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Saque e Voleio

Obrigado, Ana, pelo sorriso

Alexandre Cossenza

29/12/2016 07h00

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Ana Ivanovic teve uma belíssima carreira. Jogou três finais e ganhou uma em torneios do Grand Slam, ficou 12 semanas como número 1 do mundo (uma a mais que Venus Williams), conquistou 15 títulos em torneios WTA e terminou três temporadas no top 5 do tênis feminino.

Os números já são invejáveis o bastante, mas talvez a maior contribuição de Ivanovic para o mundo do tênis tenha sido seu sorriso. Não digo literalmente. Não tem a ver com beleza. Ivanovic conseguia sorrir nas vitórias e nas derrotas. Sorria quando encontrava uma companheira/adversária de circuito. Sorria nas entrevistas, até nos momentos mais complicados. Sorriu até nesta quarta, segurando as lágrimas, quando anunciou sua aposentadoria.

A sérvia de 29 anos, atual #63 do mundo, era uma pessoa querida no vestiário. Provou que é possível vencer, ter uma grande carreira e, ainda assim, trocar piadas, se divertir com as rivais e fazer amizades. Mostrou que no tênis não há nada tão ruim que não possa ser superado. Um sorriso, no fim das contas, faz uma diferença gigante. E quem acompanhou a carreira de Ivanovic aprendeu isso.

Olhando agora, oito anos depois daquele título de Roland Garros que levou a sérvia ao topo do ranking, é fácil dizer que a carreira de Ivanovic, tenisticamente falando, deixou a desejar. Esperava-se mais. Talvez injustamente, mas a maioria do que se comentou sobre Ivanovic sempre teve um tom de "ela poderia mais". Poderia mesmo? Difícil dizer, mas também sempre tive essa impressão.

Lesões atrapalharam – e não foi pouco. Já em 2008, no auge da carreira, precisou ficar fora dos Jogos Olímpicos. Outras dores aqui e ali vieram ao longo dos últimos sete anos. Houve também um carrossel de técnicos de dar inveja a qualquer diretoria do futebol brasileiro. De fora e de longe, é difícil dizer o quanto essas mudanças todas atrapalharam. Parece certo, contudo, que não ajudaram.

Há quem diga que Ivanovic deveria ter se concentrado mais no tênis, o que costuma significar "ela ganharia mais se fizesse menos ensaios fotográficos". Taí outra crítica que nem sempre é justa. Sharapova e Serena têm dúzias de compromissos publicitários. Não significa que elas cheguem menos preparadas nos grandes torneios. O mesmo deveria valer para Ivanovic.

No fim das contas, foi dentro de quadra que a sérvia não encontrou o balanço ideal para vencer com mais consistência. Dona de uma direita fortíssima, mas de uma movimentação nada espetacular (compreensível para quem tem 1,84m de altura), Ivanovic nunca desenvolveu um backhand dominante ou atingiu a regularidade que precisava no seu serviço. Por isso, venceu menos do que poderia. Ainda assim, terminou 11 temporadas seguidas no top 25 (nove delas no top 20). Um feito para poucos, convenhamos.

Foi a hora certa de parar? Não existe fórmula nem regra para essas coisas. A carreira acaba quando a pessoa acredita que não tem o que acrescentar ao seu histórico. No caso de Ivanovic, ela mesma afirmou que não conseguiria jogar no nível que gostaria. Quando bate essa sensação, quem vai dizer que a pessoa está precipitada?

O que é certo – certo mesmo – é que o mundo vai sentir falta das direitas indefensáveis, dos gritos de "ajde" com punho cerrado que vinham com aquela meia pirueta, das coletivas em que ela desandava a falar sem parar, das partidas malucas cheias de altos e baixos e, claro, do sorriso. Porque, no fim das contas, tênis é só um jogo. Simpatia é mais do que um aceno e um sorriso pra galera depois de uma vitória. Otimismo é mais do que um "agora é olhar pra frente e pensar na próxima partida" numa coletiva. E respeito é mais do que um aperto de mãos junto à rede.

Obrigado, Ana, por tudo, mas especialmente pelo sorriso.

Coisas que eu acho que acho:

– Em 2008, pouco antes do título em Roland Garros, Ivanovic deu uma entrevista para o Globoesporte.com, onde eu trabalhava na época. Foi uma daquelas entrevistas impessoais, por email, mas com respostas interessantes. Desde aquele dia, recebo cartões de Boas Festas autografados por ela. Um deles chegou em fevereiro uma vez (valeu, Correios – #IssoÉEntrega). Um gesto pequeno, certamente administrado pela agência que gerencia sua carreira, mas que tem tudo a ver com Ivanovic e seu respeito por fãs e jornalistas.

Sobre o autor

Alexandre Cossenza é bacharel em direito e largou os tribunais para abraçar o jornalismo. Passou por redações grandes, cobre tênis profissionalmente há oito anos e também escreve sobre futebol. Já bateu bola com Nadal e Federer e acredita que é possível apreciar ambos em medidas iguais.
Contato: ac@cossenza.org

Sobre o blog

Se é sobre tênis, aparece aqui. Entrevistas, análises, curiosidades, crônicas e críticas. Às vezes fiscal, às vezes corneta, dependendo do dia, do assunto e de quem lê. Sempre crítico e autêntico, doa a quem doer.