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Saque e Voleio

A dívida da Davis e a lição de Del Potro

Alexandre Cossenza

28/11/2016 08h00

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Vilas, Clerc, Frana, Jaite, Lobo, Nalbandian, Chela, Cañas, Calleri, Gaudio, Gumy, Puerta, Squillari, Zabaleta… A ilustre lista é longa, e era difícil entender como um país que fabricou tantos tenistas nunca venceu a Copa Davis. Era. A turma do capitão Daniel Orsanic, liderada por Juan Martín del Potro e com competentes coadjuvantes como Leo Mayer, Juan Mónaco, Federico Delbonis, Guido Pella, Carlos Berlocq e Renzo Olivo, bateu a Croácia em Zagreb e conquistou o título, cobrando uma antiquíssima dívida. Sim, era a Copa Davis que devia isso à Argentina, e não o contrário.

Foi a quinta final argentina na Davis e estava longe de ser a melhor chance de título. Em 2008, em Mar del Plata, o time de Nalbandian e Del Potro era favorito contra a Espanha, que viajou desfalcada de Rafael Nadal. Nalbandian atropelou David Ferrer no primeiro jogo, mas Delpo sofreu uma lesão na segunda partida, deixando o (brigado) time dependendo de José Acasuso para forçar o quinto jogo. Não deu. A chance terminou na raquete de Fernando Verdasco, que venceu um jogo nervoso e ruim para dar mais um título aos espanhóis.

Na época, Nalbandian jogou boa parte da culpa nos ombros de Del Potro. O jovem não teria se poupado devidamente para a final da Davis. Talvez Delpo tenha carregado aquela culpa até este ano. Talvez não. Talvez ele apenas guarde mágoa de Nalbandian. Ou nem isso. Difícil saber. O que era impossível mesmo de saber é que Del Potro, depois de tantas lesões nos dois punhos, voltaria à Copa Davis desta maneira.

Em certo momento, o campeão do US Open de 2009 parecia mais um ex-tenista tentando lidar com uma lesão sem solução do que um top 10 que voltaria a brigar com os melhores do circuito. O que aconteceu, no entanto, foi menos Gustavo Kuerten (aposentado por uma lesão no quadril) e mais Rafa Nadal (número 1 do mundo em 2013 depois de ficar afastado por boa parte de 2012).

Em 2016, Del Potro viveu o melhor ano de sua carreira – como ele mesmo afirmou diversas vezes, em várias ocasiões. Derrotou Wawrinka em Wimbledon; bateu Djokovic e Nadal nos Jogos Olímpicos; passou por Ferrer e Thiem no US Open; conquistou um título em Estocolmo; superou Murray nas semifinais da Copa Davis; e completou a temporada com uma virada memorável sobre Marin Cilic, que vencia por 2 sets a 0 e jogava em casa. Esta gloriosa timeline lista tudo.

Mais do que tudo isso, Del Potro deixou a todos uma gigante lição. Mesmo nos momentos mais duros, jamais deixou de acreditar. Sofreu, encheu-se de esperança e sofreu outra vez. Tentou voltar, não conseguiu. Tentou de novo. Falhou novamente. Ralou. Começou do zero. Insistiu. Batalhou. E, finalmente, voltou. E que ninguém ouse duvidar dele daqui em diante.

Coisas que eu acho que acho:

– A Argentina foi campeã como time. Por mais importantes que tenham sido as vitórias de Del Potro sobre Murray nas semifinais e Cilic na final, foram Leo Mayer e Federico Delbonis que venceram os jogos decisivos nesses dois confrontos. Não dá para falar nesta Davis sem mencionar o enorme valor dos coadjuvantes argentinos, impecáveis nos momentos mais importantes.

– O mesmo vale para o capitão argentino, Daniel Orsanic. Um cidadão educadíssimo, que olha na cara, fala o que pensa e escala os melhores. Orsanic não foi contratado para repetir o discurso da federação argentina nem para tentar justificar escolhas patéticas de seus superiores. Assumiu o cargo com uma postura apaziguadora, deixou critérios claros e convocou sempre os melhores. O resultado está aí para todo mundo ver. Não é tão difícil assim.

Sobre o autor

Alexandre Cossenza é bacharel em direito e largou os tribunais para abraçar o jornalismo. Passou por redações grandes, cobre tênis profissionalmente há oito anos e também escreve sobre futebol. Já bateu bola com Nadal e Federer e acredita que é possível apreciar ambos em medidas iguais.
Contato: ac@cossenza.org

Sobre o blog

Se é sobre tênis, aparece aqui. Entrevistas, análises, curiosidades, crônicas e críticas. Às vezes fiscal, às vezes corneta, dependendo do dia, do assunto e de quem lê. Sempre crítico e autêntico, doa a quem doer.