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Quem ajuda o esporte?

Alexandre Cossenza

02/12/2014 12h44

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Há duas semanas, estive em Florianópolis a convite dos alunos de direito da Universidade Federal de Santa Catarina para compor uma mesa de debates com o tema "crise no esporte". Gostaria, então, de compartilhar aqui alguns dos tópicos que foram levantados na ocasião. Afinal, muitos deles estão presentes no dia a dia do tênis brasileiro.

Coordenada por Rodolfo Prado, a mesa foi composta pelo professor Paulo Murilo, ex-técnico de basquete profissional e autor do blog Basquete Brasil, pelo Doutor Felipe Ezabella, sócio-fundador do Instituto Brasileiro de Direito Esportivo, pelo advogado Martinho Neves Miranda, coordenador jurídico da candidatura olímpica do Rio 2016, e pelo Doutor Rodrigo Bayer, que é mestre em Direito pela UFSC e presidiu os trabalhos.

Conversamos sobre diversos aspectos do esporte no Brasil. Desde a falta de uma política esportiva para crianças até as falhas no alto rendimento. Abordamos o processo vicioso em que a escassez de atletas de ponta (proporcionalmente à população brasileira) gera a falta de técnicos de alto nível. Falamos também sobre os muitos recursos jurídicos existentes para beneficiar o esporte, de como eles são mal aproveitados, e da ausência de uma agência reguladora.

Por fim, em um belo texto de encerramento, o Doutor Rodrigo Bayer ressaltou quanto tempo havíamos passado (foram três horas de mesa) abordando aspectos morais – mais de legitimidade do que de legalidade. E é justamente aí que o tênis tropeça. O que sinto (e disse isso na mesa) é uma Confederação Brasileira bem intencionada, mas que esbarra, vez por outra, em questões pessoais e na arrogância para destratar quem ousa emitir uma opinião diferente.

Aconteceu comigo há pouco tempo. Incomodado com uma menção feita neste blog aos tamanhos dos bancos de reservas brasileiros na Copa Davis (neste post), o assessor de imprensa da CBT me enviou mensagens, dizendo que eu havia feito uma comparação "ridícula" (e nem havia comparação no texto). Depois, quando relatei o episódio no Twitter, mandou outra mensagem mal educada. Conduta que passa longe do que qualquer um gostaria de ver em uma pessoa que veste o uniforme da entidade que controla o tênis brasileiro.

Discorda de algo? Tudo bem, conversamos educadamente. Já fiz isso com atletas, dirigentes e assessores. Tenho um blog há sete anos, opiniões diferentes não me incomodam. Pelo contrário. Debates são saudáveis e podemos discutir o tempo que for sobre o banco da Copa Davis, quem está ou deixa de estar lá. Acho que gente demais atrapalha. Não acho que seja lugar de assessor de imprensa. Não acho que seja lugar para presidentes, dirigentes ou empresários/managers. Quanto mais pessoas ali, maior a chance de algo desagradável acontecer. Ou alguém achou bacana ver Jorge Lacerda, presidente da CBT, dirigente máximo do tênis brasileiro, dizendo impropérios para Mike Bryan (ou era Bob?) naquele confronto em Jacksonville, contra os Estados Unidos? Mas há quem discorde. E tudo bem, quando o diálogo se dá civilizadamente.

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Mas eu divago. A CBT comprou algumas brigas pequenas nos últimos anos. Ameaçou punir clubes, árbitros, treinadores e atletas que participassem do Circuito de Tênis Escolar Universitário, patrocinado pelo Itaú e realizado pela Try Sports, cujo dono é Nelson Aerts, com quem Lacerda tem diferenças. A entidade fez ameaças semelhantes lá atrás, no Nike Junior Tour, outro evento da Try Sports (que se defendeu assim). Aliás, na última semana Lacerda inclusive usou o Twitter para questionar um torneio juvenil no Rio de Janeiro realizado pelo Instituto Sports (IS). Segundo ele, o IS captou mais de R$ 1 milhão para o evento. O valor é alto, e é bom mesmo que todos, sem exceção, sejam fiscalizados. Foi assim que a CBT teve de desembolsar meio milhão de reais após captar verba para um torneio promovido pelo ex-tenista Dácio Campos.

