argentino e tomando conta do jogo.

Sabe o tal do nó tático? Pois é. O que Nadal fez a partir da segunda parcial foi mostrar ao mundo como é executar à perfeição um plano B. Como sua zona de conforto (forehands cruzados) não estava funcionando, deixou-a no passado. Arriscou mais, agrediu mais, ganhou mais. Também ajudou o fato de Del Potro não acertar tantos primeiros saques, mas Nadal também se aproximou da linha de base e agrediu um bocado nas devoluções de segundo serviço.

Resumindo: depois de dois minutos, Nadal mudou a tática nas devoluções e nos ralis, reduzindo a eficiência do melhor golpe do adversário e impondo algo que sempre jogou a seu favor: o aspecto físico. Nadal é mais rápido para se defender e devolver bolas violentas e mais condicionado para os rigores de um jogo longo. Se Federer não conseguiu explorar um Del Potro que vinha de 3h35 e uma gripe contra Thiem, Nadal tirou vantagem do argentino que ficou mais 2h50 em quadra contra o suíço.

Foi como o velho plano de jogo de Ali contra Foreman (e que os tempos modernos nos trouxeram de volta em Mayweather x McGregor): deixou o oponente mostrar o que tinha de melhor. Viu, entendeu, aproveitou o cansaço do outro e passou por cima. E Nadal realmente atropelou. Em um momento, venceu nove games seguidos. Distribuiu winners de todos os lugares, deu passadas, aplicou curtinhas e usou todos os recursos. Nada deu errado naqueles pouco mais de 30 minutos.

Del Potro lutou, soltou sua feroz direita inúmeras vezes, mas não teve resposta à altura. Do segundo ao quarto set, o encontro durou 1h40, com o número 1 aplicando 6/0, 6/3 e 6/2. Inapelável. Indiscutível. Uma lição de planejamento, leitura e execução.

A matemática do ranking

Após a derrota de Federer, Nadal já sabia que sairia de Nova York como número 1 do mundo. Ele ampliou a vantagem ao bater Del Potro e vai aumentá-la para 1.960 pontos se superar Kevin Anderson na decisão.

Coisas que eu acho que acho

– Não dou como fato consumado o título de Nadal, embora pareça ser esse o consenso entre os apreciadores do esporte. Kevin Anderson oferece um tipo de ameaça bem diferente do que Nadal viu no US Open até agora. É de se esperar que o sul-africano ataque sempre e tente evitar dar ritmo ao espanhol no fundo de quadra. Se o saque estiver entrando, ele pode causar vários problemas para o número 1.

– O que Anderson faz não é muito diferente do jogo que Gilles Muller executou à perfeição para eliminar Nadal em Wimbledon. Caso consiga impor seu saque desde cedo, o sul-africano pode pressionar bastante o serviço do favorito. Nesse caso, o panorama fica bem interessante.

– Por outro lado, não dá para descartar que Anderson estará em sua primeira final de slam, e os nervos podem ser um fator determinante. Nesta sexta, o sul-africano demorou a se sentir à vontade contra Carreño Busta. Se isso se repetir, será fatal. Deixar Nadal à vontade uma melhor de cinco sets é cometer suicídio.

Sobre o autor

Alexandre Cossenza é bacharel em direito e largou os tribunais para abraçar o jornalismo. Passou por redações grandes, cobre tênis profissionalmente há oito anos e também escreve sobre futebol. Já bateu bola com Nadal e Federer e acredita que é possível apreciar ambos em medidas iguais.
Contato: ac@cossenza.org

Sobre o blog

Se é sobre tênis, aparece aqui. Entrevistas, análises, curiosidades, crônicas e críticas. Às vezes fiscal, às vezes corneta, dependendo do dia, do assunto e de quem lê. Sempre crítico e autêntico, doa a quem doer.