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Teliana e a confiança inabalada mesmo fora do top 200: 'Sei como funciona'

Alexandre Cossenza

16/11/2016 08h39

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Se 2016 não foi o ano dos sonhos de Roger Federer nem de Rafael Nadal, tente se imaginar no lugar de Teliana Pereira. A pernambucana começou o ano no 46º lugar do ranking mundial e ocupa hoje a 206ª posição. De janeiro até agora, amargou duas longas sequências de derrotas (seis, de janeiro a março; e oito, de julho até setembro), perdeu o posto de número 1 do Brasil e precisará voltar a torneios menores e qualifyings.

A cabeça cansou, e Teliana encerrou a temporada em setembro, mas engana-se quem pensa que ela ficou abatida. É óbvio que houve momentos de dúvida e falta de confiança, mas não ficou mágoa nem arrependimento. Em conversa por telefone, a pernambucana se mostrou consciente das dificuldades que enfrentou, das limitações de seu jogo e seu corpo e, principalmente, do que precisa fazer para voltar ao top 100 – seu grande objetivo para 2017.

Sempre otimista, Teliana também lembrou de ótimos momentos que viveu em 2016 e da confiança que tem em si mesma para alcançar suas metas: "Já estive lá, sei como funciona."

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Foi um ano em que as coisas não saíram como você esperava. Vamos começar com o momento em que você decidiu encerrar a temporada…

Eu não tive os resultados que eu esperava. É claro que eu sabia que ia ser difícil porque eu só joguei os grandes torneios. Eu sabia que só ia ter jogo duro pela frente, mas achei que ia ter resultados melhores. Depois de Biarritz, que foi meu último torneio, eu ainda tinha alguns eventos para jogar, mas preferi parar porque mentalmente eu estava muito cansada. Não é fácil. Eu não acho que estava jogando mal. Eu estava bem até, estava treinando bem, só que os resultados não estavam aparecendo. Você sempre quer jogar bem, mas o resultado também conta. Mentalmente, eu já estava me sentindo bem cansada, então eu preferi parar, ter um descanso maior. Já estava planejado. Ficou um pouquinho maior do que a gente esperava, mas eu estava precisando desse tempo para descansar, colocar as ideias no lugar e começar tudo de novo. As pessoas falam muito como se fosse algo terrível, e não foi porque eu joguei todos os maiores torneios. Toda tenista quer jogar, e eu consegui. Praticamente só joguei com meninas de alto nível. Se for falar em resultados, foi muito ruim, mas se for falar em torneios, só foram torneios de alto nível.

Mas nesse momento que você tomou a decisão de encerrar o ano, a sensação era mais de alívio, frustração, raiva ou o quê?

A primeira sensação foi a de que eu estaria descansando. Eu estava querendo já há muito tempo. É claro que tinha momentos que eu pensava "nossa!" porque os resultados não estavam saindo como eu queria. Claro que teve, mas eu estava muito certa de que o que eu estava fazendo era correto. Parar, descansar a cabeça, descansar o corpo. Foi uma sensação de "agora eu vou descansar" (risos).

Foi o ano que você menos jogou ITFs recentemente…

Exatamente! A gente apostou. A gente sabia que era um risco. Nesses torneios, só tem jogo duro. Arriscamos um pouco mais e… (pausa para pensar)… não deu muito certo (risos). Na verdade, é difícil falar assim, sabe?

Falar depois que acontece é mais fácil, né?

É. Mas eu só joguei com meninas de alto nível, joguei bem e simplesmente não estava acontecendo. Não estava fluindo muito bem. Eu comecei a perder um pouco a confiança porque, querendo ou não, a confiança vem de vitórias. Como eu não tive vitórias este ano, comecei a não ter tanta confiança na quadra. Aí a cabeça começa a baixar um pouco, começa a sentir mais, então foi isso. No final, eu fui jogar os torneios menores, os ITFs, mas a minha cabeça já não tava ali mais, entendeu? Fica um pouco mais difícil de voltar.

É uma bola de neve…

Com certeza.

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Ano passado, ainda no primeiro semestre, você jogou uma sequência de ITFs em Campinas, Curitiba, Medellín, começou a ganhar ali e quando voltou para os WTAs, ganhou Bogotá, furou quali em Marrocos e Roland Garros e a coisa fluiu bem melhor.

Com certeza.

Você se arrepende de não ter feito a mesma coisa este ano ou você não pensa assim porque agora é tarde?

Não, não, não penso nisso. Acho que a programação que eu fiz foi a programação certa. A gente tinha planejado e era o que tinha que ser feito. Não acho que foi erro de calendário. A gente não optou por torneios errados. Muito pelo contrário. Foram torneios certos, só que não tive os resultados que eu queria. Não tenho arrependimento nenhum. Faz parte, na verdade. O tenista tem altos e baixos, e este ano foi baixo. Mas ano que vem vai ser alto! (risos)

Quando você faz um calendário assim, a margem pra erro é bem menor. Você pode pegar três top 10 em semanas seguidas, e não tem pra onde correr.