A CBT também negou credenciamento na última Copa Davis à jornalista Diana Gabanyi, ex-assessora de Guga que já chefiou WTA Finals, trabalhou para a ITF em Copas Davis e é credenciada em qualquer Grand Slam. Por quê? Oficialmente, a CBT respondeu que houve muitos pedidos e nem todos foram atendidos. Mas que critério deixou uma das jornalistas mais experientes do Brasil fora de uma Copa Davis? Essa explicação, qualquer que seja, não vai convencer.

Diante do que foi colocado neste post, valem mais do que nunca as perguntas. Qual dessas condutas ajuda o tênis? Em que momento o esporte saiu ganhando? De novo: não questiono as intenções ou a competência da CBT. Tem gente boa, que sabe o que faz, por lá. Mas o quanto se perde no caminho, diante de brigas pessoais e da dificuldade em receber críticas? E por que alguém precisaria vincular-se à CBT para ajudar o tênis? Mas é assim que a entidade enxerga o esporte.

Atrapalha?

Já faz algum tempo que Fernando Meligeni posta, em sua conta no Facebook, vídeos de dicas. São gravações curtas que abordam diversos aspectos do tênis. Como lidar com tal tipo de adversário, que tipo de preparação fazer antes de uma partida, o que fazer para tirar o máximo de seu equipamento, etc.. São vídeos sem produção, gravados em casa, sem patrocinador, nada. Simples até demais. E é aí que reside a beleza da coisa toda.

Quem viu todos esses vídeos já tem uma clínica inteira de tênis sem sair de casa. Fosse outra pessoa (e não é indireta pra ninguém, é bom dizer), pensaria algo nas linhas de "não vou fazer isso de graça, vou guardar para as clínicas que me pagam para fazer". Não é o caso do Meligeni. Os vídeos estão lá, de graça, de coração. E basta ver 30 segundos para entender que ele faz aquilo com sinceridade. A recompensa é o feedback que recebe de tenistas amadores por toda parte.

Ainda assim, já ouvi mais de uma vez, inclusive de Jorge Lacerda, que Meligeni não ajuda o tênis. Porque não está ligado à entidade. Porque faz críticas quando acha necessário. E não estou fazendo aqui a defesa de um campeão pan-americano, semifinalista de Roland Garros e número 25 do mundo – ele não precisa. Mas não é só via CBT que se ajuda o tênis. Professores de clubes, presidentes de projetos sociais, ex-tenistas que "só" dão clínicas, promotores de torneios, patrocinadores, comentaristas, jornalistas, tenistas profissionais em atividade… Todos contribuem, direta ou indiretamente, para o esporte.

Só que cada um escolhe sua maneira de ajudar. O dever de todo mundo, e acredito que principalmente da CBT, é entender que nem todo mundo é obrigado a colaborar por meios "oficiais".

Coisas que eu acho que acho:

Acho até que é uma discussão interessante: é legítimo (seja por CBT, Instituto Sports ou federações) utilizar verba pública para a realização de torneios de veteranos, Challengers e ATPs? Dá um bom debate. O projeto olímpico, a meu ver, tinha muito mais razão de ser, embora vendê-lo como "olímpico" tenha sido mais marketeiro do que qualquer coisa – no tênis, quase ninguém sai do juvenil para se tornar atleta olímpico em três anos. Mas foi outra iniciativa que ficou pelo caminho. A CBT alegou "falta de conhecimento da fiscalização vigente sobre a realidade da modalidade", mas também pode se dizer que a entidade desconhecia os mecanismos legais e de fiscalização quando deu início ao projeto.

 

Sobre o autor

Alexandre Cossenza é bacharel em direito e largou os tribunais para abraçar o jornalismo. Passou por redações grandes, cobre tênis profissionalmente há oito anos e também escreve sobre futebol. Já bateu bola com Nadal e Federer e acredita que é possível apreciar ambos em medidas iguais.
Contato: ac@cossenza.org

Sobre o blog

Se é sobre tênis, aparece aqui. Entrevistas, análises, curiosidades, crônicas e críticas. Às vezes fiscal, às vezes corneta, dependendo do dia, do assunto e de quem lê. Sempre crítico e autêntico, doa a quem doer.