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RG, dia 4: luta de Rogerinho, chances perdidas de Bellucci, lágrimas de Johnson e o feito histórico de uma árabe

Alexandre Cossenza

31/05/2017 16h54

Não foi lá um dia de resultados que causassem grande espanto, mas a quarta-feira, 31 de maio de 2017, ficará marcada como o dia em que uma tenista árabe avançou à terceira rodada de simples em um slam pela primeira vez na história. Foi também o dia da 400ª vitória de Marcelo Melo nas duplas, das eliminações de Jo-Wilfried Tsonga e Dominika Cibulkova e do fim da linha para Thomaz Bellucci e Rogério Dutra Silva, números 1 e 2 do Brasil, que não podiam ter se despedido de formas mais contrastantes.

Se você quer emoção de verdade, este resumaço do dia também traz as imagens das lágrimas de Steve Johnson, que derrotou Borna Coric, e do forte abraço de Bethanie Mattek-Sands em Petra Kvitova, que também caiu. E vale ressaltar que o post de hoje também traz a interessante história de como Genie Bouchard conseguiu se recuperar fisicamente a tempo de jogar em Paris. Role a página e fique por dentro.

Emoção de Jonhson, fúria de Coric

A história de Steve Johnson neste Roland Garros é muito mais profunda do que duas vitórias na chave principal. Seu pai, Steve Sr., morreu no dia 11 de maio. A mãe, a irmã e o noivo da irmã planejavam há anos a viagem para a Europa em 2017. Tudo mudou de repente. Johnson decidiu voltar ao circuito em Genebra, na semana passada. Perdeu nas quartas. Agora, em Roland Garros, passou por dois obstáculos duríssimos. Cinco sets na primeira rodada contra Yuichi Sugita. Agora, mais quatro contra Borna Coric: 6/2, 7/6(8), 3/6 e 7/6(6). Um jogo nervoso, com reclamações de ambos e até dois set points de Coric no quarto set. Por pouco, o jogo não se alongou. Ao fim, ao ver seu forehand definir a partida, Johnson desabou em lágrimas. Coric, que esteve perto de forçar o quinto set e virar a partida, destruiu a raquete. O vídeo abaixo é comovente.

Johnson ainda concedeu uma entrevista para o Tennis Channel ao sair da quadra. É outra cena emocionante, na qual o tenista fala da falta que sente do pai e de como emocionalmente está num momento complicadíssimo.

O americano terá na terceira rodada um obstáculo ainda maior. Dominic Thiem, vice-campeão em Barcelona e Madri, campeão no Rio e bem cotado na lista de candidatos ao título. Nesta quarta, o top 10 austríaco dominou Simone Bolelli e fez 7/5, 6/1 e 6/3. Thiem, lembremos, é favorito para encontrar Goffin nas oitavas e Djokovic nas quartas.

#Marcelo400 e briga pelo número 1

Marcelo Melo foi o primeiro a vencer nesta quarta, e atingiu 400 triunfos na carreira. Ele e Lukasz Kubot bateram Jeremy Chardy e Julien Benneteau de virada: 3/6, 6/2 e 6/3. Desde o começo do segundo set, brasileiro e polonês estiveram no controle das ações. Na parcial decisiva, apenas um momento de tensão: um break point no saque do mineiro logo no segundo game. Melo sacou bem, a bola não voltou e a quebra foi evitada. Depois disso, ele e Kubot deslancharam. Cabeças de chave 4, eles agora vão enfrentar Ryan Harrison e Michael Venus na segunda rodada.

O mineiro agora só depende de seus próprios resultados para voltar à liderança do ranking. Depois das eliminações dos números 1, 2 e 3, Kontinen, Peers e Mahut, respectivamente, Melo será o líder se líder se alcançar a final em Roland Garros.