É complicado. Vai jogar Madri e Roma, você pega duas top 10. Aí na outra semana, você não pega uma top 10, mas pega uma menina que faz o jogo da vida dela. É arriscado, sabe? Mas eu senti que tinha nível pra isso.

E qual foi o momento mais difícil dessa sequência? Qual foi o dia mais duro? Alguma derrota específica ou um momento maior de desânimo?

Eu fiquei bem decepcionada quando eu perdi em Wimbledon porque o jogo estava muito na minha mão [Teliana abriu 7/5 e 4/1 sobre a americana Varvara Lepchenko, mas acabou perdendo por 5/7, 7/6(3) e 6/2]. Este ano, eu estava treinando bem. O jogo estava na minha mão, e tudo saiu do controle. Na grama, é complicado. É um momentozinho que você relaxa a atenção, e o jogo vai embora. Ali foi o momento que eu fiquei mais decepcionada. No Rio Open, eu também senti um pouquinho, apesar de ser o começo da temporada. Eu vinha treinando super bem, estava com boas expectativas, e não joguei, mas a menina fez um belo jogo [Petra Martic venceu por 6/3 e 7/5]. Mas houve momentos ótimos também!

Essa era minha próxima pergunta!

Aaaah, foram momentos maravilhosos! Em Roland Garros, eu tive um jogo duríssimo na primeira rodada…

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(interrompendo) Eu ia chegar aí: o melhor foi ganhar da (Kristyna) Pliskova ou jogar contra a Serena?

(risos) O melhor momento foi jogar as Olimpíadas, pra ser bem sincera! (mais risos).

Mesmo?

Ah, sim. Com certeza. Pra mim, foi o momento mais mágico! Mas jogar com a Serena em Roland Garros, na Suzanne Lenglen, tem seu lado bom também. Mas foram dois momentos mágicos, muito bons, que me emocionaram bastante. Jogar contra ela é uma história, né? Você pode guardar no seu livrinho pra contar isso para todo mundo pelo resto da minha vida (risos). Mas houve momentos bons. Não dá para focar só nos momentos ruins.

Mas eu perguntei da Serena e acabei te interrompendo… Você estava falando da vitória contra a Pliskova. Aquele foi um jogão também, né?

Foi um jogão! O jogo em si teve muitos altos e baixos, tanto meus quanto dela, mas tinha muita gente vendo o jogo. O clima ficou muito bom e eu sabia que ia jogar contra a Serena depois, então… Porque eu não olho a chave, né? Eu vou jogo por jogo.

Ah, mentira. Você olha, vai… (brincando)

Não olho! Eu não olho a chave! Às vezes, tem uns repórteres, sabe (provocando em tom de brincadeira), que soltam sem querer e eu fico brava (risos de ambos)!!! Por isso que eu não gosto muito de dar entrevista durante o torneio porque às vezes eles falam, e eu odeio saber a chave. Não gosto, eu não olho! Agora, no último torneio, na França, foi difícil porque eu estava sozinha e eu tinha que ver contra quem eu jogava, mas eu não queria olhar a chave. Foi bem complicado (risos). Mas em Roland Garros, o Renato [Pereira, irmão e técnico] me falou porque… Poxa, é legal. Ele me falou antes e eu disse "nossa!". Entrei na quadra [contra a Pliskova] pensando que precisava daquela vitória "sim ou sim". E foi exatamente isso que me fez ganhar, tenho certeza. Foi muito tenso o jogo. No terceiro set, eu pensava "eu vou dar mais e mais" porque jogar contra a Serena em Roland Garros é mágico, e eu queria muito passar por essa experiência [Teliana venceu por 7/5, 3/6 e 9/7].

Fisicamente, como você está? E seu joelho? Acho que sempre te pergunto isso, mas sempre existe essa preocupação.

Nossa, meu joelho foi muito bem este ano. Não tem nem do que reclamar. Eu sofri um pouquinho no começo da temporada com bastante dor no cotovelo. Isso me atrapalhou bastante até Roland Garros. É que meu joelho é muito de altos e baixos. Eu posso estar falando pra você "meu joelho tá bom", aí amanhã ele acorda ruim. É assim que funciona.

É assim mesmo, essa loucura, de um dia para o outro?

É, de um dia para o outro. Não tem padrão, sabe? É claro que se eu estiver com a musculatura boa, não posso engordar, isso ajuda bastante. Mas já teve dias que eu treinei super bem, saí sem dor, aí no dia seguinte acordei com ele não tão legal. Mas já melhorou bastante.

