Topo

Saque e Voleio

Sharapova, Nadal e o intangível

Alexandre Cossenza

21/01/2015 13h48

São mais ou menos 3.500 nomes nos rankings de ATP e WTA. Some a esse povo um bocado de gente que nunca pontuou e chegamos a umas quatro mil almas tentando ganhar a vida com o tênis. Só que destas quatro mil pessoas, só um punhadinho, daqueles de contar nos dedos de uma das mãos, conseguiria sair de buracos como Maria Sharapova e Rafael Nadal fizeram nesta quarta-feira em Melbourne. Ela com uma impressionante capacidade de, no momento mais crítico de um jogo, ajustar seu modo de pensar e salvar dois match points. Ele com uma força de vontade rambônica para lutar contra seu próprio corpo. Porque grandes atletas, quando desafiados, aparecem com esse tal de intangível.

Sharapova_AO15_2r_get_blog

Sharapova d. Panova – 6/1, 4/6 e 7/5

Parecia uma vitória banal, daquelas muitas que a gente nem lembra um mês depois. Maria Sharapova abriu a partida fazendo 6/1 sobre a número 150 do mundo. Só que aí veio o segundo set e, com ele, 23 erros não forçados da vice-líder do ranking. Panova, que se alternava entre atacar e esperar por falhas da rival, abriu 5/2 e ainda perdeu um serviço antes de fechar em 6/4.

Ainda parecia uma zebra improvável. Não por acaso, Sharapova tem um histórico espetacular em terceiros sets. Mas eis que a favorita permitiu à desafiante abrir 4/1, com duas quebras de vantagem. Panova perdeu um serviço, mas confirmou o seguinte e abriu 5/3. Quando sacou em 5/4, parou de atacar. Resumiu-se a esperar erros de Sharapova. Vieram três deles. Match point. Parálise por análise? Nada disso. Sharapova funciona ao contrário.

"Minha maneira de pensar durante a partida, até aquele ponto, foi muito negativa. Acho que estava pensando demais nos erros, no que estava fazendo de errado. Eu não estava no presente, algo que normalmente faço bem. Naquele ponto, quando você está atrás e sente que está errando muito, que não encontra um bom ritmo, só tentei jogar um ponto de cada vez, pensar positivo e mudar minha maneira de pensar um pouco. Quando outras coisas não dão certo, talvez o lado mental ajude. Acho que, no fim, foi o que fiz", disse Sharapova na coletiva após o jogo.

E foi isso. Sharapova salvou-se do primeiro match com um winner de devolução. Depois de outro erro, escapou de novo match point com outra bola vencedora. Quebrou o saque. O placar, naquele momento, mostrava 5/5, mas a Rod Laver, Panova e o mundo sabiam como acabaria.

Nadal_AO15_2r_get_blog

Nadal d. Smyczek – 6/2, 3/6, 6/7(2), 6/3 e 7/5

Fast forward para a rodada noturna, com Rafael Nadal encontrando problemas com a umidade de Melbourne. Depois de uma hora de jogo, o número 3 do mundo não era o mesmo. Mostrou-se fraco, sentiu tontura, perdeu dois sets para o americano Tim Smyczek, número 112 do mundo, e quase vomitou.

"Eu me senti muito cansado. No fim do primeiro set, senti meu corpo muito mal, muito cansado. Fiquei muito preocupado. Então, quando saquei para o terceiro set, quase vomitei. Sofri muito na quadra por três horas e meia. Sofri muito. A partida de hoje não foi divertida", analisou.

Mas, de algum modo, encontrou um jeito de continuar no jogo. Quebrou o adversário, fechou o quarto set e esticou a partida. Sacou atrás em todo o quinto set. Resistiu bravamente. Depois do jogo, deu os parabéns pelo fair play de Smyczek e disse que esteve perto de abandonar. Com as tonturas, temeu perder o equilíbrio e desmaiar em quadra. Mas segue vivo.

Coisas que eu acho que acho:

– A lista de inusitados do dia também teve o misterioso caso da dormência em um dos dedos de Roger Federer. O problema não foi grave, e o suíço, que pediu atendimento médico depois do primeiro set, virou a partida contra o italiano Simone Bolelli: 3/6, 6/2, 6/2 e 6/2.

– Entre os resultados mais interessantes dia estão as vitórias dos australianos Bernard Tomic e Nick Kyrgios. Tomic bateu o o cabeça 22, Philipp Kohlschreiber, por 6/7(5), 6/4, 7/6(6) e 7/6(5), enquanto Kyrgios, que levou 40 aces de Ivo Karlovic, triunfou por 7/6(4), 6/4, 5/7 e 6/4.

– Outro nome a observar (escrevi isso no guiazão uns dias atrás) é o Viktor Troicki, que derotou o argentino Leonardo Mayer por 6/4, 4/6, 6/4 e 6/0. O sérvio agora vai enfrentar o tcheco Tomas Berdych. Promessa de jogo interessante.

Sobre o autor

Alexandre Cossenza é bacharel em direito e largou os tribunais para abraçar o jornalismo. Passou por redações grandes, cobre tênis profissionalmente há oito anos e também escreve sobre futebol. Já bateu bola com Nadal e Federer e acredita que é possível apreciar ambos em medidas iguais.
Contato: ac@cossenza.org

Sobre o blog

Se é sobre tênis, aparece aqui. Entrevistas, análises, curiosidades, crônicas e críticas. Às vezes fiscal, às vezes corneta, dependendo do dia, do assunto e de quem lê. Sempre crítico e autêntico, doa a quem doer.