Os outros brasileiros

Rogerinho foi o primeiro simplista do país a entrar em quadra na segunda rodada e fez uma ótima apresentação, dada a enorme diferença de potência entre ele o canadense Milos Raonic. O paulista até saiu na frente, mas o favorito eventualmente encontrou uma maneira de se impor. Quando isso aconteceu, ficou bem difícil para Rogerinho, que até teve break points, mas não conseguiu mais quebrar o saque do canadense. O placar final mostrou 4/6, 6/2, 6/3 e 6/4. Cabeça de chave 5, o canadense segue como um azarão em Roland Garros e terá um perigoso Guillermo García-López pela frente na próxima rodada.

Thomaz Bellucci, em ação contra um tenista da casa na Chatrier, fez um excelente começo de jogo contra Lucas Pouille, mas vacilou na hora de fechar. Primeiro, perdeu o saque quanto tinha 5/3. Depois, cometeu dois erros nos três break points que teve quando o rival sacava em 5/6. No tie-break, abriu 5/4, mas errou uma devolução de segundo saque e mandou um forehand na fita. Pouille aproveitou e definiu a parcial com uma curtinha. Na prática, o jogo acabou ali. Bellucci só confirmou um saque no segundo set e, quando votou a vencer um game, já havia perdido oito em sequência. O brasileiro também pediu um atendimento médico no segundo set (para tratar um desconforto no glúteo esquerdo sentido durante a partida, segundo informou sua assessoria de imprensa), mas o jogo não mudou. Pouille triunfou por 7/6(5), 6/1 e 6/2.

Desde Wimbledon/2011, o número 1 do Brasil só passou uma vez da segunda rodada em torneios do grand slam. Isso aconteceu no US Open de 2015, quando Bellucci enfrentou o qualifier Yoshihito Nishioka, então #128 do mundo, na segunda rodada.

Com os dois jogando em horários próximos, fica até difícil evitar comparações. Não de nível de jogo, pontos ganhados, ou vitórias e derrotas, mas do jeito que cada um foi superado. Enquanto Bellucci pouco fez depois das chances perdidas do primeiro set, Rogerinho correu, gritou, caiu no chão, enfim… Tirou tudo que tinha para salvar seis break points no nono game do quarto set antes de finalmente sucumbir.

O último brasileiro a entrar em quadra no dia foi Marcelo Demoliner, que fazia sua estreia na chave de duplas ao lado do neozelandês Marcus Daniell. Os dois foram superados por Ivan Dodig e Marcel Granollers, cabeças 7 do evento: 6/4 e 6/4.

Os favoritos

Garbiñe Muguruza esteve a dois games da eliminação, perdendo por 7/6(4) e 4/4 para a agressiva estoniana Anett Kontaveit. A #53 do mundo teve até uma quebra de vantagem na primeira metade da segunda parcial, abriu 3/1 e, mais tarde, teve dois break points para sacar em 4/3. A espanhola, no entanto, jogou um tênis de alto nível quando a situação era mais tensa. Escapou no segundo set e manteve o serviço sem ceder um break point sequer na parcial decisiva. Quebras no sexto e no oitavo games deram o placar final: 6/7(4), 6/4 e 6/2.

A atual campeã de Roland Garros vai enfrentar na terceira rodada a cazaque Yulia Putintseva, que vem de vitória em três sets sobre Johanna Larsson. Muguruza segue como favorita em uma chave complicada.

Novak Djokovic voltou a vencer em três sets e sem drama. A vítima da vez foi o português João Sousa, que venceu oito games: 6/1, 6/4 e 6/3. O resultado mantém os 100% de Andre Agassi como treinador (adoro essa piada) e coloca o sérvio em uma terceira fase contra Diego Schwartzman, que bateu o italiano Stefano Napolitano em três sets. Se ainda não foi testado de fato, o sérvio pelo menos está mostrando consistência e fazendo o dever de casa sem se complicar. É sempre um bom sinal.

