Conversas curiosas e inconclusivas, parte II
No bar de um famoso clube, tenistas amadores discutiam os méritos de Gustavo Kuerten até que o assunto "Roger Federer como melhor de todos os tempos" veio à tona. O diálogo entre os amigos identificados aqui como Catê Imoso e Jessé Tico começou no post da semana passada e continua a seguir…
Catê: Qual o problema agora?
Jessé: O mesmo de sempre.
C: Não entendi.
J: Sua necessidade de usar "melhor de todos os tempos" nas frases.
C: Você não acha que Federer é o melhor da história?
J: Eu não disse isso.
C: Você não disse nada.
J: É verdade (risos sonsos).
C: Então quem você acha que é o melhor?
J: Ninguém.
C: Como assim?
J: Não dá para estabelecer, não dá para comparar.
C: Mas os números do Federer são imbatíveis!
J: Será? Você realmente acha isso?
C: Ele ganhou 17 Slams, mais do que qualquer outro.
J: É verdade, mas quantos Grand Slams de fato ele completou?
C: Ele ganhou três Slams no mesmo ano algumas vezes.
J: Pois é. Rod Laver fechou o Slam duas vezes. Ganhou os quatro em 1962 e 1969.
C: Mas Laver nem chegou perto de ganhar 17 Slams!
J: Verdade, ele ganhou 11, mas ficou cinco anos proibido de jogar Slams porque se profissionalizou. Imagina quantos Slams ele teria vencido nesses cinco anos!
J: Verdade, estou. A gente nunca vai saber. Mas o que quero dizer é que esse número de 17 Slams não prova essa supremacia absoluta que você prega. E tem a questão da porcentagem, que…
C: (interrompendo) Que porcentagem?
J: (pesquisando no celular) Federer ganhou 17 Slams, mas jogou 66, o que dá um aproveitamento de 25,7%
C: Ou seja, a cada quatro Slams disputados, ele ganhou um! Isso é espetacular.
J: Sim, mas Nadal, por exemplo…
C: (interrompendo outra vez) Isso aí é baloeiro, rapaz! Maratonista empurrador de bola! Jogo feio.
J: Bom eu discordo da sua avaliação sobre o jogo dele, mas eu ia citar um número só.
C: Que número?
J: Nadal ganhou 14 Slams em 43 disputados. Ou seja, 32,5% de aproveitamento. É um número bem maior que o do Federer.
C: Federer não tem culpa se esse baloeiro vive machucado.
J: É verdade, mas eu não menosprezaria tanto Nadal se fosse você.
C: Por quê?
J: Porque isso não ajuda seu argumento.
C: Meu argumento é que Federer é o melhor da história. Nadal nem chega perto.
J: Tudo bem, mas faz sentido dizer que o melhor tenista da história jogou 34 vezes e perdeu 23 para um baloeiro, maratonista e empurrador de bola?
C: Mas a maioria desses jogos foi no saibro.
J: É verdade, mas repito. Abre aspas, o melhor da história, fecha aspas, pode perder tanto para um baloeiro-maratonista-empurrador-de-bola? Não sei. Acho que seu argumento se perde aí.
C: Tudo bem, eu admito, Nadal é um bom tenista.
J: E tem a questão do indoor, né?
C: Como assim? Federer atropela ele no indoor.
J: Justamente por isso. Se você descontar o saibro, que é a melhor condição para Nadal, e o indoor, que é a melhor condição para Federer, como fica essa conta?
C: Não sei. Quanto?
J: Deixa ver no Google (abrindo o celular)… 9 a 4!
C: Você está querendo dizer que Nadal é melhor que Federer?
J: Não.
C: Então o que quer com esses números?
J: Te mostrar que os números também podem jogar contra seu argumento de "melhor da história". E tem outra pergunta que não quer calar, né?
C: Hum. Qual?
J: O melhor da história pode ter retrospecto tão negativo contra um rival de sua geração?
C: Mas Nadal é muito mais novo que ele. Não é a mesma geração!
J: Você está querendo dizer que dois caras que se enfrentam todos os anos há 12 anos não estão na mesma geração?
C: É que Nadal leva vantagem por ser mais novo e ter mais perna.
J: Esse também é um argumento discutível e derrubável.
C: Por quê?
J: Porque Nadal tinha 17 anos e pouquíssima experiência quando enfrentou Federer pela primeira vez. O suíço, inclusive, já era número 1 do mundo e campeão de Slam. Estava no auge, voando, e já perdia do espanhol.
C: Não entendi aonde você quer chegar.
J: Simples. A idade, que você argumenta, deveria pesar a favor de Federer quando Nadal ainda estava se desenvolvendo no circuito. Mesmo assim, Nadal sempre teve vantagem nos confrontos diretos. Desde aquela época.
C: Eu discordo de você.
J: Tudo bem. Eu não disse que é a verdade absoluta. Só disse que seu argumento era questionável. É questão de opinião mesmo. E olhe que nem citei Djokovic…
C: O que tem Djokovic?
J: É um ano mais novo que Nadal. Penou contra Federer nos primeiros ano da carreira. Ou seja, a experiência do suíço pesava contra o sérvio. E olha o retrospecto dos dois hoje em dia…
C: Estão empatados!
J: Pois é. Volto àquela linha de raciocínio: alguém pode ser o melhor da história quando não tem vantagem nos confrontos diretos nem contra os caras da geração dele?
C: Mas Djokovic não é da geração dele!
J: São quase seis anos de diferença entre eles, mas foram 44 jogos em dez anos. Não sei se é justo dizer que eles são de gerações diferentes.
C: Mas a diferença de idade é enorme.
J: É, mas a gente já discutiu isso, né? Se Federer continua fazendo final de Slam contra Djokovic até hoje, a gente não pode colocar os dois em gerações diferentes.
C: Mas isso só acontece porque Federer é um fenômeno e continua jogando um tênis espetacular aos 34 anos.
J: Nisso eu concordo.
C: Ufa, concordamos em algo!
J: Concordamos! Só que ainda não cheguei no dilema Djokovic.
C: Calma, vamos ali jogar um setzinho antes?
J: Vamos!
(continua em um post futuro)
Sobre o autor
Contato: ac@cossenza.org
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.