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Saque e Voleio

Muy caliente

Alexandre Cossenza

24/09/2014 16h10

Gala_Toni_blog

Primeiro, os fatos. A Espanha perdeu para o Brasil em São Paulo e foi rebaixada para a segunda divisão da Copa Davis. Será a primeira vez do time ibérico no Zonal Europeu desde 1996. Em seguida, Carlos Moyá pediu demissão. Disse que não continuaria como capitão, mas que voltaria ao cargo se o cenário fosse outro. Entra em cena Gala León. A moça, diretora esportiva da RFET, a federação espanhola, foi promovida a capitã. E aí começou a confusão.

Alguns tenistas disseram publicamente que não conheciam Gala León. Rafael Nadal foi um pouco mais longe e disse que a nomeação era estranha. Até porque o presidente da RFET, José Luís Escañuela, não consultou os jogadores. Toni Nadal, língua solta como sempre, foi mais longe. Disse que não era muito apropriado ter uma mulher como capitã da Davis e falou que havia gente mais qualificada e preparada para o cargo do que Gala León.

O ápice da confusão veio na noite de terça-feira, quando Toni e Gala concederam entrevista por telefone a José Ramón de la Morena, no programa "El Larguero". O papo começa amistoso, mas logo fica un poquito caliente. Vejam abaixo alguns trechos:

TN: Há quanto tempo é diretora esportiva?
GL: Desde julho
TN: Desde julho, é curioso que não tenha ligado a Rafael para ver como se encontrava. Não falou com nenhum jogador. É curioso.

TN: Que sua passagem como capitã seja a melhor possível, mas creio que há gente, e estou no meu direito evidentemente de opinar, que está mais preparada do que você. Nada mais. Simples assim. Isso não creio que seja motivo de ofensa, absolutamente.
GL: A mim, pessoalmente, não ofende.
TN: Minha vontade nunca foi essa.
GL: De verdade. Pode opinar ou não opinar. Eu soube lhe respeitar. Cada um tem seu ponto de vista.
TN: Para ser capitão da Davis, o normal é conhecer o tênis masculino. Para mim, se oferecessem o posto de capitão da Fed Cup a Rafael, creio que não seria o mais indicado.
GL: Mas continua sendo um ponto de vista.

TN: Que eu acredite que não está suficientemente preparada, é meu direito. Provavelmente esteja esteja no tênis feminino, porque saberá quem é a jogadora número 30, 40, 50 do mundo. Com os homens… porque eu nunca lhe vi em um torneio masculino! É só isso.

GL: É sua opinião. Ele fala de mim como se conhecesse por toda a vida.
JRDLM: Não, Gala. Ele está dizendo que não lhe conhece. É o contrário.
TN: Não se confunda. Não te digo em nenhum momento que te conheço há uma vida inteira. Não te conheço absolutamente. Rafael não te conhece porque falei com ele. Falei com Feliciano López e me disse exatamente o mesmo. Falei com outros jogadores, e o mesmo.
GL: Feliciano não me conhece?
TN: Desde que é diretora esportiva, não entrou em contato com ele. Estamos falando de outro tipo de conhecimento.

TN: Quem você acha que está mais preparado para dirigir uma equipe da Copa Davis? Juan Carlos Ferrero ou você?
(silêncio)
TN: O que você acha?
GL: Obviamente, não entrarei em mais polêmicas.
JRDLM: Não há nenhuma polêmica. Aqui…
TN: Não é polêmica, Gala.
GL: Entendo a posição da RFET, vou olhando para a frente e sigo trabalhando….
JRDLM: Tudo isso é fenomenal, mas se trata de explicar às pessoas o porquê e qual é o seu projeto. E não está explicando nada!

A entrevista inteira dura 22 minutos e pode ser ouvida neste link. Mas e aí, quem tem razão? Não é muito questão de ter ou não razão – e vou ignorar a parte em que Toni Nadal fala que seria um incômodo ter uma mulher no vestiário porque não faz sentido algum. Sua argumentação no programa de rádio vai por outra linha e, essa sim, merece debate tenístico.

Talvez seja estranho para quem não conhece um pouco do meio, mas tenistas são "paneleiros" por definição. Para esse tipo de atleta, é sempre difícil aceitar alguém "de fora". Seja dando opiniões (como é o caso de nós, jornalistas) ou, pior ainda, entrando em quadra. Gala León é tenista, óbvio, mas viveu outro circuito. Não tem uma relação estreita com os tenistas. Tanto que afirmam publicamente que a nomeação é estranha.

Mais do que isso: Gala León tem um currículo dentro de quadra bem inferior a outros possíveis capitães da Espanha. Toni Nadal cita Juan Carlos Ferrero, Sergi Bruguera e Alberto Berasategui como exemplos. Gente que viveu o circuito masculino e tem relação mais próxima com quem quer que esteja na próxima equipe espanhola da Copa Davis.

O grande problema mesmo com a nomeação de Gala León para o cargo de capitã é que a polêmica tirou o foco do real problema do tênis espanhol: como fazer com que seus melhores tenistas voltem a jogar pelo país?Até agora, só uma certeza: o nome de Gala León nem sequer começa a resolvê-lo.

O grande trunfo para a Espanha, no entanto, são os Jogos Olímpicos. Pelo regulamento utilizado para Londres, cada tenista precisa fazer-se disponível (não precisa necessariamente ser convocado) para defender o país em duas temporadas (e uma delas precisa ser 2015 ou 2016). Logo, quem não atua desde 2012 e tem ambições olímpicas precisará colocar-se à disposição da capitã ou de quem quer que seja em breve. Aí eu quero ver…

Sobre o autor

Alexandre Cossenza é bacharel em direito e largou os tribunais para abraçar o jornalismo. Passou por redações grandes, cobre tênis profissionalmente há oito anos e também escreve sobre futebol. Já bateu bola com Nadal e Federer e acredita que é possível apreciar ambos em medidas iguais.
Contato: ac@cossenza.org

Sobre o blog

Se é sobre tênis, aparece aqui. Entrevistas, análises, curiosidades, crônicas e críticas. Às vezes fiscal, às vezes corneta, dependendo do dia, do assunto e de quem lê. Sempre crítico e autêntico, doa a quem doer.