E o que você pensa para 2017? A gente fala de você há bastante tempo, mas você tem só 28 anos ainda. Não dá pra te chamar de veterana…

Pois é, não sou tão velha assim (risos). Ah, mas acho assim… Claro que vou ter que jogar o quali do Aberto da Austrália e tal. Muda em relação a isso. Não vou poder estar jogando logo de cara os grandes torneios. Vou ter que jogar quali, mas já passei por isso e é normal, sabe? O que as pessoas não entendem é que é normal ter essa queda. Então vou entrar muito tranquila. Já passei por isso, não é algo super novo pra mim. Vou estar no quali da Austrália. É claro que preferia estar na chave, mas é pauleira, é legal. Com certeza, vou jogar torneios menores, mas vou entrar confiante. Estou fazendo uma bela pré-temporada. Comecei antes porque também parei antes. Agora… Vou começar super positiva. É que as pessoas se baseiam muito no ranking. Claro que eu queria estar entre as 100 melhores. É óbvio. Mas não estou numa situação tão difícil. Faz parte. Estou preparada para isso.

A minha impressão é que a WTA é bem mais equilibrada que a ATP nesse nível, fora do top 20, 30. Você vê até a Sorana Cirstea, que foi 21 do mundo, caiu pra fora das 200 e agora está entre as 100 de novo…

É, é que tudo pode mudar muito rápido. Ano passado, eu era 150 e alguma coisa, aí deu três, quatro meses, eu estava no top 100 já. Ganhei Bogotá, depois ganhei Florianópolis, sabe? É tudo muito rápido. Tem que estar preparado para quando o momento chegar, você conseguir. Então vou estar preparada e não duvido. Posso voltar a ganhar grandes torneios, posso voltar rapidamente a estar entre as 100 melhores. Eu já estive lá, sei como funciona.

Você voltou a treinar quando?

Estou na segunda semana [de pré-temporada]. Essas primeiras duas, três semanas são bastante focadas na parte física, menos na quadra, até para o corpo ir assimilando tudo de novo. Semana que vem já começo a fazer um pouco mais de quadra e menos de físico. Conforme vai passando o tempo, vou começar a diminuir o físico e focar mais na quadra.

E, tecnicamente falando, qual sua prioridade neste momento?

Estou trabalhando bastante o saque, que é algo que eu sempre falo. Eu acho que preciso melhorar bastante, então estou fazendo alguns ajustes que a gente acredita que vão dar uma boa diferença. É claro que tem que melhorar tudo, mas a gente está treinando já na quadra rápida. Antes, a gente começava a pré-temporada no saibro e depois passava para a rápida – pelos incômodos físicos que eu tinha. Hoje, já não tenho mais isso com o joelho. Não sinto mais esse incômodo na quadra rápida. É claro que eu me sinto muito melhor, é só ver meus resultados – tudo no saibro – mas eu queria muito ano que vem jogar bem na quadra rápida também pra não ficar dependendo do saibro. É o que eu mais tenho que melhorar e isso inclui tudo. Sacar melhor, devolver melhor, ser mais agressiva, me mexer melhor em quadra porque é diferente você correr no saibro e você correr na quadra rápida. É difícil falar uma coisa. É um ajuste total. Mas se falar da parte técnica, o que estou ajustando mais é o saque.

Pra terminar, o quanto esse fim de apoio dos Correios à CBT te afeta? Porque esses contratos foram encerrados antes da hora, e isso pegou todo mundo de surpresa…

Vou ser bem sincera, não estou muito por dentro do que está acontecendo. Gosto mais de deixar essa parte para o Márcio [Torres, empresário] e para o Alexandre [Zornig]. Eles que estão cuidando disso para que eu não tenha essa preocupação. Acho uma pena pelo tênis brasileiro, mas a gente precisa ver que foi feito um bom trabalho. Não tenho do que reclamar. Eu pude jogar, pude fazer meu calendário sem pensar na parte financeira. Isso é muito importante e faz uma diferença bem grande. Mas é isso, eu não estou muito por dentro. O Márcio cuida dessa parte de patrocínios, aí ele fala com o Alexandre. Quando chega em mim, chega já encaminhado e tranquilo, entendeu? Pra eu não ter que esquentar a cabeça. O tênis já é um esporte que exige tanto da parte mental… Se ficar querendo cuidar de tudo, não dá certo.

Sobre o autor

Alexandre Cossenza é bacharel em direito e largou os tribunais para abraçar o jornalismo. Passou por redações grandes, cobre tênis profissionalmente há oito anos e também escreve sobre futebol. Já bateu bola com Nadal e Federer e acredita que é possível apreciar ambos em medidas iguais.
Contato: ac@cossenza.org

Sobre o blog

Se é sobre tênis, aparece aqui. Entrevistas, análises, curiosidades, crônicas e críticas. Às vezes fiscal, às vezes corneta, dependendo do dia, do assunto e de quem lê. Sempre crítico e autêntico, doa a quem doer.