"No começo, eu fui bem melhor. Aí acabou o aquecimento", disse Robin Haase sobre o encontro com Rafael Nadal. O eneacampeão de Roland Garros não deu lá muitas chances para o holandês, o que já era esperado. O favorito ao título fez 6/1, 6/4 e 6/3 e passou adiante para enfrentar Nikoloz Basilashvili por um lugar nas oitavas de final. Haase, por sua vez, levou tudo com bom humor. Inclusive quando quase acertou uma bolada acidental no árbitro de cadeira (veja no vídeo acima, enquanto o vídeo abaixo mostra um ponto no melhor estilo massacrante do espanhol).

Pena que durou pouco

Petra Kvitova voltou e venceu na estreia, mas os seis meses de inatividade pesaram contra Bethanie Mattek-Sands, uma tenista que sobe à rede com frequência e exige precisão de seus adversários. A tcheca acabou derrotada pela americana em dois tie-breaks apertados: 7/6(5) e 7/6(5).

O clichê "o retorno de Kvitova já foi uma vitória" se aplica aqui mais do que nunca. Afinal, durante o assalto que sofreu, a bicampeã de Wimbledon teve todos os cinco dedos da mão esquerda lesionados (dos tiveram danos nos nervos). Segundo os médicos, sua chance de voltar a jogar tênis profissional não era das maiores.

De acordo com o cirurgião Radek Kebrle, que operou Kvitova, ela corria riscos cirúrgicos, riscos de infecção e de cicatrização da pele e risco da ruptura de tendões nas primeiras oito semanas de fisioterapia. Por sorte (e competência da equipe que tratou a tenista), nada deu errado. Ela começou a fisio no segundo dia após a operação e fez sessões duas vezes por dia já na primeira semana, movimentando todos os dedos.

Eliminada em Paris, Kvitova agora volta à rotina do circuito. Como ela mesma disse, o conto de fadas acabou, mas as próximas semanas serão de trabalhar como sempre. E essa "rotina", depois de tudo que aconteceu, deve ser saborosa para ela.

A cabeça que rolou com um feito histórico

Dominika Cibulkova, cabeça 6, chegou a Roland Garros pouco badalada. Lesionou o punho, desistiu de Stuttgart e fez só três jogos (perdeu dois) no saibro antes de Roland Garros. Logo, ninguém esperava que a eslovaca fosse muito longe no torneio. Só que também não era lá muito esperado um revés diante da tunisiana Ons Jabeur, atual #114. E foi exatamente isso que aconteceu. Jabeur fez 6/4 e 63 e se tornou a primeira mulher árabe na história a chegar a uma terceira rodada em um slam em simples.

A história de Jabeur é ainda mais improvável porque ela entrou na chave apenas como lucky loser (LL), graças à desistência da alemã Laura Siegemund, que se lesionou uma semana atrás. A última LL a ir tão longe em Paris foi Gloria Pizzichini, em 1996. Agora, a campeã juvenil de Roland Garros em 2011 (derrotou Monica Puig na final) vai encarar Timea Bacsinszky.

Até pela pouca expectativa gerada por Cibulkova, sua eliminação não traz grandes consequências para um quadrante forte que tem Muguruza, Mladenovic e Venus.

A recuperação de Bouchard

Genie Bouchard sofreu uma lesão de grau 2 no tornozelo enquanto treinava em Nuremberg, mas foi salva por seu preparador físico, o brasileiro Cassiano Costa. Foi ele, com amplo conhecimento de lesões desse tipo (jogou futebol profissional e participou da comissão técnica de times de futebol), quem decidiu qual linha de tratamento seguir – com o aval de Thomas Hogstedt, técnico da canadense.

Costa também telefonou para Maxwell (o jogador do PSG), pedindo indicação de médicos em Paris para um diagnóstico mais preciso. Um profissional do próprio PSG confirmou que o tratamento vinha seguindo a linha correta. Só depois é que o médico particular de Bouchard, que chegou em Paris só na sexta-feira, avaliou o quadro e viu que tudo indicado por Cassiano foi feito de forma correta.

