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Bellucci: "Algumas necessidades não foram preenchidas"

Alexandre Cossenza

04/12/2014 11h26

Depois de abrir a temporada na 125ª posição do ranking mundial e fechar 2014 no 65º posto, Thomaz Bellucci ficou sem técnico. O espanhol Francisco Clavet, com quem trabalhou desde outubro de 2013, pediu o fim da parceria. Restou ao número 1 do Brasil ir em busca de outro treinador. Nesta quarta-feira, pouco antes da coletiva de anúncio do Rio Open, o paulista de 26 anos bateu um papo comigo sobre o processo, que já está em andamento. Sem revelar com quem já vem conversando, mencionou as dificuldades impostas pela distância ao trabalhar com um técnico europeu e disse que "algumas necessidades não foram preenchidas". Ainda assim, ressaltou que veio do espanhol a iniciativa de terminar a relação.

Bellucci também disse que tem necessidades diferentes das de quatro anos atrás e afirmou que hoje em dia, há mais profissionais dentro do Brasil capazes de atuar ao lado de um tenista de alto nível. No fim, o número 1 do país também falou sobre o quão diferente é, no aspecto mental, começar uma temporada com um ranking que lhe permite evitar os qualifyings. Veja como foi a conversa.

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Quando você procura um técnico, por que lado você vai mais? É melhor um cara que vai te acrescentar mais na parte técnica e tática ou é mais importante alguém com uma personalidade que vai casar com a sua porque é alguém com quem você vai precisar conviver por tanto tempo?
Acho que os dois são importantes. A personalidade é essencial. Se você não está do lado de alguém com quem você se sente bem, que é seu amigo mesmo, não tem como trabalhar junto. Tenista tem uma coisa muito peculiar que é ficar praticamente 24 horas com seu técnico. Se ele não for mais do que seu técnico e seu amigo, não tem como trabalhar junto. Lógico que o cara como profissional tem que ser bom também, mas tem que ter os dois. Tem que ser um cara bem companheiro fora da quadra, que entenda o que você precisa e, como profissional dentro da quadra, te dê tudo preciso para evoluir seu jogo.

Deu para desenvolver isso com todos técnicos com quem você trabalhou?
Alguns mais, alguns menos, mas a maioria deles, hoje em dia, eu sou amigo. Nunca tive nenhum problema pessoal com eles. Os que eu deixei de trabalhar foi pelo aspecto profissional mesmo, eu achei melhor interromper. Mas com todos eu tive amizade. O Dani (Daniel Orsanic), por exemplo, eu dormia na casa dele quando ia treinar na Argentina, passei Natal e Reveillon com a família dele… Muitas vezes a gente estava junto em momentos que não eram profissionais. Todos meus técnicos, na verdade, eu cheguei a ser amigo, frequentei a casa deles, tive amizade com a família, nunca tive problema quanto a isso.

Quando conversei com o Lui (Carvalho, diretor do Rio Open e manager da carreira de Thomaz Bellucci) na semana passada sobre o fim da sua parceria com o Pato (Francisco Clavet), ele disse que a ideia era ter um técnico brasileiro. Depois de trabalhar com um argentino e um espanhol, dá para dizer que é muito diferente trabalhar com um brasileiro?
Ah, muda bastante coisa. Quando é sul-americano, não muda muito. Mais quando é europeu. Com o Pato, eu senti um pouco este ano. Muitas vezes, eu queria que ele estivesse mais próximo de mim, mas ele estava na Espanha e eu estava em São Paulo. Algumas necessidades não foram preenchidas. Ele tinha a família dele, não podia viajar muito. A gente já viajou bastante. Foram seis, sete meses durante o ano. É diferente. A cultura é diferente. A questão do deslocamento pesa bastante, já que a gente está cada semana em um lugar diferente… Muda bastante. Mas não foi essa a razão de eu terminar com ele. Foi mais pelas razões pessoais dele. Ele que quis terminar a parceria. Acho que hoje eu busco alguém dentro do Brasil, mais perto de mim. Nos últimos anos, isso foi uma complicação. Uma coisa que eu consegui melhorar nos últimos meses deste ano foi contratar o Eric Gomes, que é um cara de São Paulo. Muitas vezes, quando não estava com o Pato, o Eric me ajudava, me dava os treinos. Isso eu não tive no primeiro semestre. Eu só viajava com o Pato e treinava sozinho quando estava em São Paulo. É complicado ficar treinando muito tempo sozinho. Muitas vezes não é produtivo. No segundo semestre, acho que isso foi uma mudança que fez efeito no meu jogo. Comecei a trabalhar com Eric em junho, julho, e em agosto, quando fui para o US Open, já estava jogando um pouco melhor, com um pouco mais de confiança e segurança dentro de quadra. Aí o Pato conseguia me pegar nos torneios um pouco mais preparado. Para o ano que vem, se eu conseguir melhorar isso, com o Eric em São Paulo e outro técnico um pouco mais perto, isso pode ser bom para a minha carreira.

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É um momento da sua carreira em que você não precisa mais de um técnico que fique 24 horas com você?
Não que eu não precise de técnico. Acho que todo mundo precisa. Mas acho que as necessidades que eu tenho hoje são diferentes das que eu tinha há três, quatro anos. Eu era um jogador em desenvolvimento, tinha muita coisa a aprender, não tinha certeza do que eu queria num técnico, não tinha certeza das coisas que eram boas para mim antes de um jogo ou durante um jogo. Hoje em dia, tenho tudo mais claro. Sei o que precisa ser feito numa pré-temporada, do que eu preciso de um técnico… Hoje em dia, tenho necessidades diferentes e é isso que vou buscar num técnico novo.