Sem a atuação de Cassiano na corrida contra o tempo, é possível que Bouchard não tivesse disputado o torneio. Ela, aliás, estreou na terça-feira e superou em três sets a japonesa Risa Ozaki: 2/6, 6/3 e 6/2.

A cabeça que demorou, mas rolou

Depois dos momentos tensos e dramáticos que entraram pela noite parisiense na terça-feira, o jogo entre Jo-Wilfried Tsonga e Renzo Olivo teve apenas um game nesta quarta. O argentino quebrou e despachou o francês na primeira rodada: 7/5, 6/4, 6/7(6) e 6/4.

Como escrevi no resumaço de ontem, Tsonga vinha no embalo do título em Lyon, mas encontrou problemas para fazer seu jogo agressivo (35 erros não forçados nos dois primeiros sets). O argentino, #91 do mundo, triunfou em apenas sua quarta partida em um grand slam. Olivo agora vai enfrentar Kyle Edmund, com o vencedor encontrando Nick Kyrgios ou Kevin Anderson na terceira rodada.

Fiquemos de olho

Venus Williams venceu mais uma em sets diretos: 6/3 e 6/1 sobre Kurumi Nara. Surpresa nenhuma. Como não deve espantar ninguém se a americana seguir avançando, já que a chave lhe foi generosa. Ela encara Hogenkamp ou Mertens na terceira rodada e Bacsinszky ou Jabeur nas oitavas. Não é nada impossível imaginar a número 1 nas quartas, embora ela não vá tão longe em Paris desde 2006. Será?

Um nome interessante dá adeus, outro se apresenta. Kiki Bertens, bicampeã do WTA de Nuremberg e semifinalista de Roland Garros no ano passado, foi eliminada pela jovem CiCi Bellis, de 18 anos. A americana, atual #48, fez 6/3 e 7/6(5) e chega à terceira rodada em sua primeira participação no slam francês. É, aliás, seu primeiro slam fora dos EUA. Bellis jogou o US Open em 2014, como wild card, e novamente em 2016. Agora já iguala o resultado que obteve em Nova York, no ano passado, e fará um duelo interessantíssimo com Caroline Wozniacki, que passou pedalando pela qualifier canadense Françoise Abanda, atual #195: 6/0 e 6/0 em 52 minutos.

Outras duas candidatas que venceram nesta quarta foram Kristina Mladenovic e Svetlana Kuznetsova. Depois do susto na estreia, a francesa teve menos problemas para despachar Sara Errani (qualifier este ano) por 6/2 e 6/3. Kiki vai encarar Shelby Rogers por uma vaga nas oitavas, o que pode significar um duelo com Muguruza.
A russa, por sua vez, teve que jogar três sets contra a francesa Oceane Dodin numa quadra entupida de franceses barulhentos. Enquanto a tenista da casa curtia o momento, Sveta manteve a cara fechada e terminou vencedora por 7/6(5), 5/7 e 6/3.

Quem segue meio "esquecido" na chave masculina é David Goffin, o que é até justificável porque seu histórico contra tenistas da elite é bastante negativo. No entanto, o belga tem retrospecto favorável contra Thiem, que pode ser seu oponente nas oitavas. Pois nesta quarta Goffin bateu o Sergiy Stakhovsky por 6/2, 6/4, 3/6 e 6/3 e passou à terceira rodada. Ele também será favorito contra Horacio Zeballos para chegar ao aguardado confronto contra Dominic Thiem.

O ponto do dia

A escolha aqui é mais uma homenagem do que uma competição. É um ponto vencido com muita luta e uma direita kamikaze indefensável. Parece justo dizer que é um ponto que resume quem é Rogério Dutra Silva. Vejam!

Sobre o autor

Alexandre Cossenza é bacharel em direito e largou os tribunais para abraçar o jornalismo. Passou por redações grandes, cobre tênis profissionalmente há oito anos e também escreve sobre futebol. Já bateu bola com Nadal e Federer e acredita que é possível apreciar ambos em medidas iguais.
Contato: ac@cossenza.org

Sobre o blog

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