A gente está falando de três, quatro anos atrás. Nessa época, chegar num ATP sem um técnico te deixava um pouco mais inseguro do que fazer isso hoje?
Acredito que sim. Mesmo sem um técnico, é sempre bom você ter a presença de um preparador físico, um fisioterapeuta, um amigo até. É legal ter alguém te apoiando e ajudando nas coisas básicas. Marcar treino, massagem, falar com um diretor de torneio… Isso tudo faz diferença. Você às vezes demora muito tempo para fazer as coisas. Hoje em dia, lógico. Se eu vou sozinho, consigo me virar melhor do que quatro anos atrás. Antes eu precisava de um cara que me atendesse em tudo. Hoje, eu já consigo fazer algumas coisas eu mesmo. São épocas diferentes da minha carreira.

Quando comentei no Twitter que você queria um técnico brasileiro, teve gente que lembrou daquela entrevista polêmica (Bellucci disse que havia poucos técnicos no Brasil) em… 
Foi no final de 2010. Quatro anos atrás, eu acho.

Isso! E o Lui argumentou que são muitos os nomes no Brasil hoje. Ele disse que tem Ricardinho, Marcos Daniel e citou um monte de gente, inclusive o Eric. Você também vê por aí? Tem muito mais opção no Brasil hoje?
Comparado há quatro anos, o Brasil tem mais opção. O Ricardinho e o Marcos Daniel, por exemplo, naquela época não eram treinadores. O Eric parou de jogar faz também quatro anos. Está mudando um pouquinho isso. O Júlio Silva, hoje, é técnico. Alguns ex-jogadores estão começando a entrar na carreira de técnico. Mudou um pouquinho isso. Hoje em dia, você tem um pouco mais de opção de técnicos de alto rendimento. O que eu falei naquela época é que não tinha muitos técnicos para o meu nível. Alguns caras preparados, com experiência, para treinar um cara top 50, top 100. Hoje em dia, você tem mais. Isso que eu falei que foi mal interpretado. Você tem técnicos, mas não para certos níveis de jogadores. Para esse nível, o técnico tem que ter experiência nesse meio. Não adianta o cara que nunca jogou tênis conseguir ser técnico nesse nível. São muito poucos que conseguem formar um jogador sem ter sido jogador de alto nível.

Aproveitando que a gente está aqui para uma coletiva no Rio Open, qual a lembrança mais marcante que você tem do torneio deste ano?
Mais marcante?

É. Você não estava num momento bom de ranking, ganhou jogos difíceis, de virada, teve torcida a seu favor o tempo inteiro… O que te vem mais à sua cabeça quando você pensa naquele torneio?
Acho que tudo foi marcante. Desde eu vir de Buenos Aires, de um desastre que tive lá, perdi na primeira do quali. Desde a preparação. Vim uma semana antes, fiquei aqui no clube treinando… Nem tinha jogador aqui no clube ainda… Mas acho que o momento mais marcante foi a primeira vitória. Foi muito forte porque eu estava num momento complicado, estava fora do top 100. Era um jogo que ele (Santiago Giraldo) era favorito, estava jogando melhor do que eu. Comecei mal o jogo. Estava nervoso, tenso, e consegui dar a volta por cima. Foi o momento mais marcante. Depois de lá, eu dei uma soltada, sabe? Saiu o peso das minhas costas. Consegui ganhar um joguinho no Rio Open. Depois passei a jogar melhor.

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Começar uma temporada como 65 do mundo é muito diferente de abrir o ano estando fora do top 100 por toda questão de calendário e planejamento. E mentalmente, muda o quê?
Muda tudo! Ano passado eu comecei o ano 130, 125. Eu tinha a metade dos pontos que eu tenho hoje. De 130 para entrar no top 50, é muito ponto. Pra sair de quali pra entrar no top 50, você precisa fazer um primeiro semestre muito bom. Ano passado, eu fiz um primeiro semestre não tão bom, o que me dificultou muito para entrar no top 50. Eu tinha que jogar quali, tinha que jogar os torneios menores. Este ano, vai mudar completamente. Já consigo jogar os torneios maiores no começo do ano, já vou conseguir me poupar nos menores. Em Buenos Aires, por exemplo, não preciso jogar quali. No Rio, tomara que não precise de convite. Em São Paulo e Quito, se eu quiser jogar, entro direto. É completamente diferente. O jogador já está na chave, não precisa chegar cinco dias antes para, de repente, pegar três jogos difíceis no quali… Muda muita coisa. Eu não sou um cara que precisa passar quali para ganhar ritmo. Eu sei que quando estiver na chave consigo ganhar de qualquer jogador. Hoje em dia, é importante eu chegar no torneio confiante que eu posso ir bem independentemente de quantos jogos eu faça.

Mas você joga menos ansioso? O quanto isso afeta o seu tênis? Por exemplo: você chega para um torneio com uma conta na cabeça do tipo "preciso ganhar três, quatro jogos para somar X…"
É diferente você entrar no torneio sabendo que se você ganhar dois jogos você está nas quartas do que você ganhar três e só estar na chave. Você soma 12 pontos, praticamente nada. Então é diferente entrar com a expectativa de dois jogos ou cinco jogos, mesmo que os do quali sejam mais fáceis.

Sobre o autor

Alexandre Cossenza é bacharel em direito e largou os tribunais para abraçar o jornalismo. Passou por redações grandes, cobre tênis profissionalmente há oito anos e também escreve sobre futebol. Já bateu bola com Nadal e Federer e acredita que é possível apreciar ambos em medidas iguais.
Contato: ac@cossenza.org

Sobre o blog

Se é sobre tênis, aparece aqui. Entrevistas, análises, curiosidades, crônicas e críticas. Às vezes fiscal, às vezes corneta, dependendo do dia, do assunto e de quem lê. Sempre crítico e autêntico, doa a quem doer.